O esporte é atualmente o espelho através do qual as naçôes, os homens, as mulheres e as classes sociais se veem. A imagern é, de certa forma, brilhante, as vezes escura, as vezes distorcida e às vezes ampliada. Este espelho metafórico é urna fonte de regozijo e de depressäo, de segurança e de insegurança, de orgulho e de humilhaçâo, de uniâo e de desuniâo. [...] Como o esporte tem atingido urna dimensâo colossal, vem progressivamente substituindo a religiào no seu poder de excitar a paixào, de proporcionar urna válvula de escape emocional, de oferecer um sentimento de fraternidade (e, cada vez mais, de partìcipacào femmina), e tem feito parte, mais e mais, da vida dos europeus e de outros povos.
(J. A. Mangan apud LEVERMORE; BUDD, 2004, p. xi)1
Ele [o esporte] é sempre sèrio. É organizado: é urna indùstria, é um negocio, dinheiro, interesse velado: é resultado e transmissor de ideologia, de prestigio, de status, de nacionalismo, de internacionalismo, de diplomacia e de guerra.
(Colin Tatz apud HOULIHAN, 1994, p. 1)
Introducao
Nos próximos anos o Brasil será sede dos dois megaeventos esportivos mais importantes do planeta: a Copa Mundial de Futebol e as Olimpíadas. Em meio à intensa mobilizaçào do país na preparaçào des ses eventos, muito se discute na mídia e ñas redes sociais sobre as consequências económicas, sociais e políticas geradas por essa incorporaçâo plena do Brasil na chamada economia internacional do entretenimento .
Essa movimentaçâo que o país vive em torno ao esporte contrasta vivamente com a ausencia praticamente total do tema na produçâo académica brasileira na área das Relacóes Internacionais, mesmo entre os autores que privilegiam abordagens menos tradicionalistas. O objetivo deste traballio é chamar a atençâo para essa situaçâo e apresentar urna introduçâo ao estudo do esporte ñas Relacóes Internacionais. Em primeiro lugar, será apresentado um balanço bibliográfico da questäo na área da historia das Relacóes Internacionais e, mais especificamente, na área das Relacóes Internacionais. Em segundo lugar, seräo analisadas algumas obras recentes que colocam um firn relativo ao que foi considerado pelos especialistas como urna "negligencia" pelo esporte no mainstream da disciplina. A apresentaçâo dessas sugestóes de pesquisas e de debates acerca de qual seria o paradigma mais adequado para tratar do tema objetiva suscitar futuras pesquisas sobre o assunto no Brasil, que necessariamente deveräo ser pluridisciplinares, dada a complexidade do fenómeno.
O esporte foi intensamente politizado no interior dos Estados-nacóes europeus durante o século XLX, quando é usado como vetor da identidade nacional em Estados multinacionais e revelador do prestigio nacional. Entretanto, naquela época, o esporte era ainda relativamente marginal e elitista, exceto no caso do futebol e do ciclismo (HOBSBAWM, 1997, p. 298-299).
A maioria dos esportes modernos (corridas de cávalos, futebol, luta, boxe, tênis, caça à raposa, remo, etiquete e atletismo) teve origem na Inglaterra, mas, no final do século XIX, eles já apresentavam urna tendencia a se internacionalizar com a organizaçâo dos Jogos Olímpicos e a criaçâo das federaçôes internacionais. O olimpismo, nascido na virada do século XIX para o XX, no contexto de proliferaçâo de nacionalismos imperialistas fundamentados no darwinismo social e racial, carrega desde sua origem um paradoxo: os ideáis cosmopolita, fraternal, elitista, apolítico, paternalista, pedagógico e antimercantil coexistem com a força das ideologías, da política, dos intéresses e as exclusôes.
Segundo Norbert Elias, essa propagaçâo dos esportes modernos no resto do mundo, em primeiro lugar as corridas de cávalos, o pugilismo, a caça à raposa e, depois, na segunda metade do século XIX, os jogos de bola, como o futebol e o tenis, nao foi resultado do imperialismo cultural inglés. Tratar- se-ia de urna atividade com certa autonomia individual e social:
Por que é que, por exemplo, algumas das variedades iniciáis de desportos ingleses, tais como o futebol e o tenis, foram adotadas por muitas sociedades diferentes, em todo o mundo, enquanto a expansäo do críquete se confinou principalmente a um círculo exclusivo dos países da Commonwealth? Por que é que urna variedade do futebol, o rúgbi, nao se expandiu tao largamente como o futebol? Por que é que os Estados Unidos, sem abandonaren! por completo as variantes do desporto inglés, desenvolveram a sua propria variedade de futebol? (ELIAS; DUNNING, 1992, p. 67).
Independentemente das razôes (imposiçâo ou aceitaçâo), o fato é que a internacionalizaçao do esporte realmente so se acentúa após a Primeira Guerra Mundial no contexto do surgimento da comunicaçâo de massa, que transforma o esporte em espetáculo. Isso suscita o interesse dos homens de Estado, que começam a considerá-lo um instrumento de política externa näo desprezível.
Nesse sentido, o primeiro país a adotar urna política esportiva para o exterior foi a Franca, quando criou, em 1920, no interior do Service des OEuvres Françaises à l'Etranger (Serviço das Obras Francesas no Exterior), dependente do Ministère des Affaires étrangères (Ministerio das Relaçoes Exteriores), urna "Section du tourisme et de esport" (Seçâo turismo e esporte).
Para alguns países, o esporte constituí atualmente um elemento do chamado soft power. O Brasil, por exemplo, segundo Nye possui dois elementos essenciais de soft power no plano internacional - "a cultura popular do carnaval e do futebol"3 (NYE, 2012, p. 224) -, e a China teria aumentado o seu com a organizaçào das Olimpíadas de 2008 (NYE, 2012, p. 11).
A näo participaçâo nos megaeventos esportivos é, para qualquer Estado, um considerável prejuízo, e isso denota, em grande medida, o enorme poder que concentram as organizaçôes näo governamentais que gerenciam o esporte. O Comité Olímpico Internacional (COI), por exemplo, é integrado por 115 membros; urna parte deles säo representantes das federaçôes internacionais do esporte e representantes dos comités nacionais olímpicos, e outra parte, setenta deles, säo personalidades muitas vezes mais ligadas aoy'eí set do que ao movimento esportivo propriamente dito.
A FIFA é a outra ONG do esporte importante. Eia conta hoje com 209 associaçôes membros (nacionais ou näo, já que, por exemplo, a Grä-Bretanha é representada por Inglaterra, Escocia, Irlanda do Norte e País de Gales). Atualmente, só sao aceitos como novos membros países que tenham de fato obtido sua independencia; dessa maneira, o último membro integrado foi o Sudäo do Sul, em maio de 2012.
Os dirigentes da maioria das ONGs do esporte permanecem nos cargos durante muito tempo. Por exemplo, Julio Grondona ocupa a presidencia da Associaçâo do Futebol Argentino (AFA) desde 1979. Näo devemos esquecer que, desde entäo, nessas cinco décadas, quinze chefes de Estado passaram pela Casa Rosada (incluindo os presidentes militares da última ditadura de 1976 a 1983), e o país viveu terríveis crises económicas, políticas e sociais. Nem mesmo as dezenas de denuncias nos tribunals argentinos conseguiram abalar seu dominio.
As ONGs do esporte conseguem impor suas vontades aos governos. Segundo Rick Mkhondo, diretor de Comunicaçôes do Comité Organizador da Àfrica do Sul durante a Copa do Mundo de 2010, a FIFA obrigou o governo sul-africano a assinar dezessete acordos, posteriormente consolidados na chamada "Lei de Medidas Especiáis de 2006 para a Copa do Mundo FIFA de 2010". A FIFA, ademáis de se reservar todos os direitos de midia e marketing, teria mesmo chegado a proibir o uso do termo "República da Àfrica do Sul (RS A) 2010" e "Àfrica do Sul 2010". Mkhondo (2012, p. 7) denuncia:
Afinal de contas, eles näo pagam nenhum tipo de imposto, ignoram o controle cambial, comercializam todos os aspectos do evento, reservam os direitos autorais de palavras como "World Cup", aparentemente cobram preços exorbitantes, declaram "zonas de exclusäo", silenciam jornalistas com exigencias para acreditaçâo que incluem nao expressar críticas, e sao muitas vezes vistos como um atentado à liberdade de expressäo. [...] O órgao baseado em Zurique é muitas vezes comparado a um governo soberano, e tem um poder que faz com que os govemos se dobrem as suas exigencias, o que lhes permite ditar as regras do jogo com impunidade.
Alguns podem dizer que isso é o que permite que o futebol funcione e prospere em nivel global. Outros podem dizer que é a arrogancia da Fifa que ajuda a engordar os seus cofres, com reservas financeiras de quase US$ 1,3 bilhäo, um montante maior do que a produçâo económica anual de alguns países.
De fato, as ONGs do esporte têm urna autonomia enorme. Por exemplo, a Carta Olímpica, em vigor desde 1894, instaurou um auténtico sistema de direito internacional paralelo ao direito internacional público. Durante o entreguerras, conscientes da importancia do esporte ñas questôes sanitarias, educativas e geopolíticas, alguns Estados tentaram, sem sucesso, colocar o COI sob jurisdicäo da Liga das Naçôes. Entretanto, a lex olimpica estabelece, após a revisäo de 1990, que as relaçôes entre o COI (associaçâo de direito internacional com personalidade jurídica) e o Estado ou a cidade organizadora dos jogos nao sao regidas pelo "direito internacional dos contratos", mas sim pelo direito privado suiço (LATTY, 2009, p. 4-5).
Dessa forma, os atores decisivos dessainternacionalizaçâo do esporte nao sao apenas os responsáveis políticos dos governos e partidos, mas também os dirigentes esportivos das federaçôes nacionais, internacionais e do movimento olímpico. Outros atores também sao importantes: os jornalistas, os próprios esportistas, os espectadores e a opiniäo pública.
Na chamada cultura da mídia (KELLNER, 2006), que se torna hegemônica a partir dos anos 1970, o espetáculo tornou-se um dos principios organizacionais da sociedade, da economia, da política, da cultura e da vida cotidiana. Ele nao só fornece o material para os sonhos e as fantasias como constrói as identidades. Nesse sentido, os esportes ocupam um lugar privilegiado, junto com o cinema, a televisäo, o teatro, a moda, a arquitetura contemporánea, a música popular, o erotismo e os videogames e jogos de computador. As celebridades do esporte sao "divindades" que foram fabricadas e permanentemente valorizadas positivamente ante o público pelos assessores e agentes de imagem. Sao verdadeiros produtos que vendem outros produtos e imagens, näo necessariamente ligados ao mundo do esporte.
Entretanto, o espetáculo, por ser "sempre contraditório, ambiguo e sujeito a inversòes e reviravoltas" (KELLNER, 2006, p. 143), pode servir näo só para novas formas de dominaçâo e opressäo, como também para a justiça social e a democratizaçâo das sociedades.
Os esportes há muito têm sido propicios ao espetáculo, com eventos como as Olimpíadas, World Series, Super Bowl, a Copa do Mundo e os campeonatos de basquete da NBA atraindo audiencias maciças e gerando anuncios a preços astronómicos. Esses rituais culturáis celebrarli os valores mais profundos da sociedade (por exemplo, a competiçào, o sucesso e o dinheiro), e as empresas estâo dispostas a investir vultosas verbas para que seus produtos se associem a tais eventos. Realmente, parece que a lógica da mercadoria do espetáculo está tao inexoravelmente entranhada nos esportes professionals que estes nao podem mais existir sem o acompanhamento de torcidas animadas, mascotes gigantes que brincam com os jogadores e espectadores, sorteios, promocóes e competiçôes envolvendo os produtos de diversos patrocinadores (KELLNER, 2006, p. 128).
Partindo da constataçâo de que o esporte é um fenómeno multifacetado extremamente importante e que nao é apolítico, o objetivo deste ensaio é fazer urna análise da forma como ele foi abordado pelos historiadores e pelos especialistas da área de Relaçôes Internacionais e fornecer subsidios para futuras pesquisas sobre o assunto no Brasil.
O Esporte na Historia das Relaçôes Internacionais
Nos últimos anos, a pesquisa histórica sobre o esporte fez grandes progressos, e velhos mitos foram destruidos. Por exemplo, o de que foram os Estados autoritarios e totalitarios os primeiros a utilizar o esporte na propaganda externa (ARNAUD, 1998, p. 278-280; 2002, p. 353-356). No Tratado de Versailles (1919), inúmeras sao as imposiçôes contra os países vencidos e considerados culpados da guerra, mas nenhuma é referente ao esporte. Entretanto, é nessa área que as sançôes seräo particularmente duras, iniciando-se assim a difundida pràtica de utilizaçâo do esporte como meio de propaganda e de pressäo diplomática no ámbito das relaçôes internacionais. O mais surpreendente nesses acontecimentos é que foram os países democráticos os primeiros a usar esse recurso e nao, como seria de esperar, os regimes totalitarios. Tampouco foi um recurso utilizado contra Estados autoritarios, já que nessa época a Alemanna vivia a experiencia da República de Weimar. Na realidade, o primeiro boicote foi feito pelo novo Estado soviético, ao se recusar a participar de competiçôes internacionais que considerava burguesas (RIORDAN, 1991, p. 127).
Nao obstante, em 1984, Pierre Milza constata que, apesar desses progressos pontuais nos estudos históricos, eram raros os trabamos sobre o esporte no ámbito da historia, da ciencia política e da sociologia. Pouco útil tinha sido o dinamismo da International Association for Sports Information (I ASI), que tinha sido fundada em 1960, e a posterior criaçâo de inúmeros centros de estudos ñas universidades europeias e nos Estados Unidos, Canadá e Australia: ainda dominavano na época, as obras que ele denomina de "jornalísticas-hagiográficas", de pèssima qualidade, com ausencia de sínteses. Isso lhe parecía surpreendente, pois se tratava de um fenòmeno de massa e universal, compatível com todas as ideologías, indicador do grau de potencia (ou de declínio) de um Estado, revelador e manipulador do sentimento popular (seja como "fábrica de consenso" ou como instrumento de estrategias defensivas ou ofensivas), substituto da guerra e instrumento da diplomacia. O esporte tinha se transformado em espetáculo e se prestava para a manipulaçâo, nao só pelos interesses financeiros, mas também pelos partidos de massa e pelos ditadores de toda especie (MILZA, 1984, p. 156-157).
Esse balanço pessimista de Milza deve ser matizado, já que ñas suas reflexôes, por razôes que nao cabe discutir aqui, ele praticamente ignora a produçâo académica do mundo anglo-saxäo, como veremos mais adiante.
De todas maneiras, a contribuiçâo dos historiadores francófonos será muito importante.9 A revista Relations Internationales dedica, em 1984, um número especial ao tema "Sport et relations internationales" (?- 38). O objetivo desse número näo é fazer um balanço historiográfico, tampouco apresentar ensaios de teorizaçâo sobre o tema, mas apenas suscitar debates. Dessa forma, os temas tratados sao: a gênese do chamado "prestigio nacional" associado ao esporte, como forma particular de nacionalismo; a "diplomacia esportiva internacional" francesa durante o entreguerras e na Guerra Fría; os Jogos Olímpicos (compreensäo internacional ou terreno de enfrentamento?); o futebol internacional e seus símbolos e realidades.
Pierre Milza (1984, p. 163-171), no artigo que serve de apresentaçâo da revista, afirma que o esporte possui très dimensôes essenciais na política internacional:
1. é componente e reflexo da vida internacional;
2. é revelador do sentimento público; e
3. tem papel relevante em tres aspectos precipuos da política estrangeira:
* como instrumento de preparaçâo para a guerra, através dos fins guerreiros da educaçâo física e das atividades esportivas (o cidadâo soldado);
* engendrando imagens de prestigio que podem ser instrumentalizadas pela propaganda nacionalista; e
* como meio de aproximaçâo entre os países (o mesmo papel que tinham as visitas das esquadras navais no século XIX).
As observaçôes de Milza säo extremamente relevantes, pois de fato o esporte é competitivo por natureza e seus resultados säo intangíveis (prestigio) e, ao mesmo tempo, tangíveis, já que podem ser facilmente medidos por meio dos resultados dos diferentes jogos e campeonatos. Nesse sentido, o quadro de medalhas é o melhor termómetro comparativo do sucesso. Por outro lado, todos os atletas têm, em principio, as mesmas chances de sucesso, independentemente do poder do Estado que representam. Por exemplo, em 2003, Kim Collins, da minúscula ilha-Estado de Sao Cristóvào e Neves, ganhou a medaIna de ouro de atletismo.
Em 2002, é realizado, em Lausanne, na sede do Museu Olimpico do COI o coloquio "Olimpismo e Relaçôes Internacionais", por iniciativa do Centro de Estudos Olímpicos, da revista Relations Internationales, do Institut Universitaire des Hautes Etudes Internationales de Genebra e do departamento de historia da Faculdade de Letras da Universidade de Lausanne. Os trabalhos apresentados nesse coloquio forain publicados na revista Relations Internationales, em dois números dedicados ao "Olympisme et relations internationales" (nos 111 e 1 2, 2002). Os principáis temas abordados säo os seguintes:
1. a gênese do olimpismo hodierno, no contexto do enfrentamento entre os nacionalismos europeus e o pacifismo liberal;
2. as consequências do Tratado de Versailles e da revoluçâo bolchevique no esporte e no olimpismo (boicotes);
3. o COI e as rivalidades franco-alemäs (1918-1928);
4. olimpismo e Guerra Fría: a diplomacia esportiva, instrumento para atenuar o declínio francés (1948- 1952); a diplomacia esportiva soviética e os Jogos Olímpicos de Helsinki (1952); o boicote americano aos Jogos Olímpicos de Moscou (1980);
5. o olimpismo como barómetro das relaçôes de potencia entre os Estados;
6. o papel da Agencia Mundial Antidoping, criada em 1999;
7. Olimpíadas e globalizaçâo;
8. movimento olímpico e meio ambiente/ecologia; e
9. a dimensäo econòmica e mediática da organizaçâo dos Jogos Olímpicos.
Esses trabalhos constituem urna contribuiçâo importante no sentido de ressaltar certos temas, fornecer elementos factuais e estimular pesquisas futuras. Passemos agora à análise daproduçâo bibliográfica ligada diretamente à disciplina de Relaçôes Internacionais.
O Esporte nas Relaçoes Internacionais
Em 1976, a Unesco organizou a Primeira Conferencia Internacional de Ministros e Altos Funcionarios Responsáveis por Educaçâo Física e Desporto, da qual participaram delegados de 102 países. O objetivo era fomentar a cooperaçâo internacional através do esporte, considerado por muitas naçôes como urna força cultural essencial.
Entretanto, o estudo do esporte näo consegue penetrar no círculo mainstream das ciencias políticas apesar da enorme proliferaçâo de revistas científicas especializadas no estudo sociológico do esporte (Sport in Society, Sociology of Sport Journal, International Journal for the Sociology of Sport, Soccer and Society, International Journal of Sport Policy etc.). As causas de tal "negligencia" na área académica de Relaçoes Internacionais se encontram, essencialmente, no dominio da abordagem realista, preocupada apenas em questôes ligadas ao poder económico, militar e político. Pascal Boniface, diretor do Institut de Relations Internationales et Stratégiques (IRIS), lembra a resistencia de seus colegas quando ele organizou, em 1998, um coloquio sobre a "Geopolítica do Futebol". Segundo ele, o tema, queja tinha sido bastante estudado pelos sociólogos, economistas e dentistas políticos, era considerado pouco serio pela academia na área das Relaçoes Internacionais (BONIFACE, 2010, p. 14).
Na realidade, o tema do esporte nas relaçoes internacionais já tinha despertado a curiosidade de alguns estudiosos anglo-saxóes, injustamente ignorados por Boniface e também, como já vimos, por Pierre Milza. Por exemplo, em 1978, é publicada urna compilaçâo de artigos, Sport and International Relations (LOWE et al., 1978), que será, segundo Trevor Taylor (1986, p. 47), durante quase urna década o único livro específicamente voltado para os estudantes de Relaçoes Internacionais interessados no esporte. Nessa obra, sete temas sao abordados:
1. esporte e nacionalismo (identidade nacional);
2. as Olimpíadas e os intéresses políticos dos Estados e grupos (por exemplo, as Olimpíadas de Berlim, em 1936);
3. propaganda ideológica e esporte;
4. o esporte como instrumento da política externa (prestigio, reconhecimento, cooperaçâo, boicote etc.):
a. o uso do esporte pelas superpotências durante a Guerra Fría e a détente;
b. a instrumentalizaçâo do esporte pela diplomacia (estudos de caso): China ("friendship first, competition second" [amizade em primeiro lugar, competiçâo em segundo] e a "Ping-Pong Diplomacy" [diplomacia do pingue-pongue]), República Democrática Alema (RDA), África do Sul (a questäo do apartheid) e Canadá;
c. as interseçôes entre a política esportiva interna e a política externa;
d. esporte e a. public diplomacy (diplomacia pública);
e. o esporte e as novas naçôes independentes surgidas na descolonizaçâo: esporte e nova identidade nacional nation building); esporte como instrumento para o nao alinhamento: Games of the New Emerging Forces (GANEFO);
5. o papel das organizaçôes governamentais e nao governamentais do esporte;
6. esporte e integraçâo regional: o papel da European Sport for All Charter, de 1975; e
7. o papel do esporte na atual sociedade de consumo.
Na época da publicaçâo desse livro, do quai é um dos organizadores conjuntamente com ?. Lowe e A. Streme, David ?. Kanin era professor de Política Internacional e Sistemas Políticos Europeus, no Boston College, Massachusetts (atualmente é professor de Relaçôes Internacionais na Johns Hopkins University e professor de Estudos Europeus e analista sènior na Agencia Central de Inteligencia [CIA] ) . Na coletânea, Kanin é o autor dos tres artigos mais interessantes do ponto de vista teórico: "Superpower Sport in Cold War and Detente" (p. 249-262), "Ideology and Diplomacy: The International Dimensions of Chinese Political Sport" (p. 263-278) e "The Olympic System: Transnational Sport Organization and the Politics of Cultural Exchange" (p. 515-537).
No ultimo artigo, ele afirma- inspirado na nova abordagem da interdependencia complexa (que ele denomina pluralismo), que marcou os debates interparadigmáticos da época, desenvolvida por Keohane e Nye (1972) - que o esporte é urna "forma de atividade cultural" com enorme importancia no sistema internacional:
Na era contemporánea, as relaçoes internacionais estâo mais do que nunca sob o escrutinio público. As relaçoes interculturais devem ser objeto de um estudo cuidadoso como parte integrante do sistema internacional. Urna análise do processo que faz parte de qualquer intercambio é mais importante na determinaçâo do significado político, bem como humanitario ou cultural, de urna transaçâo do que as tradicionais distinçoes entre as atividades que sao consideradas "importantes" e as que nao o sao (KANIN, 1978, p. 533).
Entretanto, o esporte, ad verte Kanin, diferencia- se das outras atividades culturáis em très questôes fundamentáis:
1 . a maioria dos envolvidos profundamente ñas questôes esportivas sao participantes indiretos das mesmas (público, jornalistas, políticos etc.);
2. sendo urna atividade competitiva por natureza - a rivalidade faz parte de sua essência -, o esporte simboliza formas alternativas de guerra e confuto aberto;
3. os espectadores sao os atores mais importantes, e näo os atletas.
Essa singularidade do esporte faz entäo com que os Estados estejam particularmente interessados nele:
Atletas e dirigentes esportivos muitas vezes desenvolvem boas amizades com seus colegas provenientes, até mesmo, dos Estados mais hostis. Nao é o atleta, no entanto, que é o agente mais importante no processo, e sim o espectador. Ele é o alvo ñas comparaçôes nacionais e ideológicas intrínsecas ao processo. É nessa atmosfera que muitos Estados criaram órgaos do governo para coordenar a atividade esportiva.
O uso do esporte para transmitir urna mensagem diplomática ou para promover a identificaçâo entre o cidadäo e o Estado é hoje um fenómeno regularizado e sistematizado. Isso é verdade mesmo que os órgaos do esporte internacional permaneçam ftincionalmente autónomos. Questóes relativas à conduta do esporte sao tratadas dentro da organizaçâo do esporte. Este último é um mecanismo autossuficiente no que diz respeito as reivindicaçôes rivais feitas pelos participantes diretos da competiçâo esportiva (KANIN, 1978, p. 519).
Como já dissemos, desde a publicaçâo em 1978 da compilaçâo de artigos acima citada, praticamente nada foi publicado sobre o tema no mundo anglo-saxäo até a ediçâo de outros tres trabamos essenciais:
1. "Sport and International Relations", de Trevor Taylor, publicado em livro organizado por Lincoln Allison (1986);
2. "Representing World Politics: The Sport/War Intertext", de Michael J. Shapiro, publicado no livro de M. Shapiro e J. Der Derian (1989), International/Intertextual Relations - Posmodern Readings of World Politics; e
3. Sport and International Politics, livro de Barrie Houlihan (1994).
O primeiro livro é a publicaçâo dos trabalhos apresentados na conferencia anual da Political Studies Association, em Manchester, em 1985. Trevor Taylor constata, no referido texto, que os livros de Relaçôes Internacionais praticamente ignoravam até entäo a questäo do esporte, ou apenas destinavam algumas linhas para comentar o tema. Nesse sentido, é muito revelador que a chamada escola inglesa, particularmente interessada nos fatores culturáis, tenha eia também praticamente ignorado o tema. Por exemplo, Hedley Bull, em seu livro A sociedade anárquica, publicado em 1977, tem urna única referencia ao esporte, quando se refere as organizaçôes desportivas (BULL, 2002, p. 313).
Entre o esporte e as Relaçoes Internacionais, havia o que Taylor (1986) chama de "negligencia mutua" (o título do seu texto é muito claro, "Sport and International Relations. A Case of Mutual Neglect"), já que ambos consideravam que operavam em dominios separados. Isso lhe parecía surpreendente dado o papel que o esporte tirina adquirido como elemento significativo nos assuntos internacionais e pelo fato de que os próprios governos consideravam o esporte importante demais para ser ignorado. Apesar do esporte nao estar no centro das relaçoes intergovernamentais, nem ter importancia essential ñas questôes de segurança e económicas, o mesmo deveria, segundo ele, ter sido mais estudado pelos especialistas ñas relaçoes internacionais, por quatre razôes:
1. é um fator de enorme importancia social e cultural;
2. a crescente internacionalizaçâo do esporte o tornou parte do sistema internacional, que, apesar de ser um sistema anárquico, pode ser influenciado pela interdependencia que o esporte cria;
3 . o esporte é um instrumento f ormidável para a política governmental;
4. as organizaçôes privadas internacionais que se ocupam do esporte sao muito importantes e deveriam ter sido estudadas no quadro da análise global das organizaçôes internacionais e transnacionais (TAYLOR, 1986).
A partir do inicio dos anos 1980, com a publicacäo das primeiras crí- ticas radicáis contra o neorrealismo de Kenneth Waltz (1979), ini- cia-se urna série de manifestaçoes que contestam a supremacía das abordagens teóricas dominantes (neorrealista e liberal) naquele mo- mento ñas Relaçôes Internacionais. O texto referido de Michael Shapiro, professor de Ciencia Política na Universidade do Havaí, "Representing World Politics: The Sport/War Intertext", faz parte de urna obra coletiva (SHAPIRO; DER DERIAN, 1989) que pretende apresentar urna análise das relaçôes internacionais do ponto de vista do pós-modernismo. A influencia de Michel Foucault, Jacques Der- rida, Roland Barthes e Jacques-François Lyotard é fundamental nes- sa abordagem e no texto citado: o mundo näo é urna realidade objeti- va que possa ser estudada, mas urna construçâo, um texto, ou melhor, um intertexto que apenas é acessível por meio da interpretaçâo ou das reinterpretaçôes que o pesquisador formule. O objetivo é desmistifi- car os conceitos vigentes (por exemplo, a anarquía do sistema inter- nacional e a soberanía dos Estados), problematizar as evidencias e convençôes, acabar com os fetiches e os "regimes de verdade". Nesse sentido, o texto de Shapiro analisa como os discursos sobre o esporte, cujos significados já foram designados pela cultura e aprendidos na vida cotidiana, servem como "stock of signs" (estoque de sinais) que permitem que a economia, a política e a guerra possam ter seu sentido figurado em termos de esporte. Dessa forma, as metáforas esportivas permitem mobilizar os individuos.
O terceiro trabalho citado é de Barrie Houlihan, sociólogo, professor desde 1998 de Sport Policy (Política do Esporte) na Universidade de Loughborough, Reino Unido, membro desde 201 1 da Academia de Ciencias S ociáis da Inglaterra, e também editor da International Journal of Sport Policy. Esta revista, criada em Janeiro de 2009, pu- blicou, numa ótica pluridisciplinar e comparativa, importantes con- tribuiçôes sobre o papel das organizaçôes governamentais transnaci- onais (Uniäo Europeia, Agencia Mundial Antidoping, UNESCO, Conselho da Europa) e das ONGs (Comité Olímpico Internacional, federaçôes internacionais) em relaçâo à regulaçâo e ao desenvolvimento do esporte.
E importante ressaltar aqui que praticamente a totalidade dos trabalhos existentes sobre o tema näo foi produzida na área das Relaçôes Internacionais, nem por historiadores ou sociólogos, mas por especialistas nos estudos sobre o esporte. Podemos citar como exemplo o caso de Benjamin Lowe, autor da citada primeira compilaçâo de artigos sobre esporte e relaçôes internacionais, que era formado em filosofia e lecionava na Faculdade de Educaçâo da Governors State University, Illinois. Podemos dizer a mesma cois a de Lincoln Allison,17 de James Riordan,18 de Pierre Arnaud19 e Barrie Houlihan.
A situaçâo é análoga no Brasil. Os livros publicados sobre o tema (que näo seräo analisados neste ensaio) sao obra, essencialmente, de historiadores, sociólogos, jornalistas e antropólogos (DRUMOND, 2008; MELO; DRUMOND, 2009; MELO et al., 2010; HELAL, 201 1, para citar os mais recentes). O texto mais importante sobre o tema escrito por um especialista em Relaçôes Internacionais é urna monografia de firn de curso do Instituto Rio Branco, de Douglas Wanderley de Vasconcellos, publicada em 201 1 . Infelizmente, o autor está mais interessado em fornecer, como ele mesmo afirma, um "receituário de propostas para uso do esporte na projecäo da imagem externa do Brasil" (VASCONCELLOS, 201 1, p. 25) do que em efetuar urna análise académica do assunto.
Barrie Houlihan (1994, p. 25) lamenta também que o tema tenha sido pouco abordado na área:
Apesar de muitos dos estudos sobre os Jogos Olímpicos lidarem com urna gama de assuntos relacionados as relaçôes internacionais, existem poucos estudos objetivando ser urna exploraçâo mais abrangente da importancia do esporte para a política internacional (Allison, 1986; Lowe et al 1978 säo duas importantes exceçoes).
Houlihan é o único autor que estabelece, explícitamente, um panorama geral da possível relaçâo entre as tres teorías ou paradigmas gérais das Relaçôes Internacionais com o esporte. Sua contribuiçâo é essencial para poder desenvolver futuras análises teóricas. Seu objetivo é apresentar de forma sintética como esses paradigmas (realismo, pluralismo e globalismo) poderiam abordar o papel e o significado do esporte na política internacional. Para tal firn, em primeiro lugar, estabelece urna tipologia, a partir dos tres tipos de atores ou agentes ñas relaçôes internacionais (Estados e organizaçôes internacionais governamentais; organizaçôes näo governamentais internacionais; individuos) e do grau de envolvimento e interaçâo dos diferentes recursos (finanças, individuos, conhecimento/cultura e territorio):
Em segundo lugar, o autor concluí que a abordagem teórica mais adequada para tratar do tema do esporte ñas relaçôes internacionais é o pluralismo. O realismo e o globalismo seriam paradigmas menos convenientes por centralizaren! as explicaçôes num único fator. O primeiro, ñas questöes políticas e tendo seu foco de análise centrado em um único ator, o Estado, e com urna preocupaçâo concentrada na segurança. O segundo, ñas relaçôes económicas de dependencia e dominaçâo.
A partir do texto de Houlihan, elaboramos um quadro sintético dos temas que, segundo o autor, fariam parte do interesse específico de cada um dos diferentes paradigmas teóricos, conforme Quadro 3 a seguir.
Entretanto, como já dissemos, apesar de o esporte constituir um tema interessante para todas as teorías, o pluralismo é considerado a abordagem mais adequada, e é adotada pelo autor no resto do livro20 pelas seguintes razöes:
[...] a perspectiva pluralista oferece urna estrutura muito mais favorável à análise, particularmente no que diz respeito ao reconhecimento explícito da importancia das ONGs e a sua preocupaçâo com os processos políticos. Urna perspectiva do sistema internacional que enfatize urna multiplicidade de intéresses e de recursos e que reconheça a importancia, para os Estados, de questôes que ultrapassem o escopo das relacionadas diretamente à segurança da ensejo a um contexto muito mais convincente para a análise. O perigo de que a perspectiva pluralista minimize muito acentuadamente a importancia do Estado é real, mas também pode ser superado. Que algumas organizacöes, como o Estado, possam desempenhar um papel de autoridade ñas relaçôes interorganizacionais é claramente reconhecido e pode ser incorporado no interior de urna perspectiva pluralista (HOULIHAN, 1994, p. 53).
A dimensäo cultural do fenòmeno é central, por isso ele destina um capítulo do livro à questäo do "esporte, cultura e globalizaçâo".
O esporte é o fenòmeno cultural mais importante do século XX, é um elemento no processo de globalizaçâo da cultura, é um recurso de política externa, e é a arena onde as relaçôes internacional s têm lugar, oferece urna rica variedade de contextos para explorar o significado do esporte na política mundial (HOULIHAN, 1994, p. 52).
De fato, as transformaçôes culturáis sao da maior importancia porque, como lembra Marcel Merle (1981, p. 136), mesmo "os fatos políticos, a começar pelo fato nacional, sao em grande parte fatos culturáis". Nesse sentido, o Estado-naçâo nao é constituido apenas de um territorio, urna populaçâo e instituiçôes comuns, mas de "um sistema de relaçôes fundamentado sobre a troca constante de inúmeras mensagens pelas quais seus cidadâos se comunicam, de preferencia entre si, do que com os cidadâos dos países vizinhos" (MERLE, 1981, p. 136). As informaçôes sobre o mundo exterior sofrem um duplo processo de seleçâo, o dos órgaos nacionais deinformaçâo (jomáis, radios, televisäo etc.) e, o que é mais importante, o do proprio público:
O público peneira, seleciona, memoriza, registra ou rejeita as mensagens que Ine chegam, em fiinçâo de um sistema de valores que lhe serve de certa maneira de grade ou de código para decifrar ou interpretar as informaçôes. Este sistema de valores (ou cultura) está em estreita dependencia do sistema educacional e especialmente dos estereotipos alimentados pelo ensino da historia e da literatura (MERLE, 1981, p. 136).
Isso explicaría, em grande medida, por exemplo, os resultados de recente pesquisa (entrevista de 8 mil pessoas, em 27 Estados e DF), fetta em 201 1, pela Sport+Markt. Eia revela que os jogadores em atividade mais queridos dos brasileiros sao Ronaldinho Gaucho (26%) e Neymar (25,9%). É interessante destacar que Messi, o melhor do mundo pela FIFA, só obteve 4% (KNOPLOCH, 2012, p. 8).
Entretanto, esse sistema de valores relativamente fechado, que Merle chama de cultura, foi "deteriorado" pelo desenvolvimento da rede nacional e mundial de comunicaçâo de massa e de informaçâo, com certa uniformizaçâo cultural do mundo.
Os debates hoje giram em torno da questäo da desintegraçâo ou näo dos particularismos culturáis e da eventual criaçâo de urna cultura planetaria; o papel das migraçôes internacionais e as comunicaçôes tornando as identidades extremamente flutuantes e multidimensionais. Mas urna coisa é certa: no mundo globalizado, o esporte, assim como o turismo e o entretenimento, é a única forma de lazer compartilhada por todos. Ele é um elemento essencial na chamada cultura de massas.
Atualmente, o novo sistema midiático globalizado da chamada "era da informaçâo" é um novo campo de enfrentamento onde ocorre o embate entre os Estados, as empresas transacionais e os novos movimentos sociais. O poder, num mundo dominado pelo sistema midiático, consiste em grande parte no controle da produçâo e na manipulaçâo de símbolos que possam seduzir. Dessa forma, o imenso poder de seduçâo do esporte e seu impacto económico nao podem hoje ser ignorados pelos Estados nem pela industria cultural. Nesse sentido, a geopolítica do esporte encontra-se no centro das disputas e rivalidades nacionais e internacionais, mas também, paradoxalmente, pode servir como vetor da paz e da cooperaçâo:
A nivel internacional, os acontecimentos desportivos como os Jogos Olímpicos e o Campeonato do Mundo proporcionam as únicas ocasiöes, em tempo de paz, durante as quais naçôes inteiras podem unir-se com regularidade e de forma visivel. A divulgaçâo do desporto a nivel internacional tem implicaçoes no aumento da interdependencia internacional e da existencia, com varias excepçôes notáveis, de urna paz mundial frágil e instável. Confrontos como os Jogos Olímpicos permitem aos representantes das diferentes naçoes competirem entre si sem se matarem, ainda que o grau em que semelhantes provas de combates simulados se transformaran! em confrontos "reais" esteja dependente, entre outros, do nivel de tensäo preexistente entre os Estados-naçoes envolvidos (ELIAS; DUNNING, 1992, p. 325).
O esporte pode ser também considerado um fator positivo na governança global. O homem, que é simultaneamente sapiens, faber e ludens, somente compartilha com o resto dos animais esta última capacidade. O homo ludens gosta de jogar e, com o desenvolvimento da cultura, o jogo se civilizou, o esporte se esportizou, quer dizer, colocou-se ordern e equilibrio no jogo por meio de regras escritas, arbitros, tribunals e sançôes claramente definidas (ELIAS; DUNNING, 1992, p. 335-336). Norbert Elias chega mesmo a sugerir que deveríamos nos basear no futebol para estudar as relaçôes entre Estados porque ambas sao configuraçôes näo planejadas e com grandes tensôes (ELIAS; DUNNING, 1992, p. 283).
Conclusâo
O esporte foi de fato um tema "negligenciado" na área das Relaçôes Internacionais:
No entanto, a dimensäo esportiva das relaçoes intemacionais, muitas vezes, ainda, näo desempenha quase nenhum papel na f ormacäo no campo da disciplina. Poderíamos esperar näo encontrar nenhuma mençâo ao esporte em alguma coleçâo com o nome de Clássicos das Relaçoes Intemacionais, mas parece estranilo näo encontrar nenhuma referencia ao assunto em monografías e compendios recentes, como, por exemplo, os manuais International Relations, de Michael Nicholson, e International Relations, de William Nester. Urna honrosa exceçào poderia ser o üvro International Relations, de Joshua Goldstein, que faz apenas duas referencias a organizacöes intemacionais do esporte em urna obra de mais de 600 páginas (ALLISON; MONNINGTON apud ALLISON, 2005, p. 5).
Entretanto, nos últimos anos foramproduzidos alguns trabalhos interessantes e inovadores, como, por exemplo, a coleçâo Sport in the Global Society (Routledge), dirigida por James Anthony Mangan, que publicou um numero importante de obras sobre temas variados e inovadores (futebol e imprensa, futebol e cultura, as mulheres e o esporte na China, esporte na América Latina, esporte e nacionalismo, a mercantilizaçâo do esporte etc). O proprio J. A. Mangan (1998) publicou, nessa coleçâo, The Games Ethic and Imperialism: Aspects of the Diffusion of an Ideal.
Dois livros dessa coleçâo chamaram particularmente nossa atençâo, e com eles vamos concluir nosso ensaio. O primeiro deles, organizado por Levermore e Budd (2004), é o mais importante, porque é destinado a tratar especificamente do tema: Sport and International Relations. An Emerging Relationship. Nele, após apresentarem um balanço da evoluçâo das pesquisas sobre esporte e relaçoes internacionais, os autores chegam as mesmas conclusôes que Trevor Taylor tinha chegado em 1986: ainda é urna questäo completamente negligenciada.
No livro, sao abordadas très grandes questôes: 1) como a expansäo do esporte profissionai aliada ao aumento das receitas geradas pela mass media ligada ao esporte transformou a economia política internacional; 2) o papel do esporte na nation building e nas questôes de identidade; e 3) o papel do esporte na diplomacia.
Os organizadores do livro elaboraram urna lista de propostas de pesquisas, a maioria délas já desenvolvidas no pròprio livro, nos seguintes temas27 (LEVERMORE; BUDD, 2004, p. 14): o crescente papel das ONGs do esporte como atores globais näo estatais; o papel do esporte na resoluçâo de confutes internacionais e na diplomacia (propaganda, economia); a construçâo de regimes globais do esporte e sua influencia na interdependencia; o esporte como arma de resistencia da oposiçâo contra forças dominantes dentro dos países ou por países periféricos contra os países centrais; o esporte como elemento importante na construçâo da "comunidade imaginaria" naciónal e como instrumento do prestigio nacional no exterior; o esporte e sua relaçâo com a mudança social e com as novas abordagens das teorías sociais (relaçâo do esporte com o capitalismo, os fenómenos de exclusäo-inclusäo, o progresso, a modernidade, a discriminaçâo, a identidade etc.); e esporte e gènero.
O segundo livro, editado por Lincoln Allison (2005), The Global Politics of Sport. The Role of Global Institutions in Sport, desenvolve novos temas, alguns deles já clássicos, mas no contexto atual de globalizaçâo do esporte: o papel e o poder das organizaçôes esportivas näo governamentais (FIFA, COI etc.); esporte e prestigio; os logos Olímpicos; os regimes de regulaçâo do esporte global; esporte e nacionalismo na era global; a americanizaçâo do esporte global; a construçâo de estrelas mundiais do esporte; e o desenvolvimento de tensôes dentro de esportes tradicionalmente "alternativos" (por exemplo, o surfe) no contexto da cultura comercial global.
Es sas listas de temas e novas abordagens devem ser um estímulo para que nossos estudantes dos cursos de Relaçôes Internacionais tomem consciência da importancia e atualidade do assunto, e de como ele oferece um campo enorme para futuras pesquisas num mundo em completa transformaçâo.
Resumo
Ref lexöes sobre o Lugar do Esporte nas Relaçôes Internacionais
As obras clássicas da disciplina Relaçôes Internacionais praticamente ignoram a questäo do esporte. A maioria dos trabalhos sobre as relaçôes entre o esporte e as relaçôes internacionais foi produzida por estudiosos do esporte ou por historiadores das relaçôes internacionais, geralmente sem urna proposta teorica explícita, com primazia das abordagens descritivas e empíricas e com propostas normativas. Apenas recentemente essa "negligencia" dos especialistas de Relaçôes Internacionais pelo esporte, mesmo entre aqueles autores que consideravam relevantes os fatores culturáis nas suas análises, começou a ter firn. O presente ensaio analisa criticamente os principáis temas relativos aos vínculos do esporte com as relaçôes internacionais que foram explorados nos últimos anos, suas implicaçôes e as perspectivas de futuras pesquisas sobre o assunto.
Palavras-chave: Esporte - Relaçôes Internacionais - Cultura - Teoria das Relaçôes Internacionais - Historia das Relaçôes Internacionais
Abstract
Reflections on the Place of Sport in International Relations
The classic works in the discipline of International Relations virtually ignore the issue of sport. Most studies on the relationship between sport and international relations were produced by scholars of sport or historians of international relations, usually without a explicit theoretical framework, using descriptive approaches and empirical and normative proposals at best. Only recently has this "negligence" of sports by International Relations specialists, even among those authors that take in consideration relevant cultural factors in their analyses, begun to wane. This article critically examines the main recent issues relating to the ties between sport and international relations, their implications and the prospects for future research on the subject.
Keywords: Sports - International Relations - Culture - International Relations Theory - History of International Relations
* Arrigo recebido em 27 de agosto de 20 1 2 e aprovado para publicaçâo em 2 1 de dezembro de 20 1 2.
Motas
1. Esta e as demais citaçôes de origináis estrangeiros foram livremente tradiizidas para este artigo.
2. As "classes médias" preferem o tenis e o golfe.
3. Poderíamos acrescentar um terceiro elemento: as novelas brasileiras.
4. Desde 1894 o COI teve apenas oito presidentes, e em 2013 é o belga Jacques Rogge, que ocupa o cargo desde 2001. Durante a presidencia de Juan Antonio Samaranch (de 1980 a 2001), o COI sofreu profundas mudanças por causa da comercializaçao de artigos comemorativos dos jogos, da venda dos direitos de transmissäo dos eventos olímpicos e de patrocinio dos jogos. Dessa forma, o orçamento atinge 2,8 bilhöes de dólares (ou seja, o equivalente, por exemplo, ao produto nacional bruto de países como o Mali). Com tamanha concentraçâo de recursos, o COI näo poderia ficar imune aos escándalos, como aconteceu, por exemplo, em 1998, na ocasiäo da designaçâo de Salt Lake City (Estados Unidos) como cidade sede dos Jogos Olímpicos de Inverno 2002, quando sete membres do COI foram excluidos, e outres quatre se demitiram após as denuncias de corrupçâo se tornarem públicas.
5. Das treze federaçôes internacionais que havia em 1 9 1 4, o mundo passou a ter 21 em 1918, e 29 em 1932. Grandes competiçôes internacionais säo organizadas após a primeira ediçâo dos Jogos Olímpicos de Atenas em 1896: patinagem (1896), tiro (1897), tênis (1900), ginástica (1903), esgrima (1921), ciclismo (1921), bobsleigh (1924), hóquei (1924), tenis de mesa (1927), luta (1929), futebol (1930) e esquí (1937). E importante lembrar que algumas competiçôes racionáis contam com grande participaçao internacional, como o Tour de France (1903) e o Tour d'Italie (o Giro) (1909).
6. Andrew Cooper, cientista politico canadense, cunhou o termo "celebrity diplomacy" (diplomacia das celebridades) para analisar o atual engaj amento de astros e estrelas em causas e campanhas mundiais. As celebridades esportivas também participam desse movimento: o ex-jogador de futebol Ronaldo, por exemplo, durante varios anos viajou a serviço do Programa das Nacöes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
7. Em 2004, a Nike baseara sua campanha de marketing no tema "speed" (velocidade), associando a marca a imagens de atletas patrocinados ñas últimas Olimpíadas. O objetivo era atingir um mercado mundial heterogéneo com um produto sem referencias geográficas.
8. Nesse sentido, os Jogos Olímpicos sao o acontecimento esportivo mais importante porque congregam os esportistas de todos os países, enquanto a Copa do Mundo de Futebol congrega apenas 32 equipes. Ñas Olimpíadas, todos os esportes estáo representados, até mesmo aqueles que sao pouco mediatizados, como a luta e o BMX. A título de comparaçâo: as primeiras Olimpíadas de Atenas, em 1896, contaram com apenas treze nacöes representadas, totalizando 285 participantes nos nove esportes representados. Em Atenas 2004, participaram 10.500 atletas, representando 201 comités olímpicos racionáis (a ONU na época contava com 191 Estados participantes). De alguns milhares de espectadores, passou-se a mais de 4 bilhöes!
9. Até entäo, os historiadores das relaçôes internacionais haviam manifestado interesse pelas mentalidades, opiniáo e ideologías, mas ignoravam as questöes culturáis propriamente ditas (SUPPO; LESSA, 2007). Dessa forma, o esporte, que é essencialmente urna questäo cultural (o lazer), deveria ter sido estudado de forma sistemática na área de Relaçôes Internacionais. Nao poderia ter sido de outra forma, já que praticamente todos os Estados desenvolveram, e desenvolvem ainda hoje, urna política cultural externa com o objetivo de procurar influencia e prestigio, e o esporte é urna das áreas privilegiadas. Na maioria dos países, antes da criaçâo dos Ministerios do Esporte, era o Ministerio da Cultura que se encarregava do esporte.
10. Robert L. Wendzel (1985, p. 205) divide os instrumentos de implementacáo da política externa em "tangíveis" (econòmico e militar) e "intangíveis" (comunicacáo e negociaçâo). A propaganda faz parte dos instrumentos "intangíveis" da política e pode ser definida como "esforço deliberado para modificar as atitudes e o comportamento de grupos externos, tendo em vista obter dessas audiencias-alvos urna reacáo favorável aos designios do propagandista". Para ser eficiente, a propaganda deve levar em conta os seguintes principios (que caracterizam também os esportes em geral): ser simples, atuar sobre as emoçôes, significar um interesse direto para o receptor, possuir certo grau de veracidade, ser perceptível e apresentar total identificacäo com a experiencia da populaçao-alvo. As armas da propaganda säo as transmissöes radiofónicas, os programas de televisäo, os artigos e editorials de jomáis, os intercambios culturáis, os seminarios, os artigos de revistas, os panfletos etc.
11 . A partir de 1 925 , os jornalistas começam a estabelecer quadros comparativos minuciosos das Vitorias e das medalhas por país com o objetivo de comparar as diferentes políticas esportivas nacionais. Em 1993, a FIFA criou o ranking mundial das seleçôes. Desde 2005, a Havas Sports & Entertainment (HS&E), agencia de marketing esportivo e entretenimento do Grupo Havas, organiza anualmente o estudo "Nations of Sports", em que säo levadas em conta as conquistas por países de medalhas em Mundiais e Olimpíadas. Em 201 1, foram avallados 119 países, e os Estados Unidos aparecem em primeiro lugar no ranking, com um total de 548 medalhas, seguido pela China (354) e pela Russia (330). O Brasil ocupa o 172 lugar, com 75 medalhas (NOGUEIRA, 2012, p. 5). O Greatest Sporting Nation (http://www.greatestsportingnation.com), site criado em 2008, também elabora um ranking mundial das potencias esportivas.
12. Posteriormente, esses textos da revista, acrescidos de alguns outros, foram publicados em um livro (MILZA et al., 2004).
13. Ver Kanin (1981).
14. Informaçôes disponíveis em: <http://www.sais-jhu.edu/academics/regional-studies/europe/faculty/kanin.htm> e <http://turkishcentralnews.com/archives/10363>. Acesso em: 18 jul. 2012.
15. Os autores mais representativos säo Robert Cox e Richard Ashley, cada um deles representando, respectivamente, as duas abordagens pós-positivistas radicáis mais importantes: a teoría crítica e a corrente pós-modernista.
16. Informaçôes disponíveis em: <https://docs.google.com/viewer?a= v&q=cache:K_dexNViqGQJ: www.gsuvault.govst.edu/bitstream/ 10982/ 3069/3/Inscapesl983_08_27.pdf>. Acesso em: 12 jul. 2012.
17. Leitor emérito de Política na Universidade de Warwick e professor visitante de Política do Esporte na Escola Chelsea de Esporte e Lazer da Universidade de Brighton. Foi também fundador, em 1993, do Centro de Estudos do Esporte na Sociedade (WCSSS), da Universidade de Warwick, na Inglaterra.
18. Falecido em fevereiro de 20 1 2, autor do clàssico "O esporte na sociedade soviética" (o primeiro olhar académico sobre o esporte na Uniäo Soviética), foi professor de estudos russos na Universidade de Surrey, onde foi diretor do Departamento de Linguistica e de Estudos Internacionais.
19. Historiador francés especialista em historia do esporte e da educaçao física, professor da Université Claude Bernard, Lyon, onde é fundador e dirige, desde 1985, o Centre de Recherche et d'Innovation sur le Sport (CRIS).
20. Em capítulos que tratam das organizaçôes internacionais do esporte näo governamentais e governamentais; o movimento Olímpico; a Commonwealth e o esporte; business e esporte; cultura, esporte e globalizaçao; esporte e politica internacional.
21. Nesse sentido, Marcel Merle considera um mito a uniformizaçao cultural do mundo. O que predominant säo as reaçôes nacionalistas contra a dominaçâo cultural imposta pelas grandes potencias, que controlam os meios de comunicacao. Como forma de resistencia, muitos países tentam se fechar sobre eles próprios, para defender seu patrimonio cultural.
22 . Por exemplo, no Brasil, representa atualmente aproximadamente 1 ,997% do ?G?, tendo movimentado, em 2010, R$ 78,6 bilhöes, com destaque para os chamados artigos esportivos (SPITZ, 2012, p. 30).
23. A ONU, após ter elaborado em 2003 o relatório "Sport for Development and Peace: Towards Achieving the Millennium Development Goals", declara 2005 Ano Internacional do Esporte e da Educaçao Física.
24. Em recente publicacäo (SUPPO, 2012), analisamos como a dimensäo cultural das relaçôes internacionais foi interpretada nos diferentes paradigmas teóricos das Relaçôes Internacionais e näo encontramos praticamente nenhuma referencia ao esporte como fator essencial ñas obras clássicas, nem ñas abordagens mais recentes, como, por exemplo, o construtivismo.
25. Os livros publicados nessa colecäo säo baseados nos trabalhos apresentados na conferencia da British International Studies Association (BISA), Universidade de Bradford, em dezembro de 2000.
26. Editor do The International Journal of the History of Sport e autor, entre outras livros, de Athleticism in the Victorian and Edwardian Public School (MANGAN, 2000) (a primeira ediçâo é de 1981, em que trata das maneiras como as elites imperials utilizam o esporte para a aculturaçao, a socializaçâo e o controle social).
27. Muitos deles já foram tratados anteriormente na bibliografia citada anteriormente.
28. A China, na sua atual ofensiva chinesa no continente africano, utiliza o futebol como elemento essencial na sua política de seducáo. Por exemplo, quatre estadios usados na Copa das Naçôes de 2010, disputada em Angola, foram financiados pelos chineses (ñas cidades de Luanda, Benguela, Lubango e Cabinda).
29. André Reszler e Alison Browning (1980) elaboraram urna tipologia com sete elementos principáis que, combinados, servem para a fabricaçâo da identidade moderna dos Estados: religiäo, lingua, historia, mitologia, raça, ideologia e cultura. A esses elementos se somam outres de importancia desigual, como, por exemplo, "a idade do povo" (velhas naçôes versus novas etc.), o messianismo, a extensäo territorial, o grau de civilizaçâo, o passado histórico, a contribuiçâo à historia europeia ou universal e a posiçâo perante as forças do progresso. Já Anne-Marie Thiesse (2000, p. 52) elaborou urna "check-list" identitaria matriz de todas as representaçôes de urna naçâo: ancestrais fundadores, continuidade da naçâo através das vicissitudes da historia, galería de heróis, lingua, monumentos culturáis e históricos, lugares de memoria, paisagem típica, folclore, identificaçôes pitorescas (costume, gastronomia, animal emblemático). Esses elementos comuns sao misturados de forma singular por cada urna das naçôes na construcáo de sua identidade. Chama a atencáo o fato de que o esporte é simplesmente ignorado por todos esses autores apesar de ele sempre ter sido um elemento identitário importante. De fato, apenas recentemente o esporte fora incorporado a essas listas de elementos identitários pelos especialistas e pelos próprios Estados: "Até os anos sessenta, o esporte representava somente interesse marginal para a maioria dos governos. Antes disso, a intervencáo governamental no esporte era geralmente urna reaçâo associada a problemas específicos, como padrees de saúde em áreas urbanas, necessidades militares ou erupçôes de desordem, e raramente consequência do reconhecimento do esporte (e do lazer) como área política distinta." (VASCONCELLOS, 201 1, p. 42).
30. Nesse sentido, säo interessantes as observaçôes de Clemens Wergin, editor internacional dos jomáis alemäes Welt e Welt am Sonntag, quando alenava, poucos dias antes da eliminaçào da Alemanna da Eurocopa 2012, sobre as consequências ruins para o país caso a Alemanna conquistasse o título. O sucesso alemáo reforçaria a imagem de urna nova superpotência no continente. Para Wergin, a selecáo deveria perder, fazendo assim "um grande serviço à política extema" do país (WERGIN, 2012, p. 6).
31. Na Franca, por exemplo, os debates sobre a identidade francesa foram acirrados na última Copa do Mundo de Futebol, quando a selecáo nacional fora desqualificada por causa, segundo muitos franceses, da falta de patriotismo dos jogadores, muitos deles negros ou mestiços e descendentes de imigrantes. Ao mesmo tempo, era explicado o sucesso alemáo na Copa pela "receita multiétnica" da seleçâo, na quai onze dos 23 jogadores eram "estrangeiros" ou descendentes de imigrantes.
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Hugo Suppo**
** Doutor em Historia das Relaçoes Internacionais pela Universidade de Paris m e professor do Programa de Pos-Graduaçâo em Relaçoes Internacionais (PPGRI) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: hugorogeliosuppo@mac.com.
Hugo Suppo Doutor em Historia das Relaçôes Internacionais pela Universidade de Paris III e professor do Programa de Pós-Graduaçâo em Relaçôes Internacionais (PPGPJ) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
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Copyright Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Jul-Dec 2012
Abstract
The classic works in the discipline of International Relations virtually ignore the issue of sport. Most studies on the relationship between sport and international relations were produced by scholars of sport or historians of international relations, usually without a explicit theoretical framework, using descriptive approaches and empirical and normative proposals at best. Only recently has this "negligence" of sports by International Relations specialists, even among those authors that take in consideration relevant cultural factors in their analyses, begun to wane. This article critically examines the main recent issues relating to the ties between sport and international relations, their implications and the prospects for future research on the subject. [PUBLICATION ABSTRACT]
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