Submetido 10/03/2017 - Aceito 27/08/2017
DOI: 10.15628/holos.2017.5756
RESUMO
A política pública PROEJA - Programa Nacional de Integraçao da Educaçao Profissional com a Educaçao Básica na Modalidade de Educaçao de Jovens e Adultos - EJA- objetiva oferecer oportunidade de estudos aqueles que nao tiveram acesso ao ensino médio na idade regular, constitui-se numa política pública de inclusao social. O presente trabalho consiste numa avaliaçao ex post dessa política no IFBA - Instituto Federal de Educaçao, Ciencia e Tecnologia da Bahia - campus Santo Amaro - BA, curso Técnico em Segurança do Trabalho, com o objetivo de averiguar se e em que medida a sua execuçao favorece a inclusao socioeducacional do público da EJA, no sentido de contribuir para a integraçao sociolaboral desses cidadaos e cidadas. Optamos pela corrente filosófica do materialismo histórico dialético, baseada nas ideias de Marx e Engels, cujas categorias teóricas sao fundamentais para compreendermos as contradiçöes inerentes ao processo histórico atual. Elegemos tres categorias empíricas de análise: condiçöes de acesso, permanencia e conclusao do público-alvo. Aliamos dados quantitativos e qualitativos, coletados através de entrevistas semiestruturadas com as testemunhas-chave da instituiçao e atividade de Grupo Focal com os estudantes. Constatamos que a forma como a política vem sendo executada consiste numa nova negaçao dos direitos denegados aos sujeitos da EJA. O objetivo é apontar as nuances que já se apresentam em termos de desvios, distorçöes, exclusao e negaçao de direitos devido ao modo de execuçao da política
PALAVRAS-CHAVE: Política Pública, PROEJA, Educaçao, Exclusao, Inclusao
ABSTRACT
The Public Politic PROEJA - National Program of Integration of Professional Education with the basic education in the modality of Adults and Youngsters Education - EJA - aims to offer the opportunity of study for those which didn't have access to high school in the regular age, it is based in a public politic of social inclusion. The present work consists of an ex post evaluation of this politic in IFBA - Federal Institution of Education, Science and Technology of Bahia - Campus Santo Amaro - BA, Technical Course in Work Security with the objective of verifying whether and in what measure its execution favors the socioeducational inclusion of EJA's audience, in the way of contributing to the sociolaboral integration of these citizens. We opted for the philosophical stream of dialectical historic materialism, based on the ideas of Marx and Engels which theoretic categories are fundamental for our understanding of the inherent contradictions of the present historical process. We elected three empiric categories of analysis - access conditions, permanence and conclusion of the target audience. We collected and gathered quantitative and qualitative data through semistructured interviews with key-witnesses of the institution and with students of the focal group activity. We verified that the way how the politic has been executed consists in a new denial of rights already denied to EJA's subjects. The objective is to point out the nuances which already are present in the terms of deviations, distortions, exclusion and denial of the rights due to the way the politics has been executed.
KEYWORDS: Public Politics, PROEJA, Education, Exclusion, Inclusion.
1.INTRODUÇAO
Dentre tantas desigualdades sočiais que assolam Brasil, o acesso a educaçao formal e a profissionalizaçao é, ainda, um dos grandes desafios tanto para o Estado quanto para a sociedade. A última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) revela que, de 1997 para 2007, o percentual de familias com rendimento familiar per capita de até % salario mínimo caiu de 31,6% para 23,5%. Contudo, apesar dessa reduçao significativa, mas insuficiente, as diferenças sociais sao ainda gritantes e exigem medidas e políticas efetivas de inclusao.
Barros e Mendonça (1995) afirmam que, cada ano de escolaridade adicional tende a elevar o nivel salarial de um trabalhador em aproximadamente 15%. Ainda segundo esses autores, é difícil imaginar políticas de combate a desigualdade salarial no Brasil que possam ter um poder comparável ao das políticas educacionais voltadas para a reduçao da desigualdade educacional.
Nessa perspectiva, o combate as desigualdades sociais perpassa a reduçao da desigualdade educacional. É preciso incluir os mais marginalizados, os jovens e adultos que nao conseguiram concluir os estudos. Historicamente, essa parcela da populaçao brasileira carece de políticas públicas educacionais que lhe permitam dar prosseguimento aos estudos, visto que os programas de alfabetizaçao de jovens e adultos tinham outro foco: alfabetizar, nao eram projetos educacionais. Na maioria das vezes, os estudantes satisfaziam-se quando aprendiam a assinar o nome ou ler pequenos textos, placas, faixas, folhetos, pois nao havia uma política que lhes permitisse vislumbrar avanços nos estudos para melhorias nas suas condiçöes sociolaborais.
É nesse contexto que surge o PROEJA, política pública de cunho compensatorio, cujo objetivo é favorecer o acesso de cidadas e cidadaos brasileiros que foram expulsos do sistema escolar por problemas encontrados dentro e fora da escola. O objetivo é nao somente elevar o nível de escolaridade, como também oportunizar formaçao profissional em nível técnico para minimizar o problema da elevaçao da renda.
Desde 2003, algumas instituiçöes da Rede Federal de Educaçao Técnica -CEFET- já desenvolviam experiencias de educaçao profissional com jovens e adultos. Com o Decreto n°. 5.478 de 24/06/2005, o entao presidente, Luís Inácio Lula da Silva, criou o PROEJA - Programa de Integraçao da Educaçao Profissional ao Ensino Médio na Modalidade Educaçao de Jovens e Adultos - importante passo para a EJA. Entretanto, estudiosos, movimentos sociais e sociedade civil organizada reivindicaram ampliaçao da política no sentido de abranger também o Ensino Fundamental.
No ano seguinte, o presidente, através do Decreto 5.840, de 13 de julho de 2006, em substituiçao ao decreto anterior, criou o PROEJA - Programa Nacional de Integraçao da Educaçao Profissional com a Educaçao Básica na Modalidade de Educaçao de Jovens e Adultos - contemplando também o Ensino Fundamental através do PROEJA FIC - Formaçao Inicial e continuada com profissionalizaçao para o público da EJA.
A oferta do PROEJA coube, inicialmente, por força do primeiro decreto, aos Institutos Federais. Depois, o segundo decreto possibilitou que outras instituiçöes pudessem ser proponentes, como os sistemas de ensino estaduais, municipais e entidades privadas nacionais de serviço social aprendizagem e formaçao profissional.
O IFBA - Instituto Federal de Educaçao, Ciencia e Tecnología da Bahia - passou a ofertar cursos na modalidade PROEJA nos Campi Salvador, Vitoria da Conquista e Barreiras a partir de 2007. Em 2010, o campus Santo Amaro também iniciou a oferta do curso Técnico em Segurança do Trabalho nesta modalidade.
Essa expansao, envolvendo os Institutos Federais de Educaçao, impðe a necessidade de acompanhamento da execuçao e avaliaçao da política a fim de averiguar se os propósitos e objetivos estao, de fato, sendo atingidos.
O presente trabalho, portanto, caracteriza-se como avaliaçao ex post - ou avaliaçao de objetivos- da Política Pública PROEJA, um modelo específico de avaliaçao de políticas públicas, baseado em objetivos quando estes estao claramente definidos e constituem parámetros explícitos para o trabalho de avaliaçao.
A política pública PROEJA no IFBA Campus Santo Amaro, curso Técnico em Segurança do Trabalho, configurou-se, assim, como objeto de estudo deste trabalho. Tendo em vista que o PROEJA apresenta-se como uma política dentro dos princípios de educaçao inclusiva, compensatória e democrática, o problema norteador desta pesquisa foi "nos limites do PROEJA aqui em destaque, como se dá concepçao, a execuçao e o desempenho do PROEJA no IFBA campus Santo Amaro no que se refere ao acesso, a permanencia e a conclusao com vistas a inclusao socioeducacional do público da EJA?"
Para responder essa pergunta, traçamos como objetivo geral, "avaliar a execuçao e o desempenho da política pública do PROEJA no IFBA campus Santo Amaro no que tange ao acesso, a permanencia e a conclusao do público- alvo, na perspectiva de compreender também como se constitui esse programa sob a visao dos estudantes que o prestigiam".
Para tanto, estabelecemos como objetivos específicos:
* Verificar, a partir da aproximaçao das cond^ðes de acesso com o perfil dos ingressantes, em que medida o público que prestigia o PROEJA corresponde aquele contemplado pela política.
* Identificar quais os fatores que contribuem para a permanencia, reprovaçao ou evasao dos estudantes;
* Identificar e apontar os aspectos mais marcantes que emergem da experiencia dos estudantes eleitos como sujeitos desta pesquisa.
Entre as diversas conside^ðes, a partir dos resultado da avaliaçao ex post da política, está a constataçao de que a política pretensamente inclusiva, da forma como vem sendo executada na instituiçao e campus estudados, em grande medida, consiste numa nova negaçao de direitos para o público da EJA no acesso a inclusao socioeducacional.
2.REVISAO BIBLIOGRÁFICA
Apesar de a política ser relativamente recente, já há muitos estudos sobre o tema. No intuito de estabelecer o estado da arte, buscamos, nos periódicos da Coordenaçao de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES - e outras fontes , estudos, artigos, d¡ssertaçðes e teses sobre o PROEJA.
O Programa de Apoio ao Ensino e a Pesquisa Científica e Tecnológica em Educaçao Profissional Integrada a Educaçao de Jovens e Adultos (PROEJA), realizado pela Capes e pela SETEC -Secretaria de Educaçao Profissional e Tecnológica do MEC - Ministério da Educaçao, através do Edital PROEJA - Capes/Setec n° 03/2006, buscou aumentar a produçao científica e estimular criaçao de cursos de pós-graduaçåo strictu sensu na área da política para ter um feedback da sua execuçao.
Os estudos e trabalhos produzidos, relacionados a educaçao profissional de jovens e adultos, tratam de questðes como o aumento da escolaridade, a inclusao no mundo do trabalho, a capacitaçao, formaçao de professores, o PROEJA como política pública. Como, na data do edital, o PROEJA tinha apenas um ano de criaçao, nao encontramos estudos sobre avaliaçao do desempenho da política - avaliaçao ex post ou de objetivos.
A produçao académica e científica sobre essa política é bastante significativa, especialmente quanto a avaliaçao da aprendizagem; avaliaçao do estudante, como: "avaliaçao da aprendizagem do PROEJA", de Cristiane Regina Ferrari (IFRS-BG) 2013; "Avaliaçao do PROEJA mediante a (re)construçao da identidade e reconhecimento dos educandos", periódico da UFPB, 2013, de autoria de Luciana Maffasioli e Maria Teresinha Kaefer.
O Instituto Federal do Rio Grande do Norte -IFRN - também possui vasta produçao sobre o PROEJA, mas nenhum estudo específico sobre os resultados produzidos em confrontaçao com os objetivos estabelecidos pela política.
Para compreendermos a dialeticidade entre exclusao\inclusao, apoiamo-nos na discussao conceitual empreendida por SAWAIA, DEJOURS, WANDERLEY (2001), POCHMANN e AMORIM (2003), conceitos esses indissociáveis quando o que está em voga é uma política pública inclusiva, a qual objetiva incluir e manter, no sistema educacional, o público da EJA, historicamente excluído do acesso a educaçao.
A história da EJA, Segundo PINTO (1991), caracteriza-se como uma das mais perversas formas de exclusao e apresenta dez liçöes sobre EJA a fim de nortear educadores e estudiosos do tema. Conhecer essa trajetória é fundamental para que possamos perceber a relevancia das políticas públicas inclusivas e afirmativas para esses brasileiros e brasileiras órfaos do Estado.
Realizar uma avaliaçao ex post de uma política requer aprofundamento no conhecimento sobre os conceitos basilares de políticas Públicas. RUA (1998), EASTON (1953), SECHI (2010), OLIVEIRA (2011) , CURY (2005) apresentam conceitos e discussoóes salutares para pesquisadores e estudiosos. Nem sempre há consenso entre os autores, mas, em síntese, suas discussóes sao enriquecedoras para qualquer investigador da área da educaçao.
A avaliaçao de políticas públicas, assim como de outros processos, é entendida como última etapa do ciclo de políticas e é imprescindível justamente porque é por meio dela que desvios e equívocos podem ser corrigidos a fim de que os objetivos sejam alcançados. Nesse sentido, SARAVIA e FERRAREZI (2006), SOUZA (2003) HOLANDA (2006) apresentam importante discussao sobre eficiéncia, eficácia e impactos das políticas, a qual nos permitiu realizar a interpretaçao e análise quantitativa e qualitativa dos dados coletados.
Enfim, adotamos no presente trabalho o conceito de avaliaçao de WIESS (1998), segundo a qual,
Avaliaçao é uma análise ponderada e sistemática ("sistematic assessment") da operaçao e/ou dos resultados de uma política ou um programa, em confronto com um conjunto de padroes implícitos ou explícitos, tendo como objetivo contribuir para o aperfeiçoamento desse programa ou política. (1998, p. 4)
Nossa discussao apoia-se, portanto, nos autores citados e em muitos outros que nos forneceram importante arcabouço conceitual, teórico e metodológico para realizarmos a avaliaçao Ex post da política Pública PROEJA no IFBA, Campus Santo Amaro-BA.
3.METODOLOGIA
Dada a dialeticidade contida no par exclusao/inclusao no contexto desta sociedade neoliberal ou pós-liberal, optamos pela corrente filosófica do materialismo histórico dialético, baseada nas ideias de Marx e Engels, cujas categorias teóricas sao fundamentais para compreendermos as contradiçöes inerentes ao processo histórico atual e que enriquecem as reflexóes decorrentes do processo de investigaçao sobre políticas educacionais.
Buscamos interpretar a concepçao, a execuçao e o desempenho do PROEJA a luz da dialética, cujas leis - da passagem da quantidade a qualidade, da unidade e da luta dos contrarios e da negaçao da negaçao (TRIVINOS, 2009) - fornecem importante arcabouço teóricometodológico para entender a realidade que, em si, é dialética.
Este trabalho buscou compreender as contradiçöes entre as concepçöes basilares da política pública PROEJA, considerando todos os documentos que a regulamentam - e a sua efetiva execuçao no IFBA Santo Amaro - a partir do pressuposto de que só é possível uma política de inclusao em uma sociedade que minimize a exclusao neoliberal com vistas a sua superaçao, ao seu exterminio, o que caracteriza a unidade dos contrarios.
Para averiguar se há uma afirmaçao de direitos ou uma nova negaçao desses mesmos direitos, optamos por aliar dados quantitativos e qualitativos. Assim, a abordagem dessa pesquisa seguiu o viés proposto por Gamboa (2009) e Oliveira (2007), qual seja, a unidade dos paradigmas da abordagem quantitativa e qualitativa em pesquisa nas ciencias humanas e da educaçao. Assumimos, entao, uma perspectiva dialética entre quantidade e qualidade, por entendermos que essa interaçao concorre para a validaçao dos nossos resultados.
Dividimos a pesquisa em 04 etapas distintas. Na primeira, realizamos análise documental do Documento-Base do PROEJA, dos decretos, Parecer, Resoluçöes, PDDI -Plano de Desenvolvimento Institucional do IFBA, Plano de Curso, Oficio Circular da Secretaria de Educaçao Profissional e Tecnológica, LDBEN 9394/96 - Lei de Diretrizes e Base da Educaçao - e-mails, objetivando contrapor a concepçao e regulamentaçao da política e a perspectiva institucional do IFBA.
A segunda etapa consistiu no levantamento e coleta de dados quantitativos através da consulta aos arquivos da CORES - Coordenaçao de Registros Escolares - relaçao dos estudantes matriculados no curso de 2010 a 2014, as atas dos conselhos de Classe de todos os módulos do período, e o número de estudantes efetivamente cursando no semestre 2014.2.
No dia 26 de fevereiro/2015, com a ajuda de professores parceiros da pesquisa, aplicamos formularios junto aos estudantes com vistas a traçar seu perfil socioeconómico e educacional. Esses dados subsidiaram a elaboraçao dos instrumentos de coleta de dados qualitativos.
Posteriormente, na terceira etapa, de posse das problemáticas reveladas nas etapas anteriores, coletamos as informaçöes qualitativas por meio de entrevistas semiestruturadas com testemunhas-chave do campus e da reitoria: Pró-reitora de Ensino; Diretor do Departamento de Seleçao; o atual e os ex-coordenadores de curso, o diretor geral do Campus; pedagogas e assistentes sociais.
Aplicamos a técnica de grupo focal (GATTI, 2005) com os estudantes para compreendermos como se dá a (com) vivencia do PROEJA, quais as dificuldades, anseios, mudanças e permanencias que o cotidiano escolar traz as suas vidas.
Na última etapa, após a contraposiçao entre concepçao e execuçao da política, entre os dados quantitativos e qualitativos, buscamos estabelecer uma síntese da realidade estudada para, finalmente, avaliar o desempenho da política pública de PROEJA no IFBA campus Santo Amaro no que tange ao acesso e a permanencia com vistas a conclusao para inclusao do seu público-alvo.
4.POLÍTICAS PÚBLICAS
Para avaliar uma política pública, é fundamental compreender os conceitos e os processos para sua formulaçao. Partimos, entao, da premissa de que a principal funçao do Estado, numa democracia, é proporcionar as condiçöes básicas para que as pessoas aprendam a lidar com os conflitos, evitando e/ ou sobrevivendo aos confrontos. Sua funçao, enfim, tem como substrato o "bem-estar" da sociedade. Para cumprir tal funçao, necessita desenvolver diversas açöes e atuar em diferentes áreas, como saúde, educaçao, segurança, transporte público, meio ambiente etc. Essa atuaçao pode se dar por meio das Políticas Públicas.
Easton (1953) descreve as políticas públicas como um produto do processo político que transforma inputs (demandas e apoios) em outputs (decisôes e açöes). A sociedade civil pôe a cidadania em açao e, através de grupos organizados, faz seu apelo aos seus representantes do poder legislativo, os quais acionam o poder executivo para que atendam as solicitaçöes da populaçao. Assim, essas demandas entram para a agenda política, e a decisao política origina a política pública para solucionar o conflito.
Existem dois tipos de política pública: a de governo e a de Estado. Oliveira considera que
Políticas de governo sao aquelas que o Executivo decide num processo elementar de formulaçao e implementaçao de determinadas medidas e programas, visando responder as demandas da agenda política interna, ainda que envolvam escolhas complexas. Já as políticas de Estado sao aquelas que envolvem mais de uma agencia do Estado, passando em geral pelo Parlamento ou por instancias diversas de discussao, resultando em mudanças de outras normas ou disposiçöes preexistentes, com incidencia em setores mais amplos da sociedade. (OLIVEIRA, 2011, p. 323)
As políticas públicas de governo sao elaboradas para execuçao durante aquele governo. O governante que o suceder poderá dar-lhes continuidade ou extingui-las sem necessidade de aprovaçao do legislativo. Já as políticas públicas de Estado estao para além do governo, visto que dependem de aprovaçao pelo Congresso Nacional, por isso sao de longo prazo e os governos seguintes deverao dar-lhes continuidade. Contudo, caso desejem extingui-las, necessitarao da aprovaçao do legislativo.
O PROEJA é uma política do Governo Lula, mas a sua sucessora, Dilma Rousseff, bem como Michel Temer, deram continuidade aos Programas, através dos quais a política se materializa. Contudo, permanece como política de governo, pensada e executada pelo estado e visa a atender grupos excluídos que ficaram a margem dos processos educacionais, tentando equilibrar, no dizer de Cury (2005), os princípios de igualdade e de equidade, uma vez que o acesso aos bens sociais e culturais sempre foi privilégio de grupos hegemônicos. Desse modo, a política em estudo representa, por parte do estado, o reconhecimento de que os jovens e adultos com distorçao série/idade devem ser sujeitos de direitos de uma educaçao de qualidade com profissionalizaçao.
4.1. Avaliaçao de políticas públicas
A avaliaçao de políticas públicas, assim como de outros processos, é entendida como última etapa do ciclo de políticas e é imprescindível justamente porque é por meio dela que desvios e equívocos podem ser corrigidos a fim de que os objetivos sejam alcançados.
Neste trabalho, adotamos o conceito de avaliaçao de Carol Weiss, segundo a qual,
Avaliaçao é uma análise ponderada e sistemática ("sistematic assessment") da operaçao e/ou dos resultados de uma política ou um programa, em confronto com um conjunto de padröes implícitos ou explícitos, tendo como objetivo contribuir para o aperfeiçoamento desse programa ou política. (WIESS, 1998, p. 4)
Para Costa e Castanhar (2003), a avaliaçao pode ser feita ex ante - anterior a implementaçao; ex post - posterior a implementaçao; ou in itinere - durante o processo de implementaçao, com o objetivo de identificar e executar ajustes imediatos. Ressalte-se que, conforme o Documento-base, o monitoramento e avaliaçao, desde a implantaçao aos resultados, é responsabilidade do Estado. No caso do PROEJA, tal responsabilidade foi atribuida ao MEC e a SETEC.
Como o objeto de estudo deste trabalho é uma política que já está em andamento - o que exclui a avaliaçao "ex ante" - e se caracteriza como uma intervençao social, cujo objetivo é a atenuaçao, reduçao gradativa até a extinçao de condiçöes sociais julgadas insatisfatórias, a avaliaçao de que tratamos aqui é a chamada avaliaçao "ex post", um modo específico de avaliar uma política já implantada e em execuçao há tempo suficiente para produzir resultados. Consiste, portanto, na avaliaçao do seu desempenho através da confrontaçao ou conformaçao entre os dados coletados - política de acesso, púbico-alvo; evasao, permanencia, reprovaçao, conclusao - e os objetivos da política, explícitos no seu Documento-Base, no intuito de caracterizar os aspectos da eficiencia, eficácia e impactos, a partir da interpretaçao dos resultados alcançados.
5.DO ACESSO A PERMANENCIA PASSANDO PELOS EDITAIS E PROVAS DO PROCESSO SELETIVO DO PROEJA
Toda e qualquer política ou programa destinado aos sujeitos da EJA consiste, necessariamente, em se pensar na e com a diversidade para que, de fato, se efetive o direito a educaçao mediante uma coerente política de acesso, permanencia e condiçöes de conclusao do aluno jovem e adulto. O processo seletivo, portanto, deve pautar-se na clara compreensao das especificidades da EJA e, no caso do PROEJA, da sua relaçao com a Educaçao Profissional e o Ensino Médio a fim de garantir a democratizaçao no acesso universal, que equivale a uma concorrencia entre iguais, membros de um mesmo universo, neste caso: estudantes com distorçao série/idade e que nao concluíram o Ensino Médio.
Diversos estudos comprovam que, historicamente, as dificuldades de acesso e permanencia na EJA sao recorrentes, tanto por questöes de oportunidades, como também em razao de questöes da própria escola. Segundo Arroyo,
Os jovens e adultos da EJA sao uma denúncia clara da distancia intransponível entre as formas de vida a que é condicionada a infancia, adolescencia e juventude populares e a teimosa rigidez e seletividade de nosso sistema escolar. Olhar-se no espelho das trajetórias dos jovens e adultos que voltam a EJA talvez seria uma forma do sistema reconhecer a distancia intransponível. Nao foi a EJA que se distanciou da seriedade do sistema escolar, foi este que se distanciou das condiçöes reais de vida dos setores populares. (ARROYO, 2005, p. 48-49)
O processo seletivo, portanto, deve considerar as condiçöes reais de vida desses estudantes que foram expurgados do sistema educacional e ficaram a margem do acesso ao conhecimento. Arroyo (2003) chama a atençao para o fato de se falar de aluno evadido, nao de aluno excluido. De fracasso do aluno, nao do fracasso da escola.
As condiçöes de acesso no IFBA foram divididas em dois momentos: De 2010 a 2011: nesse período, uma das etapas do processo seletivo consistía numa prova objetiva com 36 quetöes sobre Língua Portuguesa, Matemática, História e Geografia A seleçao, portanto, dava-se por mérito; de 2012 a 2014, os editais substituíram as questöes objetivas por uma redaçao e entrevista com assistente social e pedagoga para avaliaçao de vulnerabilidade socioeconómica e escolaridade. A redaçao com peso 6,0, e a entrevista com peso 4,0. Entretanto, a redaçao é eliminatória, só passa para a entrevista o candidato que seja aprovado na redaçao, o que equivale afirmar que prevalecem, ainda, os princípios meritocráticos em detrimento do acesso universal.
Para 2010, foram disponibilizadas 40 vagas com apenas uma entrada anual; em 2011, foram 55 vagas, 30 no primeiro semestre e 25 no segundo; em 2012, em decorrencia de uma greve que perdurou por mais de trés meses, houve apenas uma entrada no 2- semestre com oferta de 40 vagas. De 2013 a 2014, foram duas entradas anuais com 25 vagas para cada semestre. Portanto, no período estudado, foram oferecidas, 235 vagas.
Para analisar as condiçöes de acesso, optamos por dividir as etapas de todo o processo. Abordaremos inicialmente os editais buscando compreender os criterios para inscriçao. Em seguida, trataremos do processo seletivo e suas etapas para melhor apreensao do perfil dos ingressantes.
5.1 Editais: pré-requisitos para inscriçao no processo seletivo
O Documento Base apresenta consistente caracterizaçao da EJA e faz excelente contextualizaçao da crítica realidade vivida por esses brasileiros; aborda os processos de marginalizaçao e negaçao de seus direitos e das desigualdades profundas, injustas e cruéis que os caracterizam. Em seguida, especifica "Os grupos destinatários da política de integraçao da educaçao profissional técnica de nivel médio e o ensino médio na modalidade EJA":
O imenso contingente de jovens que demanda a educaçao de jovens e adultos, resultante de taxas de abandono de 12% no ensino fundamental regular e de 16,7% no ensino médio, acrescido de distorçao idade-série de 39,1% no ensino fundamental e de 53,3% no ensino médio (BRASIL, 2001), revela a urgéncia de tratamento nao fragmentado, mas totalizante e sistémico, sem o que se corre o risco de manter invisibilizada socialmente essa populaçao, frente ao sistema escolar e, seguramente, no mundo do trabalho formal, exigente de certificaçöes e comprovaçöes de escolaridade formal. (BRASIL, 2007, p.14, grifo nosso)
Em todo o documento há referencia a política como "inclusiva", afirmativa, de combate as desigualdades. Essa política, portanto, destina-se aos jovens e adultos com distorçao série-idade e que tenham concluido apenas o Ensino Fundamental. Um jovem ou adulto que já tenha o Ensino Médio completo já concluiu a educaçao básica e, portanto, nao se caracteriza como público-alvo da EJA, visto que nao há distorçao e se em algum momento houve, já foi sanada.
Em todos os editais do processo seletivo do IFBA, no item 4.2, que trata dos cursos na modalidade de EJA - no caso, o PROEJA - apresenta os pré-requisitos dos candidatos para essa modalidade de ensino:
[...] o candidato deverá apresentar o seguinte pré-requisito: ·Ter a idade mínima de 18 anos; · Ter concluido o Ensino Fundamental (8- série) (IIFBA, 2010-2014)
Interessante observar que a redaçao quanto aos pré-requisitos fica bastante vaga ao delinear os destinatários da política, nao há objetividade quanto ao nível de escolaridade, visto que qualquer indivíduo com formaçao além da exigida sente-se perfeitamente contemplado. Sobre a redaçao dos editais, os coordenadores do curso (anterior e atual), o coordenador do processo seletivo e o diretor do campus, em entrevista, declararam que concordam que essa redaçao poderia ser mais clara e objetiva, como claro e objetivo é o Documento-Base.
Já a Pró-reitora, durante a entrevista, demonstrou possuir outro entendimento, na sua concepçao:
Tudo no serviço público, vocé nao pode fazer restriçao e descriçöes. Entao, se qualquer uma de nós quiser fazer um concurso para residéncia médica sem nunca ter feito uma faculdade de medicina, nós vamos fazer. O que vai acontecer é que na hora da inscriçao vai ter que verificar se a pessoa tem o requisito do programa e aí aceitar ou nao sua inscriçao. Como a questao do PROEJA, ele restringe em relaçao a questao da escolaridade e a própria questao da idade, a idade até que a gente consegue segurar bem, mas em relaçao a escolaridade, fica muito complicado, eu entendo a situaçao dos campi, porque, tendo vaga ociosa, voce dizer: olha, voce nao entra porque voce tem um requisito a mais. Entao, assim, é uma situaçao muito complicada. (Entrevista realizada em 17.03.2015)
A justificativa é que o público da EJA nao se inscreve, embora nao haja nenhum levantamento oficial quanto aos inscritos. A incipiente presença deste público no PROEJA nao pode ser justificada pela falta de procura, visto que Santo Amaro teve forte tradiçao na lavoura canavieira, comportando importantes engenhos de açûcar, e grande parte da populaçao é descendente de quilombolas, o que se reflete diretamente no alto índice de pobreza que, segundo o Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil, de 2010, é de 56,47%, e a taxa de jovens entre 18 e 20 anos com Ensino Médio completo, de apenas 26,78% (PNUD, 2010). Esses dados sao alarmantes e revelam o quanto o PROEJA é necessário justamente porque há público. Todavia, o processo seletivo concorre para sua exclusao ao estabelecer uma concorrencia igual entre diferentes sem considerar as diferenças de percurso educacional do público-alvo e suas especificidades.
Contraditoriamente a fala da Pró-reitora, a prova de redaçao do processo seletivo, com peso seis, e numa concorrencia igual entre 'diferentes', nao apenas é restritiva, mas é também provocadora de resultados arbitrários e contra a própria natureza da política, visto que privilegia candidatos que já concluíram a Educaçao Básica.
Da última etapa do processo seletivo, entrevista com as assistentes sociais e pedagogas do campus, cujo objetivo é a definiçao do perfil socioeconómico e pedagógico do candidato, participam 'apenas' os aprovados na redaçao - nesse caso, institucionalmente, a restriçao é legal - e o peso da redaçao é 6,0, enquanto da entrevista é apenas 4,0. Nega-se, aqui, a inclusao em favor da exclusao, da manutençao do status quo.
Buscamos editais de outros institutos da mesma rede federal e encontramos, em muitos deles, uma redaçao diferente, clara, objetiva e seletiva. Citamos, como exemplo, o edital ? 12/2013/DSI/PRDI-IFAL - Instituto Federal de Alagoas1, que apresenta a seguinte redaçao:
I. DOS PRÉ-REQUISITOS
1.1 - Ter concluido o Ensino Fundamental ou concluí-lo até a data da matrícula;
1.2 - Ter idade mínima de 18 anos completos até o dia da matrícula;
1.3 - Nao ter concluido o Ensino Médio. (grifo nosso) (IFAL, 2013)
Também, o do Instituto Federal de Minas Gerais2 apresenta claramente a especificidade do público-alvo:
1. REQUISITOS BÁSICOS EXIGIDOS:
[...] é necessário que o candidato tenha idade igual ou superior a 18 (dezoito) anos e tenha concluído somente até o Ensino Fundamental. Para se inscrever, o candidato deverá ter, no mínimo, 18 (dezoito) anos de idade, completos até a data da matrícula e nao pode ter concluído o Ensino Médio, conforme art. 38, da Lei n° 9.394/96 (LDB) e Resoluçao CNE/CEB n° 1, de 5 de julho de 2000. (Grifos nossos)
E enfatiza:
O PPROEJA é voltado exclusivamente para jovens-adultos-trabalhadores que nao tenham tido a oportunidade de cursar o Ensino Médio, etapa final da Educaçao Básica. O candidato deverá apresentar declaraçao de que nao cursou o Ensino Médio no ato da matrícula. (Grifos nossos)
Diante dessa redaçao, pretensos candidatos que nao atendam ao perfil nem se inscrevem. Os editais do IFBA, entretanto, pelo fato de sua forma elocutória nao ser explícita quanto ao público-alvo, tem gerado equívocos e possibilitado que candidatos com outros níveis de escolaridade inscrevam-se, participem do processo seletivo e se matriculem sem nenhum problema.
O estado delega as instituiçöes proponentes a responsabilidade de executar a política, norteando suas açöes e práticas a partir do Documento-Base e demais dispositivos legais que a regulamentam- Constituiçao Federal de 1988, LDB n° 9394/96, Decreto n° 5.840/2006, Resoluçao CNE/CEB ? 1/2000, Parecer CNE/CEB n° 11/2000 e Documento Base do PROEJA. Desse modo, a redaçao dos editais e o modelo dos processos seletivos é uma opçao política da instituiçao.
Assim, a afirmaçao de que o edital nao pode fazer restriçöes vai contra os princípios e objetivos da política já que, ao nao restringir ou selecionar os pré-requisitos, generaliza.
Cury afirma que "Focalizar grupos específicos permitiría dar mais a quem mais precisa, compensando ou reparando perversas sequelas do passado. Isso se baseia no princípio da equidade. " (CURY, 2005, p. 15). Numa perspectiva dialética, considerando os mecanismos de exclusao/inclusao educacional, constata-se que, ao público da EJA, tem sido negado o poder de açao e representaçao, marcas fundamentais de uma sociedade democrática.
Nesse processo de exclusao/inclusao, a integraçao desses sujeitos no sistema educacional é, via de regra, limitada pelo modo como os agentes responsáveis pela execuçao da política, a esse público especificamente destinada, concebem-na. Essa concepçao, normalmente fruto de uma opçao política, embasa a prática.
Como resultado dos critérios adotados desde a inscriçao até o processo seletivo, em todas as suas etapas, inclusive a efetiva matrícula, o campus atende hoje, no curso Técnico em Segurança do Trabalho, na modalidade PROEJA, um público majoritariamente distante do perfil traçado pelo Documento Base: 83% sao egressos do Ensino Médio; 6% do Ensino Superior e 11% com Ensino Médio incompleto. De todos os concluintes até 2014.2, apenas 01 atende ao perfil do público-alvo.
Os dados sao, portanto, muito significativos na medida em que já existe no campus uma discussao sobre a possibilidade de mudança na modalidade do Curso Técnico em Segurança do Trabalho, transformá-lo em subsequente - formaçao técnica para egressos do Ensino Médio com duraçao de 02 anos- visto que é realmente esse o público atendido e, simplesmente, a exemplo do Campus de Vitória da Conquista e Barreiras, extinguir o PROEJA, sob a mesma alegaçao: nao há público para essa modalidade.
Segundo informaçao fornecida pelo Departamento de Ensino do campus, os professores que atuam no Curso nao possuem qualquer formaçao, aperfeiçoamento ou treinamento para atuar nessa modalidade, nao obstante o que estabelece o Documento-Base no item "5.7. Formaçao continuada de professores e gestores" deixa muito clara a necessidade da formaçao continuada dos professores para essa modalidade de ensino:
A formaçao de professores e gestores objetiva a construçao de um quadro de referencia e a sistematizaçao de concepçoes e práticas político-pedagógicas e metodológicas que orientem a continuidade do processo. Deve garantir a elaboraçao do planejamento das atividades do curso, a avaliaçao permanente do processo pedagógico e a socializaçao das experiencias vivenciadas pelas turmas. Para alcançar esse objetivo é necessária a açao em duas frentes: um programa de formaçao continuada sob a responsabilidade das instituiçöes proponentes e programas de ámbito geral fomentados ou organizados pela SETEC/MEC. As instituiçöes proponentes devem contemplar em seu Plano de Trabalho a formaçao continuada através de, no mínimo: a) formaçao continuada totalizando 120 horas, com uma etapa previa ao inicio do projeto de, no mínimo, 40 horas. (BRASIL, 2007, pg. 60) (grifo nosso)
Sem formaçao adequada, cada um atua como acredita que deva atuar, conforme suas próprias concepçöes, limitaçöes e opçöes políticas. Logo, existe a possibilidade de que a mudança de modalidade do curso seja mais para resolver uma situaçao de desconforto de alguns docentes, do que em razao das justificativas apresentadas.
Toda essa realidade aqui apresentada decorre de vários fatores, desde a implantaçao do PROEJA no campus estudado, da compreensao e clareza do que a política realmente é e seu significado para a comunidade santamarense e seu entorno. A falta de professores preparados para atuar nessa modalidade de ensino ganha notoriedade, também a opçao política no modo de execuçao do PROEJA. Avulta, todavia, a ausencia de diálogo institucional com a comunidade. A instituiçao precisa buscar parcerias com a sociedade civil organizada, abrir-se para a comunicaçao e para o diálogo. O IFBA é visto como referencia, mas também como o ensino mais exigente, mais difícil. Em relaçao ao PROEJA, a situaçao talvez seja mais grave justamente pelos altos índices de reprovaçao e abandono.
No tratamento dos dados, considerando que jubilamento implica duas reprovaçöes consecutivas na mesma disciplina, computamos como reprovaçao somente a primeira, a segunda é computada como jubilamento. Os dados indicam que os dois primeiros semestres sao decisivos na trajetória académica do aluno. Observe-se a tabela abaixo:
Percebe-se que, nas turmas de 2010.1, 2011.1 e 2013.1, nenhum dos alunos que reprovou no primeiro módulo, conseguiu dar prosseguimento aos estudos. 11, isto é, 65% deles desistiram sem nem mesmo tentar refazer a disciplina e evadiram.
No primeiro módulo, de maneira geral, 29% dos alunos reprovam. Destes, 53% evadem, isto é, desistem de tentar superar o ciclo da exclusao por meio da educaçao. Entre os que insistem, 28% voltam a reprovar e sao jubilados. O índice de alunos que, reprovando no primeiro módulo, consegue aprovaçao no semestre seguinte é de apenas 19%, um indicador que reforça a tese de que o PROEJA falha enquanto política inclusiva.
Os valores totais referentes a todas as turmas ingressantes durante o período de execuçao da política aqui em estudo revelam-nos uma realidade impactante, especialmente considerando que essa política se propóe a combater a exclusao do público da EJA.
Ao avaliarmos os valores totais, percebemos que dos 218 alunos ingressantes nas oito turmas analisadas, 53,29%, o que corresponde ao número alarmante de 116 alunos, deixam o curso ainda no primeiro módulo, isso porque reprovam, evadem, abandonam ou sao jubilados. A permanencia, portanto, é um grande e grave problema especialmente considerando que a maioria dos estudantes já cursou o Ensino Médio, nao se trata do público da EJA.
Quanto a conclusao, o quadro é deveras alarmante, conforme registra a tabela abaixo:
Este índice de evasao, 42,5%, ocorre majoritariamente no primeiro módulo, especialmente quando o estudante o cursa pela segunda vez em decorrencia de reprovaçao.
Dos 51 estudantes que prosseguiram e concluíram o último módulo (6°), 70,59% nao concluíram o curso. O Plano de Curso Técnico em Segurança do Trabalho do IFBA estabelece que o estudante deve realizar estágio profissional no próprio IFBA ou em empresas conveniadas, ou apresentar um Trabalho de Conclusao de Curso, requisito para a conclusao do curso e consequente registro profissional junto ao MTE-Ministério do Trabalho e Emprego. Nao basta, portanto, concluir o último módulo. Esses 70,59% ainda nao realizaram estágio profissional nem apresentaram TCC até o fechamento desta pesquisa, julho de 2015.
6.RESULTADOS
A política pública PROEJA, no campo do direito, conforme proposta e delineada em seu Documento Base e demais instrumentos legais que a regulamentam, representa um avanço e conquista no que tange a inclusao dessa parcela da populaçao, vítima das desigualdades sociais do país, que se ve excluída do sistema educacional e da qualificaçao profissional para o trabalho, para a cidadania e para a inclusao social. No campo factual, porém, sua execuçao, em que pesem as contradiçöes e uma teia de falhas e desafios presentes, representa uma nova forma de exclusao.
A realidade analisada, a partir da presente pesquisa no IFBA quanto a execuçao do PROEJA, é bastante preocupante. Até 2013, quatro campi, dentre os 23 do IFBA, ofertavam cursos nessa modalidade. Entretanto, dois deles já encerraram a oferta. O de Santo Amaro já formou comissao para discutir o futuro do curso e da modalidade. Salvador ainda mantém o curso de saneamento em parceria com a prefeitura. Ou seja, em vez da ampliaçao de número de vagas, 10% de todas as vagas dos campi, conforme determina o decreto 5.840/2006, ocorre justamente o inverso, sob a alegaçao de que "nao há público".
Os indicadores do PNUD contrariam tal alegaçao. O grande problema é o acesso desse público a informaçao sobre a oferta dessa modalidade. Falta comunicaçao entre o IFBA e a comunidade, falta campanha, divulgaçao, esforço no sentido de buscar esse público e informá-lo de que a instituiçao oferece um programa específicamente para ele.
O primeiro entrave para os candidatos da EJA já é o acesso a informaçao. O segundo sao os editais e o processo de inscriçao que, por nao delinearem claramente o público-alvo, possibilita que qualquer interessado se sinta contemplado e se inscreva. O terceiro é o próprio processo de seleçao, aplicaçao da redaçao que representa, na verdade, uma "catraca" social e educacional para o público da EJA, mais uma forma de exclusao. Essa ainda mais cruel e perversa por já nao ser a mesma exclusao inicial, cunhada no seio social, externa a política, mas consequencia dela.
Para combater a exclusao educacional nao basta o Poder Público apenas criar políticas e programas. É fundamental assegurar os meios que contribuam para o alcance de suas metas. É necessário acompanhamento, monitoramento e avaliaçao em todo o processo de implantaçao e execuçao. A política foi criada em 2005 e, até o momento, a SETEC e o MEC encarregados de monitorar e avaliar a política, conforme previsto no Documento Base, declaram 'nao possuir dados sobre o PROEJA'. Se, por um lado, seguindo o principio democrático da descentralizaçao, o Estado delega as instituiçöes proponentes a responsabilidade pela execuçao da política com vistas a atingir os objetivos propostos, por outro, falha ao nao acompanhar e avaliar o processo e deixar a política a deriva no mar de espontaneísmo e opçöes políticas das instituiçöes, nem sempre preparadas para lidar com a realidade e singularidades da EJA, o que, necessariamente, implica na negaçao da inclusao.
Ora, considerando que os dados citados sobre reprovaçao, evasao, jubilamento e conclusao sao relativos a um público totalmente distante daquele que a política se propöe a incluir, evidente fica que o processo seletivo favorece o acesso de um público que já completou a Educaçao Básica. Ainda assim, os números sao alarmantes. Cabe ressaltar, no entanto, que, embora os estudantes ingressantes nao componham o público da EJA, é assim que se veem e, de fato, possuem esse perfil em termos de competencias e habilidades.
Sobre a evasao, na atividade do GF, os estudantes fizeram a seguinte análise:
O problema é a falta de preparaçao dos professores do IFBA para lidar com o PROEJA, poucos deles tem essa preparaçao. Já vem com uma graduaçao preparada para outro nível de aluno e nao para alunos despreparados. A gente é formado meio avulso. E a visao que se tem do IFBA lá fora, é que é um bicho de sete cabeças. Entao, a gente já entra com medo. (GF, 25.03.2015)
As falas dos estudantes nos levam a perceber que eles se identificam como público do PROEJA, que o fato de já terem cursado o EM nao os privilegia, pois consideram o ensino que tiveram "muito fraco". Houve unanimidade no grupo quanto a falta de qualidade n a sua formaçao desde o EF até o EM. Alguns ainda mencionam que, no IFBA, sentem-se como se estivessem cursando o EM pela primeira vez, que vem conteúdos de que nunca ouviram falar.
Dos estudantes que preencheram o formulario, 45% atribuíram as suas dificuldades a "deficiencia na minha formaçao anterior"; 25% as "metodologias dos professores"; 19% a "falta de tempo para estudar"; 11% a "aprendo, mas tiro notas baixas porque, nas avaliaçöes, os professores cobram mais ou diferente do que ensinam nas aulas. "
Os dados sobre reprovaçao, evasao e jubilamento, em grande medida, refletem essa realidade.
7.CONCLUSÄO
Ao avaliar o desempenho do PROEJA no IFBA Campus Santo Amaro, considerando, como demonstrado ao longo deste trabalho, que a política de inclusao, tal como vem sendo executada, nao combate a exclusao, antes a perpetua, podemos afirmar que ela se torna contraditória por ser uma política pretensamente inclusiva e que finda por ser excludente no que tange ao público da EJA.
É preciso salientar, todavia, que a política inclui - ainda que precariamente - um público que está igualmente excluído, e essa exclusao é construída dentro do sistema educacional, consequencia da crise pela qual passa a escola pública brasileira de que nos dao conta as avaliaçöes externas como Saeb e Prova Brasil, cujos resultados tem sido insatisfatórios.
A pretensao, portanto, é demonstrar o processo de exclusao de jovens e adultos do sistema educacional brasileiro, cujo "direito a ter direitos" foi - e ainda permanece sendo - historicamente violado, nao obstante o princípio da defesa da dignidade da pessoa humana que, em tese, norteia - ou deveria nortear - todo o Estado democrático de direito.
Questionados sobre o significado da expressao "preparado avulso", os estudantes esclareceram: "Formado de qualquer jeito, numa escola fraca em que o professor faltava muito; isso quando tinha professor; que nao teve uma educaçao de qualidade. O professor joga o conhecimento do jeito dele, quem pegar, pegou! " Essa fala nos leva a questionar a educaçao pública brasileira e o papel da escola na instruçao dos jovens, pois, para se preparar de qualquer jeito, nao haveria necessidade de um lugar para tanto, nem de uma política cuja intençao primeira foi pensar e materializar a educaçao de adultos que já foram penalizados duramente e nao tem mais condiçöes de serem penalizados novamente.
Nesta perspectiva, com base nos dados, consideramos que a execuçao do PROEJA no IFBA campus Santo Amaro apresenta sérias incoerencias em relaçao a proposta da política bem como em relaçao a todos os dispositivos legais que a regulamentam. Contraditoriamente, inviabiliza a concretizaçao de suas finalidades, objetivos e funçao social no que tange a superaçao da exclusao e das desigualdades sociais, visto que nao inclui o grupo ao qual a política se destina. O público que ingressa nao é o pretendido pela política e, mesmo esse "outro" público contemplado enfrenta sérias dificuldades em permanecer e concluir o curso. Os altos índices de reprovaçao e evasao, bem como o baixo índice de conclusao sao uma denúncia da realidade da educaçao brasileira.
Se há equívocos e desvios por parte do IFBA no modo de executar a política, há, por parte do Estado, negligencia em relaçao a própria intençao de saldar essa dívida histórica para com os excluídos e marginalizados que compöem o público da EJA.
Lembrando aqui o que sabiamente afirma Rua (1998) quando diz que uma decisao em política pública traduz intençöes para a resoluçao de um problema demandado pela sociedade. Essas intençöes materializam-se através de determinaçöes legais, todavia, essas determinaçöes nao sao garantias de açao e nem de que a demanda seja efetivamente atendida.
Embora a contradiçao seja inerente a sociedade, reconhece-la e identificar seus impactos na vida das pessoas, especialmente daquelas com as quais estado e sociedade tem tao grande divida social, é o caminho na direçao de formular e materializar uma nova forma de execuçao da política ou, mesmo, formular uma nova política que esteja comprometida com a inclusao social em todas as instancias, no contexto de um projeto de sociedade justa, igualitaria e solidaria.
1 www.ifal.edu.br/conteudo/arquivos/Edital_122013_Proeja.../at.../file
2 www.ifmg.edu.br/vestibular/index.php/.../doc.../229-edital-019-Proeja
7. Referencias
Arroyo, M. G. Políticas educacionais e desigualdades: a procura de novos significados. Revista de Ciencia da Educaçao Centro de estudos Educaçao e Sociedade, vol. 31, n° 113,. Sao Paulo: Cedes, out-dez de 2010. P 1381-1416.
_____. Educaçao de jovens e adultos: um campo de direitos e de responsabilidade pública. In: Soares, Leoncio; Giovanetti, M. A.; Gomes, N. L. (Org.). Diálogos na Educaçao de Jovens e Adultos. Belo Horizonte: Autentica, 2005.
Barros, Ricardo. P. e Mendonça, Rosane. S. P. Os determinantes da desigualdade no Brasil. Rio de Janeiro, IPEA, 1995.
Brasil, MEC-Secretaria de Educaçao Profissional e Tecnológica. Programa de Integraçao da Educaçao Profissional Técnica de Nivel Médio ao Ensino Médio, na Modalidade de Educaçao de Jovens e Adultos - PROEJA. Documento Base. 2007.
Costa, F. L.; Castanhar, J. C. Avaliaçao de programas públicos: desafios conceituais e metodológicos. Revista de Administraçao Pública. v. 37, n.5, set./out., 2003.
Cury, C. R. J.. Políticas inclusivas e compensatórias na educaçao básica. Fundaçao Carlos Chagas, Cadernos de Pesquisa, vol.35, n° 124, Sao Paulo, jan/abr 2005.
Easton, D. The political system. New York: Willey, 1953.
Freire, P.. Pedagogia do Oprimido. 33. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
Gamboa. S. S. Quantidade-Qualidade: para além de um dualismo técnico e de uma dicotomia epistemológica. In: SANTOS FILHO, José Camilo dos. Pesquisa Educacional: quantidadequalidade. 7- Ed. Sao Paulo: Cortez, 2009. pp. 84-110.
Gatti, B. A.. Grupo focal na pesquisa em ciencias sociais e humanas. Brasília: Líber Livro, 2005.
Holanda, A. N. C.. Avaliaçao de políticas públicas : conceitos básicos, o caso do ProInfo e a experiencia brasileira. In: VIII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del Estado y de la Administración Pública, Panamá, 28-31 Oct. 2003, Disponível em: http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/CLAD/clad0047614.pdf acesso em: mio/2015
Oliveira, D. A.. Das políticas de governo a política de Estado: reflexóes sobre a atual agenda educacional brasileira. In: Educaçao & Sociedade., Campinas, v. 32, n. 115, p. 323-337, abr.-jun.
Oliveira, R. de. Políticas do ensino médio e da educaçao profissional no Brasil - anos 90: subordinaçao e retrocesso educacional. 2001. (Tese nao publicada) - Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2001. Disponível em:
Pinto, A. V. Sete liçöes sobre a educaçao de adultos. 7- ed. Sao Paulo: Cortez, Autores Associados, 1991.
Pochmann, M.; Amorin, R. (orgs). (2003). Atlas da exclusao social no Brasil. Sao Paulo: Cortez
Rua, M das G. Políticas Públicas. Florianópolis: Departamento de Ciencias da Administraçao / UFSC, 2009. 130 p.
Saravia, Enrique. Ferrarezi, Elisabete. (orgs.) Políticas públicas. V I. Brasília: ENAP, 2006.
Sawaia, B. O sofrimento ético-político como categoria de análise da dialética exclusao/inclusao. In: _. (org). As artimanhas da exclusao: análise psicossocial e ética da desigualdade social. Petrópolis: Vozes, 2001.
Cury, C. R. J.l. Políticas inclusivas e compensatórias na educaçao básica. Fundaçao Carlos Chagas, Cadernos de Pesquisa, vol.35, n° 124, Sao Paulo, jan/abr 2005.
Weiss, C. Evaluation, 2. edition, Prentice-Hall, New Jersey,1998. 2011 Disponível em http://www.cedes.unicamp.br Acesso em: maio/2015.
Trivinos, A.N.S. Introduçao a pesquisa em ciencias sociais: a pesquisa qualitativa em educaçao.
You have requested "on-the-fly" machine translation of selected content from our databases. This functionality is provided solely for your convenience and is in no way intended to replace human translation. Show full disclaimer
Neither ProQuest nor its licensors make any representations or warranties with respect to the translations. The translations are automatically generated "AS IS" and "AS AVAILABLE" and are not retained in our systems. PROQUEST AND ITS LICENSORS SPECIFICALLY DISCLAIM ANY AND ALL EXPRESS OR IMPLIED WARRANTIES, INCLUDING WITHOUT LIMITATION, ANY WARRANTIES FOR AVAILABILITY, ACCURACY, TIMELINESS, COMPLETENESS, NON-INFRINGMENT, MERCHANTABILITY OR FITNESS FOR A PARTICULAR PURPOSE. Your use of the translations is subject to all use restrictions contained in your Electronic Products License Agreement and by using the translation functionality you agree to forgo any and all claims against ProQuest or its licensors for your use of the translation functionality and any output derived there from. Hide full disclaimer
Copyright Instituto Federal de Educacao Ciencia e Tecnologia do Rio Grande do Norte 2017
Abstract
O objetivo é apontar as nuances que já se apresentam em termos de desvios, distorçöes, exclusao e negaçao de direitos devido ao modo de execuçao da política PALAVRAS-CHAVE: Política Pública, PROEJA, Educaçao, Exclusao, Inclusao ABSTRACT The Public Politic PROEJA - National Program of Integration of Professional Education with the basic education in the modality of Adults and Youngsters Education - EJA - aims to offer the opportunity of study for those which didn't have access to high school in the regular age, it is based in a public politic of social inclusion. The present work consists of an ex post evaluation of this politic in IFBA - Federal Institution of Education, Science and Technology of Bahia - Campus Santo Amaro - BA, Technical Course in Work Security with the objective of verifying whether and in what measure its execution favors the socioeducational inclusion of EJA's audience, in the way of contributing to the sociolaboral integration of these citizens. The objective is to point out the nuances which already are present in the terms of deviations, distortions, exclusion and denial of the rights due to the way the politics has been executed. Se, por um lado, seguindo o principio democrático da descentralizaçao, o Estado delega as instituiçöes proponentes a responsabilidade pela execuçao da política com vistas a atingir os objetivos propostos, por outro, falha ao nao acompanhar e avaliar o processo e deixar a política a deriva no mar de espontaneísmo e opçöes políticas das instituiçöes, nem sempre preparadas para lidar com a realidade e singularidades da EJA, o que, necessariamente, implica na negaçao da inclusao.
You have requested "on-the-fly" machine translation of selected content from our databases. This functionality is provided solely for your convenience and is in no way intended to replace human translation. Show full disclaimer
Neither ProQuest nor its licensors make any representations or warranties with respect to the translations. The translations are automatically generated "AS IS" and "AS AVAILABLE" and are not retained in our systems. PROQUEST AND ITS LICENSORS SPECIFICALLY DISCLAIM ANY AND ALL EXPRESS OR IMPLIED WARRANTIES, INCLUDING WITHOUT LIMITATION, ANY WARRANTIES FOR AVAILABILITY, ACCURACY, TIMELINESS, COMPLETENESS, NON-INFRINGMENT, MERCHANTABILITY OR FITNESS FOR A PARTICULAR PURPOSE. Your use of the translations is subject to all use restrictions contained in your Electronic Products License Agreement and by using the translation functionality you agree to forgo any and all claims against ProQuest or its licensors for your use of the translation functionality and any output derived there from. Hide full disclaimer