RAI Revista de Administrao e Inovao ISSN: 1809-2039
DOI:
Organizao: Comit Cientfico Interinstitucional Editor Cientfico: Milton de Abreu Campanario Avaliao: Double Blind Review pelo SEER/OJS Reviso: Gramatical, normativa e de Formatao
ADOO DE INOVAES EM MERCADOS EM REDE: UMA ANLISE DA INTRODUO DO LIVRO DIDTICO DIGITAL NO BRASIL
Marco Aurelio de Souza Rodrigues
Mestre pelo Instituto COPPEAD de Administrao da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ
mailto:[email protected]
Web End [email protected] (Brasil)
Paula Castro Pires de Souza Chimenti
Doutora em Administrao pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ
Professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ
mailto:[email protected]
Web End [email protected] (Brasil)
Roberto Ramos Nogueira
Doutor em Administrao pela Universidade de So Paulo USP
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ
mailto:[email protected]
Web End [email protected] (Brasil)
RESUMO
Modelos de adoo de novas tecnologias so usualmente centrados no consumidor final. Entretanto,
casos como a disputa entre tecnologias similares como Blu-Ray e HD-DVD sugerem que a difuso da
inovao no depende apenas do consumidor, mas da criao de uma plataforma dominante capaz de
atrair o mximo de complementares. O objetivo deste estudo compreender a adoo de inovaes
disruptivas em ecossistemas, levantando os fatores que influenciam a inovao alm do
comportamento do consumidor. O estudo abordou a indstria editorial brasileira, investigando o
impacto do livro didtico digital neste setor. Entre abril e dezembro de 2012, foram realizadas
entrevistas em profundidade com gestores de grandes editoras de livros didticos do Brasil. O estudo
indica que, alm de pais e alunos, outros atores influenciam a adoo do livro didtico digital. Se
editoras e professores esto reticentes, o governo, as plataformas de contedo digital e os Sistemas de
Ensino so impulsionadores do livro didtico digital. O estudo explora as motivaes destes atores,
sugerindo que a difuso de inovaes em mercados em rede deve ser compreendida a partir de um
olhar sistmico, alm dos modelos tradicionais.
Palavras-chave: Estratgia; Inovao; Plataformas; Novas Mdias; Livro Didtico.
Adoo de inovaes em mercados em rede: uma anlise da introduo do livro didtico digital no
Brasil
1. INTRODUO
Um professor, alunos, um quadro, o livro didtico. A equao da sala de aula permanece inalterada e inabalada h sculos, apesar de transformaes em praticamente todos os contedos que j passaram por ela. Entretanto, inovaes recentes comeam a ameaar o modelo, levantando questionamentos sobre a eficcia da padronizao e massificao do ensino num mundo cada vez mais customizado. A avaliao e divulgao cada vez maiores do aproveitamento dos alunos tambm levantam questes sobre a nfase demasiada no ensino, em detrimento do aprendizado. Alm disso, tecnologias como a internet mvel permitem que os alunos questionem os professores em sala de aula, tornando urgente uma reviso do modelo para algo mais participativo e co-criado, onde o professor no o dono do saber, mas um catalizador da descoberta do aluno.
Neste contexto, faria sentido para uma criana do sculo XXI altamente conectada aprender com um livro impresso sem nenhum recurso audiovisual, exatamente como o seu tatarav aprendeu? Por conseguinte, o papel do livro didtico tambm comea a ser questionado. Afinal, seria um livro em formato digital, com fotos, vdeos, msicas, links e jogos interativos ainda um livro? Os participantes deste ecossistema tm se feito constantemente este tipo de pergunta. Autores, editores, alunos, pais, professores, administradores e donos de escolas esto vivendo esta possvel revoluo do ensino como agentes ou expectadores. No bvio perceber quais destes atores adotaro uma inovao como um livro didtico digital.
Esta justamente uma das perguntas desta pesquisa. Ao longo dos ltimos anos, a observao de indstrias mediadas por plataformas (como a da msica e de filmes) levanta uma srie de questionamentos quanto eficcia dos modelos tradicionais de adoo de inovao para explicar a difuso de inovaes. Por exemplo, o modelo TAM (Technology Acceptance Model) no poderia explicar a supremacia do Blu-Ray sobre o HD-DVD, ou a liderana do iPad e o fracasso dos e-readers anteriores.
A suposio de que estes modelos falham por abordarem a inovao em apenas um nvel, como se sua adoo dependesse de um nico participante: o consumidor. A ideia deste artigo propor um olhar diferente sobre a adoo de inovaes, um olhar que leve em conta o ecossistema em toda sua complexidade. No caso do livro didtico digital, por exemplo, a fonte da inovao poderia ser tanto a escola, quanto a editora, o governo ou mesmo os alunos.
Por outro lado, para que esta inovao de fato se transforme numa realidade adotada como padro, mltiplos participantes precisam passar a utiliz-la: pais e alunos precisam perceb-la como
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uma fonte de solues e diferenciao; professores precisam adot-la como algo que ajuda e facilita sua vida dentro e fora da sala de aula; escolas precisam acreditar que ela traz diferenciao; editoras precisam entender a inovao como um novo negcio capaz de gerar valor; autores precisam produzir novos contedos adaptados ao novo meio, etc. Se o valor da inovao depende da sua capacidade como plataforma de atrair estes complementares, a ausncia de um destes complementares poderia condenar esta inovao ao fracasso.
Neste sentido, o presente trabalho explora uma oportunidade nica: a observao do impacto da chegada de uma inovao disruptiva em uma indstria que raramente em sua histria de fato experimentou tal acontecimento a indstria editorial didtica. Movimentando cerca de R$2.3 bilhes em 2011 no Brasil (Sindicato Nacional de Editores de Livros [SNEL], 2012), pode-se dizer que a ltima grande inovao vivenciada por essa indstria foi a criao da prensa, que a originou.
O objetivo deste trabalho compreender o processo de adoo de inovaes disruptivas em ecossistemas de negcio, a partir da introduo do livro didtico digital no Brasil, buscando levantar as fontes e os gatekeepers da inovao, assim como as possveis causas destes comportamentos. cedo para concluses absolutas, mas o momento ideal para explorar esta nova e instigante realidade. Mais do que apresentar respostas certas que meream uma nota mxima, busca-se fazer boas perguntas. E aprender.
Na prxima seo, ser apresentada a Reviso de Literatura que serviu de base para a composio do roteiro semi-estruturado utilizado como instrumento de coleta de dados em campo. Em seguida, sero discutidos os procedimentos metodolgicos, seguidos dos principais resultados da pesquisa e, finalmente, suas concluses.
2. REVISO DE LITERATURA
A presente pesquisa atua na convergncia de dois ramos distintos da Administrao: a Estratgia, com seus modelos recentes sobre anlises de ecossistemas e plataformas; e o Marketing, com os modelos tradicionais de adoo de inovaes. A motivao do estudo nasceu justamente da percepo pelos autores de que a combinao destes diferentes aspectos poderia auxiliar a compreenso do processo de inovao num ambiente onde o consumidor final parte do processo, mas no o nico decisor e, provavelmente, nem mesmo o protagonista.
Sendo assim, uma extensa reviso de literatura sobre Modelos de Adoo de Tecnologias e sobre Estratgias para Mercados em Rede foi realizada para verificar a relevncia deste estudo, auxiliar
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o desenvolvimento do roteiro semi-estruturado utilizado na etapa de campo e orientar a etapa de anlise dos dados. Nesta seo sero apresentados os principais referenciais tericos identificados, contemplando estudos sobre adoo de tecnologia, estratgia, inovao em mercados em rede e, finalmente, livros didticos digitais.
2.1 Modelos de Adoo de Tecnologia
A Teoria da Ao Racionalizada, tambm conhecida pela sigla TRA, uma das mais influentes teorias sobre o comportamento humano, baseada na teoria da psicologia social proposta por Fishbein e Ajzen (1975) e Ajzen e Fishbein (1980). Na figura 1 possvel visualizar o modelo.
Figura 1: Teoria da Ao Racionalizada - TRA
Fonte: Fishbein and Ajzen (1975)
A Norma Subjetiva se refere percepo do indivduo sobre a opinio de outras pessoas a respeito de como ele deveria agir ou se comportar. A Atitude diz respeito aos sentimentos positivos ou negativos do indivduo com relao ao comportamento estudado. Estes dois construtos influenciam a Inteno, que designa a predisposio do indivduo a se comportar de determinada forma, sendo o Comportamento Futuro consequncia desta Inteno.
A TRA serviu como base para que Davis (1989) desenvolvesse o Technology Acceptance Model (tambm conhecido pela sigla TAM ou como Modelo TAM) (figura 2). O objetivo deste modelo era entender os fatores que levavam funcionrios a aceitar e utilizar o computador e outras novas tecnologias relacionadas introduzidas em uma empresa. A maioria das pesquisas que utiliza o TAM trata da aplicao de sistemas de informao em ambientes empresariais. De acordo com o
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Modelo TAM, Variveis Externas influenciam a Utilidade Percebida e a Facilidade de Uso. Estas influenciam a Atitude que, por sua vez, influencia a Inteno de Uso que, finalmente, influencia o Uso da Tecnologia.
Figura 2: Modelo TAM
Fonte: Legris, Ingham e Collerette (2003)
A partir de uma ampla reviso de literatura sobre adoo de tecnologia, Venkatesh, Morris, Davis e Davis (2003) formularam a Teoria Unificada de Adoo e Uso de Tecnologia (UTAUT), baseada num modelo que combinou aspectos de modelos predecessores tais como o TAM para explicar as percepes e atitudes que levam inteno de uso. De acordo com a UTAUT, quatro construtos (expectativa de desempenho, expectativa de esforo, influncia social e condies facilitadoras) determinam a Inteno de Uso e o Uso da Tecnologia.
Rogers (1995) estudou o processo pelo qual uma inovao comunicada aos membros de um sistema social por meio de certos canais no decorrer do tempo. O autor props a Teoria de Difuso de Inovaes, para a qual a deciso de um indivduo sobre adotar ou rejeitar uma inovao influenciada por cinco caractersticas: vantagem relativa, compatibilidade, complexidade, observabilidade e experimentabilidade.
2.2 Estratgia, Inovao e Mercados em Rede
A chegada de inovaes pode ser traumtica mesmo para as empresas lderes de uma indstria. Ao transformar as regras que ditam as dinmicas de um mercado, tais inovaes so consideradas disruptivas (Christensen, 1997). Ao contrrio das inovaes incrementais, que apenas aprimoram um conceito pr-existente, as inovaes disruptivas so capazes de reconfigurar o modelo de negcios de uma indstria, ou mesmo criar um negcio indito. Apesar de potencialmente levarem a elevadas
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taxas de crescimento, criaes disruptivas normalmente deflagram o Dilema do Inovador, fenmeno em que empresas relutam em aceitar inovaes (ainda sem mercados estabelecidos), favorecendo solues consideradas tradicionais com resultados previsveis.
Alm disso, a capacidade de reao de uma organizao s inovaes influenciada pelo alcance de sua viso perifrica (Day & Schoemaker, 2006). A composio de estratgias deve contar com ferramentas capazes de monitorar a troca de informaes e de recursos entre indstrias, percebendo eventuais adversrios e possveis aliados com antecedncia e lucidez. A Anlise de Ecossistema procura mapear de forma bastante abrangente as redes compostas por participantes de diversos setores que se influenciam ou possuem relaes diretas em seus negcios, alcanando uma viso ampla de clusters de competio e cooperao entre indstrias; bem como identificando focos existentes e potenciais de criao e destruio de valor (Iyer, Lee, & Venkatraman, 2006).
A estratgia de uma empresa deve levar em conta o ecossistema no qual ela est inserida e o seu papel no mesmo; auxiliando as empresas em seus posicionamentos, estratgias de lanamentos e inovaes. Essencial para entender de forma abrangente como recursos e informaes transitam entre indstrias, a Anlise de Ecossistemas oferece um modelo objetivo para perceber ameaas e oportunidades alm do ambiente de negcios original, permitindo a reconfigurao gil e eficiente de estratgias, fundamental para a sobrevivncia em mercados em rede (Iansiti & Levien, 2004).
Neste sentido, Hax e Wilde (1999) argumentam que inovaes em tecnologia requerem das organizaes posicionamentos estratgicos adicionais aos usualmente descritos. Alm da estratgia Best Product baseada em preo ou diferenciao, os autores descrevem os posicionamentos Total Customer Solution e System Lock-in. No Total Customer Solution h o deslocamento da economia do produto para a economia do cliente, oferecendo uma soluo completa que reduz custos de mudana para consumidores em potencial ao mesmo tempo em que aumenta custos de mudana para clientes existentes. O System Lock-in compreende a criao de uma plataforma conectando complementares (terceiros que aprimoram a oferta da plataforma entregue ao consumidor) e consumidores. Um System Lock-in capaz de construir um padro na indstria, aprisionando clientes devido aos altos custos de mudana (lock-in), isolando competidores (lock-out) e atraindo complementares atravs de efeitos de rede.
Wirtz (2001) estudou a indstria de mdia e mostrou que se trata de uma indstria convergente, isto , uma indstria cujas fronteiras esto se expandindo, com ofertas inseridas num ambiente de entretenimento digital, cujo territrio contempla vrios setores diferentes e alcana milhes de clientes diretos e indiretos. De acordo com Jenkins (2006), a convergncia na indstria de mdia modifica a
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lgica atravs da qual a indstria da comunicao opera e pela qual pessoas consomem notcias e entretenimento.
Em seu estudo sobre a Economia da Informao, Shapiro e Varian (2003) argumentam que neste ambiente convergente o valor de uma oferta cresce de acordo com o nmero de pessoas que usufruem da mesma. Assim, especificamente na indstria de mdia, produtores de contedo enfrentam um dilema. Por um lado, o aumento do controle sobre sua propriedade intelectual (o contedo) reduz riscos de cpias no autorizadas, mas pode tornar sua oferta menos atraente para consumidores, reduzindo sua base de clientes. Por outro lado, se a reduo do controle sobre a propriedade intelectual aumenta riscos, tambm eleva a percepo de valor dos consumidores, estimulando o crescimento da base de clientes.
Alm disso, a convergncia leva as indstrias tradicionais a se reconfigurarem como plataformas, operando em mercados de dois lados (Eisenmann, 2006). Na cadeia de valor tradicional, o valor se move da esquerda para a direita: esquerda da empresa est o custo; direita, est a receita. Nos mercados de dois lados, custos e receitas esto em ambos os lados, porque a plataforma tem um grupo distinto de usurios de cada lado. A plataforma incorre em custos para servir ambos os lados e pode coletar receita de ambos. Nestes mercados, algumas regras tradicionais como a precificao com base no valor tendem a cair. Os preos cobrados podem estar abaixo do custo ou subsdios permanentes podem ser oferecidos.
Varejistas de livros online como a Amazon surgem como um exemplo prtico do conceito de plataforma. Como plataforma, a Amazon liga editoras (lado 1) a consumidores (lado 2). Para os editores, quanto maior o nmero de clientes da Amazon, mais valiosa esta se torna. Para os consumidores, quanto maior o nmero de editores vendendo na Amazon, maior ser a oferta de livros e mais valiosa ser a plataforma. Eisenmann (2006) tambm contemplou em seu estudo os custos que consumidores incorrem ao adotar uma nova plataforma. Para o autor, uma nova plataforma deve reduzir ao mximo os custos de adoo por novos consumidores (homing costs) a fim de superar a liderana das plataformas incumbentes.
2.3 O Livro Didtico
O livro didtico impresso teve seus formato e propsito relativamente padronizados ao longo dos anos: retangular, dedicado a uma rea especfica do conhecimento, repleto de ilustraes e exerccios, pesando alguns quilogramas e regularmente encontrado nas mochilas dos estudantes do ensino mdio. Contudo, o livro didtico digital ainda carece desta padronizao (Bennett, 2006).
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Alguns consideram o livro didtico digital como a mera reproduo da pgina impressa na tela de um dispositivo eletrnico. Outros percebem o livro didtico digital como um conjunto de atividades, dotadas de animaes 3D, vdeos, udio e testes interativos. H ainda aqueles que questionam se o livro didtico digital seria apenas um software, ou a combinao deste com um hardware, tal como um e-reader ou um tablet (Chesser, 2011). Para este estudo, utilizaremos a definio proposta por Cutshall, Bland e Mollick (2012): o livro didtico digital um objeto digital com contedo que integra fundamentalmente um aspecto de ensino textual familiar ao conceito de livro com benefcios oferecidos exclusivamente em ambientes eletrnicos, como campo de busca, interatividade e multimdia.
Os benefcios do livro didtico em seu formato digital so muitos. Seu contedo atualizvel sem custos de reimpresso. Tambm pode ser facilmente acessado em diversas situaes, lugares e dispositivos, com baixos custos de distribuio. Suas lies so personalizveis em funo do aprendizado do estudante e so enriquecidas por vdeos, udios e simulaes. Em suma, ao invs de adaptar o estudante ao contedo, o contedo se adapta ao estudante. A despeito destes benefcios, a maioria das escolas resiste adoo do livro didtico digital. Como resultado, a discrepncia entre a realidade dos estudantes (onde as mdias digitais permeiam todos os momentos de trabalho, comunicao, aprendizado e lazer) e os processos de ensino tem aumentado (American Library Association, 2012). Assim, movimentando cerca de US$16 bilhes no ensino mdio norte-americano em 2010, o mercado dos livros didticos digitais considerado pequeno quando comparado ao mercado de impressos (Resnick, 2011).
Contudo, alguns indcios sugerem que o mercado didtico est na iminncia de grandes transformaes. Rivero (2013) realizou levantamento indicando como a participao dos livros digitais no mercado norte-americano de livros didticos evoluiu de 1% em 2010 para 5.5% em 2012, projetando 19% de participao at 2014. McFadden (2012) aponta que at 2019 o mercado norteamericano de livros didticos impressos cair pela metade.
No Brasil, h uma escassez de dados sobre o mercado de livros didticos digitais. Contudo, as informaes disponveis sugerem que, embora em seu estgio inicial, o mercado brasileiro de livros digitais tem potencial de crescimento. Segundo levantamento do Comit Gestor da Internet no Brasil (2012), cerca de 4% das escolas possuem tablets para utilizao de professores e alunos. E, desde 2012, o governo brasileiro exige no edital do Programa Nacional do Livro Didtico (PLND) que editoras ofeream verses digitais dos livros impressos fornecidos s escolas (Floresta, 2013). De acordo com relatrio produzido por Wischenbart Consulting (2013), as compras governamentais
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representam 22% do faturamento total do mercado de livros, o que sugere a importncia do governo no processo de adoo do livro didtico digital.
Seja no mercado brasileiro ou no exterior, alguns estudos investigaram estes indcios de mudana a partir do comportamento do consumidor. Os fatores dos livros didticos digitais mais apreciados por estudantes so: portabilidade, facilidade de compra, economia e disponibilidade. Em suma, o apelo dos livros didticos digitais vem de sua convenincia, variedade de oferta e economia (Paxhia, 2011).
Outros autores verificaram a influncia de outros agentes do mercado sobre o ritmo de adoo do livro didtico digital. Chesser (2011) identificou quatro condies necessrias para a adoo em massa dos livros didticos digitais. A primeira refere-se existncia de uma infra-estrutura mnima de capacidade computacional e de rede, atendida pela proliferao de dispositivos digitais mveis e de conexes de banda-larga. A emergncia de padres, listada como a segunda condio para difuso de livros digitais, foi atendida a partir do surgimento do ePub, formato universal de livros digitais desenvolvido pela International Digital Publishing Forum (associao que rene empresas como Google, Sony e diversas editoras). A formao de padres facilitou o atendimento da terceira condio, o amadurecimento de sistemas de gesto de direitos que sejam convenientes para consumidores e produtores de contedo. A ltima condio refere-se ao desenvolvimento de plataformas de vendas que conectem de forma eficiente produtores de contedo e consumidores, posio hoje assumida pela Amazon e a Apple. Em suma, Chesser (2011) defende que o fundamental para a difuso do livro didtico digital o alinhamento de tecnologia, contedo e modelo de negcio.
Acker (2011) argumenta que escolas relutam em adotar o livro didtico digital devido aos altos custos de converso de bibliotecas para verses eletrnicas, a necessidade de adaptar sistemas de informao e ao prprio investimento em treinamento de pessoal, principalmente de professores. Estes, em especial, foram objeto de estudo de Ruth (2013). Para o autor, os educadores tendem a observar o livro digital didtico como uma fonte de problemas, pois alm de questes relativas a tempo e custos, esta mdia tornaria o aprendizado um processo individualizado e no-linear, algo diferente do ensino sequencial e padronizado tpico da sala de aula. Os principais benefcios e desafios relativos adoo do livro didtico digital verificados na literatura so resumidos na tabela 1.
Tabela 1 - Benefcios e Desafios da Adoo do Livro Didtico Digital
Benefcios da Adoo do Livro Didtico Digital Desafios da Adoo do Livro Didtico Digital
Atualizao constante de contedo Desenvolvimento de infra-estrutura computacional e de rede
Acessibilidade Surgimento de padres
Contedo multimdia Desenvolvimento de sistemas de controle de propriedade intelectual
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Personalizao Alto investimento para converso de bibliotecas Portabilidade Alto investimento para treinamento de pessoal Economia para pais e alunos Alto investimento para adaptao de sistemas de produo anteriores
Baixos custos de armazenagem e distribuio paraeditoras
Desenvolvimento de novos modelos de negcio
Fonte: Elaborado pelos autores
Estes estudos sugerem que a difuso dos livros digitais didticos deve ser observada no apenas a partir do comportamento do consumidor, mas, principalmente, a partir de uma viso sistmica, ou de um ecossistema. Observando apenas a cadeia de valor tradicional do livro, empresas de indstrias distantes, porm relevantes para a produo editorial digital seriam negligenciadas (International Digital Publishing Forum [IDPF], 2013). Iniciativas como o Google Classroom, que cria cursos e salas de aula virtuais (Magid, 2014) ou o iTunes University, um agregador de contedos educacionais produzidos por instituies de ponta (Lewin, 2011), indicam que o mercado de livros digitais didticos pode passar por transformaes oriundas de fora de sua indstria original.
Assim, a produo editorial digital pode ser observada como um processo que ultrapassa fronteiras de indstrias, interligando atores de diversos setores num grande ecossistema. Frente a novos competidores e aliados de diversas indstrias, o prprio papel de uma editora de livros didticos redefinido.
Segundo Young (2013), as linhas que separam Editoras, Universidades, Educadores e Desenvolvedores de software esto desaparecendo. O autor argumenta que as cinco maiores editoras de livros didticos norte-americanas investiram mais de US$1 bilho na compra de companhias de software, citando a compra da Tegrity pela McGraw-Hill Education em 2010 e a aquisio da Deltak.edu pela John Wiley & Sons em 2013 por US$220 milhes. McFadden (2012) ilustra como as editoras esto se deslocando do posicionamento de fbrica de livros para companhias de aprendizado, assumindo muitas das funes tradicionalmente vinculadas s escolas e professores, como planos de cursos e de mtodos de avaliao. Face a estas transformaes, Ruth (2013) argumenta que o maior desafio de editoras e instituies de ensino ser alinhar seu processo de ensino com o novo processo de aprendizado possibilitado por novas mdias como o livro digital.
2.4 Concluso da Reviso de Literatura
Apresenta-se, a seguir, as principais concluses da reviso de literatura, bem como uma tabela exibindo as dimenses identificadas como relevantes para a investigao deste estudo e seus respectivos autores (tabela 2).
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1) Existe uma lacuna na literatura j que, apesar da emergncia recente de modelos estratgicos que lidam com ecossistemas de negcios e indstrias convergentes, mediadas por plataformas e caracterizadas pela existncia de clientes de mltiplos lados, os modelos de adoo de inovaes continuam observando apenas um adotante, como se fosse deciso de um nico player a utilizao de uma nova tecnologia e seu estabelecimento como padro. A histria recente nos mostra a importncia dos complementares e de uma perspectiva sistmica. Portanto, surge a necessidade de se compreender a adoo de inovaes nesta perspectiva sistmica.
2) A indstria brasileira do livro didtico experimenta atualmente a possibilidade de introduo de uma tecnologia disruptiva, o livro didtico digital, tornando-a um caso perfeito para o estudo do fenmeno descrito acima, num ambiente praticamente virgem de inovaes disruptivas. Alm disto, uma indstria que, at pouco tempo atrs, podia ser compreendida pelo modelo de cadeia de valor, com papis de fornecedores e clientes e fronteiras de indstria muito bem definidos. A entrada de novos players, como a Amazon e a Apple, decorrente da disseminao da internet e da mobilidade, diluram as fronteiras da indstria, reconfigurando-a num mercado de mltiplos lados, cujas oportunidades de negcio devem ser compreendidas numa viso de ecossistema. Todos estes fatores fazem deste um caso especialmente adequado ao presente estudo.
Tabela 2 - Principais Dimenses Verificadas na Reviso de Literatura
Dimenso Autor(es)
Contedo Chesser (2011), Ruth (2013) Controle de PropriedadeIntelectual
Acker (2011), Chesser (2011), Shapiro e Varian (2003)
Convenincia McFadden (2012), Rivero (2013), Wilckie (2011), Chesser (2011),
Ruth (2013), Young (2013), Cutshall et al (2012)
Custos de Aprendizado Acker (2011), Chesser (2011), Ruth (2013)
Custos de Mudana Mardis e Everhart (2011), Chesser (2011), Ruth (2013), Paxhia
(2011)
Lock-in Young (2013), Chesser (2011), Iyer, Lee e Venkatraman (2006),
Iansiti e Levien (2004), Hax e Wilde (1999)
Modelo de Negcio Resnick (2011), McFadden (2012), Acker (2011), Chesser (2011),
Hax e Wilde (1999), Eisenmann (2006), Jenkins (2006), Wirtz (2001)
Modelo Mental Paxhia (2011), Young (2013), Resnick (2011), McFadden (2012),
Acker (2011), Chesser (2011), Jenkins (2006), Day e Schoemaker (2006)
Pirataria Chesser (2011), Young (2013), Wilckie (2011)
Reduo de Custos McFadden (2012), Acker (2011), Chesser (2011), Weisberg
(2011), Paxhia (2011), Wilckie (2011), Reynolds (2011) Risco Acker (2011), McFadden (2012), Ruth (2013)
Soluo Completa Rivero (2013), Young (2013), McFadden (2012)
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Adoo de inovaes em mercados em rede: uma anlise da introduo do livro didtico digital no
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Norma Subjetiva Fishbein e Ajzen (1975)
Inteno Fishbein e Ajzen (1975), Davis (1989), Venkatesh et al. (2003) Comportamento Futuro Fishbein e Ajzen (1975), Davis (1989), Venkatesh et al. (2003) Atitude Fishbein e Ajzen (1975), Davis (1989)
Facilidade de Uso Percebida Davis (1989)
Utilidade Percebida Davis (1989)
Expectativa de Desempenho Venkatesh et al. (2003)
Expectativa de Esforo Venkatesh et al. (2003)
Influncia Social Venkatesh et al. (2003)
Condies Facilitadoras Venkatesh et al. (2003)
Fonte: Elaborado pelos autores
3. MTODO
A reviso de literatura aponta para uma lacuna de pesquisa e uma oportunidade nica de pesquisar um fenmeno relativamente recente: a adoo de inovaes disruptivas em mercados em rede. Durante o processo de confeco desta pesquisa, ficou claro para os autores que os modelos tradicionais de adoo de inovao no so suficientes para explicar o fenmeno em ecossistemas de negcios, abrindo espao para novas exploraes. O processo comea pela busca do referencial terico apresentado na seo anterior, que precisa unir campos distintos da Administrao: Estratgia (com a anlise de ecossistemas de negcios, plataformas e mercados em rede) e Marketing (com os modelos de adoo de inovaes, tradicionalmente centrados no consumidor final).
A partir desta reviso, foi mapeado o ecossistema do livro didtico no Brasil. Dentro deste ecosssitema, as editoras se destacam como hubs, ou nodos principais, em funo do grande nmero de relaes comerciais com diversos players e de sua posio central no ecossistema. Assim, os gestores das editoras foram escolhidos como sujeitos desta pesquisa.. Apesar da escolha de um nico player caracterizar uma limitao em um estudo cujo propsito alcanar uma viso sistmica, acredita-se que estes gestores, por sua posio central, tenham uma viso abrangente sobre o ecossistema e sobre os demais atores, sendo, portanto, um bom ponto de partida para esta explorao.
O presente estudo trata de um fenmeno recente, em curso, com pouca publicao acadmica, principalmente no Brasil. Por estes motivos, o estudo tem natureza exploratria e foi abordado de forma qualitativa (Malhotra, 2006), pois a nfase est no entendimento do fenmeno social, suas caractersticas e significados (Denzin & Lincoln, 2011). A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas em profundidade, com a utilizao de um roteiro semi-estruturado (Aaker, Kumar, & Day, 1995) adequado captao das motivaes, crenas e valores dos entrevistados em relao ao tpico estudado (Malhotra, 2006;Gaskell, 2000). Esse mtodo favorece um contato intenso com o campo e
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propicia uma viso profunda e holstica do fenmeno em observao (Miles & Huberman, 1984; Stebbins, 2008).
Foram entrevistados os principais executivos de algumas das maiores editoras brasileiras de livros no segmento didtico. Dentre as oito editoras participantes, duas estavam entre as 54 maiores do planeta em 2013 (Vaz, 2013) e cinco estavam entre as maiores fornecedoras do Programa Nacional do Livro Didtico (PNLD) em 2012 (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao [FNDE], 2013). Oito entrevistas foram realizadas nos meses de abril a dezembro de 2012. Todas as entrevistas foram gravadas com a autorizao dos entrevistados, totalizando mais de 16 horas e cerca de 220 pginas de transcries, decupadas em mais de 270 citaes. As caractersticas das empresas e entrevistados encontram-se na tabela 3.
Para suportar a anlise, as transcries foram inseridas em um software e as citaes foram catalogadas em categorias. Estas foram posteriormente agrupadas em macro-categorias, utilizando a tcnica de anlise de contedo num processo iterativo de verificao, reduo e organizao de dados (Miles & Huberman, 1984).
A anlise das entrevistas utilizou as categorias da literatura (apresentadas ao final da reviso). Dado o carter exploratrio da pesquisa e a opo por um roteiro com perguntas abertas, foi possvel captar no campo categorias emergentes, que no apareceram na literatura e que permitiram o avano na compreenso do fenmeno estudado: a adoo de inovaes em ecossistemas.
Tabela 3 - Empresas e Entrevistados
Editora Tiragem para PNLD
(unidades/2012)
Parte de Grupo Internacional?
Entrevistado Cargo
1 > 10 Milhes Sim 1 Diretor de Tecnologia
2 > 1 Milho No 2 Diretor de Tecnologia
3 > 1 Milho Sim 3 Diretor Editorial
4 > 1 Milho Sim 4 Diretor Geral
5 > 10 Milhes No 5 Diretor de Qualidade
6 > 5 Milhes No 6 Diretor de Marketing
7 > 5 Milhes No 7 Diretor de Negcios
8 > 2 Milhes No 8 Diretor Geral
Fonte: Autores e FNDE (2013)
4. ANLISE DE RESULTADOS
O objetivo deste trabalho compreender a adoo de inovaes disruptivas em ecossistemas, mapeando o processo de adoo do livro didtico digital no Brasil e investigando as fontes e os
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gatekeepers da inovao, assim como as possveis causas destes comportamentos. Neste sentido, o estudo busca uma viso sistmica do processo, que leva em conta no um nico adotante da nova tecnologia, mas um conjunto de participantes que precisam aderir a esta nova plataforma (o livro didtico digital) para que ela se torne o padro.
Assim, a anlise est organizada a partir deste olhar sistmico, destacando os principais participantes do ecossistema no qual o livro didtico est inserido, que emergiram na anlise como elementos fundamentais para a adoo de uma inovao tecnolgica neste setor. So eles: Autores, Editoras, Escolas, Professores, Plataformas, Sistemas de Ensino, Governo e Consumidores. Para cada um destes participantes, sero destacados os fatores que surgiram na anlise como potenciais impulsionadores ou desestimuladores da adoo do livro digital didtico como padro.
4.1 Autores
Se pensarmos no autor como um elemento inicial, onde todo o processo criativo do livro didtico comea, temos a o primeiro insight oriundo da utilizao de uma viso sistmica: o autor, na grande maioria das vezes, comea sua carreira como um professor. Este professor, em dado momento, sente necessidade de criar seu prprio material para suas aulas e a surge o primeiro rascunho do que, transformado por uma editora e comercializado para outros professores, passa a ser um livro didtico. Pode-se dizer, ento, que o livro didtico nasce na sala de aula.
Porm, na medida em que sua carreira evolui, esse professor, agora autor, eventualmente pode abandonar a sala de aula. Instintivamente, fica congelada em sua mente uma ideia de turma que aquela ltima turma para a qual ele deu aula. Com isso, o autor para de inovar e, consequentemente, seu livro envelhece. comum ento se ver no mercado editorial didtico autores de uma s coleo, o que ruim tanto para os autores quanto para as editoras, que perdem a chance de apostar em franquias vencedoras, fato comum em outras indstrias ligadas a bens de informao (Shapiro & Varian, 2003), como cinema, msica e livros de fico.
A editora fala para o autor: seu projeto est cansando, a gente quer que voc inove. Mas no inova. H umas coisas perversas com o autor. Enquanto ele est dentro da sala de aula, ela obriga o professor a se inovar. O professor, a primeira coisa que ele faz quando ele consegue sair da sala de aula. Mas a ele perde essa perspectiva, esse contato com a realidade da escola. Ele perde a sincronia e a ele vai envelhecendo (Entrevistado 1).
Esta questo, que j era relevante no livro didtico impresso, se agrava no formato digital. Surgem discusses sobre o processo autoral, que pode deixar de ser do autor, ou de um pequeno grupo de autores, e passar a ser compartilhado entre um conjunto maior de especialistas, com competncias
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distintas, gerenciados pela editora. Esta nova forma de lidar com a questo autoral permitiria s
editoras utilizarem melhor outras possibilidades dos livros digitais.
O autor era um ser sacralizado. Hoje o conceito de obra coletiva. O autor uma pessoa a quem eu incubo uma tarefa importante, uma pessoa que sabe falar daquele tema, mas um agente entre tantos outros, o editor tambm sabe falar da obra (Entrevistado 3).
Estas questes podem ser percebidas pelos autores como ameaas, pois exigem mudanas na forma de trabalhar baseadas na criao de novas competncias. Ademais, estas mudanas podem diminuir o poder, o controle e a relevncia do autor sobre o produto final e o processo.
4.2 Editoras
A migrao do processo fsico para o digital representa mudanas alm do produto. Antes de tudo, esta passagem impacta a maneira pela qual editores pensam e finalizam livros, ou, em outras palavras, seus modelos mentais.
Hoje, voc consegue escrever qualquer coisa para depois arrumar, no precisa se preocupar com o acabamento como era com a mquina de escrever. Os que so da poca da mquina de escrever tm uma maneira de pensar mais organizada. No se escrevia com a possibilidade de consertar, j vinha com a pretenso de ser bem acabado. Tinha uma etapa de produo para o texto amadurecer que desapareceu com o advento da internet, do e-mail, porque o texto j chega digitado (Entrevistado 5).
A chegada do livro digital acelerou estas mudanas, despertando entre os entrevistados uma reflexo sobre qual o papel da editora num mundo de livros sem papel. No raro, o discurso aponta para uma preocupao em no se posicionar como um produtor de contedo, mas como um disseminador de aprendizado.
A gente sempre atribuiu o nosso negcio ao produto e agora com essa transformao isso nos obrigou a repensar. Ns no nos vemos como produtores de livros. Temos um know how de produzir contedos e estruturlos em uma sequncia didtica que usada em uma sala de aula produz a transformao do aprendizado (Entrevistado 1).
A despeito desta busca por um reposicionamento, a concepo dos entrevistados sobre o que o livro didtico digital e qual o melhor modelo de negcios para produz-lo ainda est fortemente ligada ao livro fsico, sugerindo uma discrepncia entre prticas e discursos. A opo das editoras tem sido empacotar os formatos fsico e digital em um nico produto, precificado a partir do histrico do livro fsico, sendo a parte digital recebida quase como um brinde. Assim, as editoras esperam proteger o seu negcio principal, enquanto aos poucos aprendem as possibilidades de um novo mundo.
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A gente tem uma coleo com o livro impresso que ele acessa no meio digital. () O grande desafio voc mudar o modelo de negcios. Hoje voc tem um negcio sedimentado e precificado no livro fsico e talvez no futuro voc no tenha como precificar todos os recursos digitais nesse livro fsico. Ento, voc vai ter modelos de negcios diferentes com as escolas ou com os pais dos alunos, ou com os professores. Esse o grande desafio. A tecnologia no desafio (Entrevistado 7).
O desafio de estabelecer um novo modelo de negcios para os livros didticos digitais intensificado a partir da indefinio dos custos inerentes a esta nova empreitada. Se por um lado custos de estocagem e distribuio so drasticamente diminudos, fatores como desenvolvimento de sistemas e de interfaces geram despesas muitas vezes imprevistas.
Se olho para um livro consigo chutar o custo dele. No digital isso difcil de visualizar rapidamente. No impresso tem algumas coisas que rapidamente voc olha e no erra muito feio. No digital, voc tem no sei quantos gigas que ocuparam muito tempo ou uma elaborao que no so palpveis (Entrevistado 5).
H carncia de profissionais capazes de dialogar tanto com editores formados no meio impresso como com desenvolvedores de aplicaes multimdia. Ao contrrio do mercado norteamericano, as editoras brasileiras no consideram o desenvolvimento de sistemas uma atividade estratgica, optando por terceiriz-la; como descrito pelo entrevistado 4: No momento em que [desenvolver software] for um diferencial cavalar, ento eu mantenho dentro de casa. Enquanto for uma commodity, ento vamos compartilhar, barateia o custo.
Independentemente dos custos de desenvolvimento, os livros didticos digitais vo muito alm das ilustraes de seus similares impressos. A adio de filmes e msicas no contedo do livro obriga as editoras a desenvolverem tambm sua gesto de propriedade intelectual. A natureza multimdia dos livros eletrnicos muitas vezes fora as editoras a pagarem pelo uso de objetos digitais presentes gratuitamente em outros meios. Alm deste ponto, os entrevistados levantaram preocupaes de que a pirataria, hoje representada pela figura do xeroqueiro, se intensifique no ambiente digital.
Se eu tiver que colocar uma msica do Michael Jackson na sala de aula para trabalhar ingls, para fazer isso via livro didtico vou ter que gastar muito para poder ter uma autorizao de uso da msica que inviabiliza a produo ou sai mais caro que o prprio livro. Na internet o professor faz isso sem custo nenhum (Entrevistado 5).
Este ltimo ponto levanta uma ameaa ainda mais complexa: num mundo audiovisual, o livro ser necessrio para o aprendizado? E, se o livro evolui para algo que no baseado em texto, mas em som, vdeo, imagens, so as editoras as empresas melhor preparadas para produzir ou mesmo empacotar este material?
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Tem algumas solues que voc no tem experincia de leitura, outra coisa. Voc no sabe se um livro, se voc est vendo um filme, se voc est jogando um game. Ento existem algumas solues que transitam entre esses conceitos (Entrevistado 1).
Novamente a viso do ecossistema nos auxilia aqui a perceber que, com o desaparecimento das fronteiras entre as indstrias, participantes que originalmente atuavam em outros negcios, como produtoras de vdeo, empresas de mdia, grupos de educao ou grandes empresas de tecnologia podem estar mais bem preparados que as editoras tradicionais para assumir esta funo e editar os livros didticos do futuro.
Em suma, apesar de perceberem as vantagens logsticas do livro digital, as editoras, de forma geral, se mostraram reticentes diante desta nova tecnologia. A perda de relevncia e a necessidade de desenvolverem novas competncias e novos modelos de negcio parecem ser as grandes responsveis por esta atitude.
Os editores tm que deixar de ser editores de papel. Quando o cara planeja um livro, ele no pode pensar na pgina impressa, tem que pensar no device e nas prprias interaes pedaggicas. (...) O objetivo pedaggico agora pode ser outro, acho que a eficcia maior, infelizmente... porque muda a forma que eu sei trabalhar. um aprendizado (Entrevistado 3).
4.3 Escolas
As escolas so um ator fundamental para a adoo dos livros didticos digitais. Ainda que os discursos apontem para um histrico de investimentos em novas tecnologias, h uma tendncia de subaproveitamento dos recursos destas inovaes, que acabam sendo utilizadas dentro do modelo tradicional da escola, e no em seu pleno potencial.
Na sua relao com a tecnologia, o primeiro movimento da escola foi tentar escolarizar o digital. Ento ela criou esses ambientes fechados, o laboratrio: olha a gente tem tecnologia, mas est ali guardadinho na jaula. () Eu acredito que a escola no um ambiente assim frtil para revolues (Entrevistado 1).
Os investimentos em novas tecnologias so direcionados em funo do ganho de imagem obtido pelas instituies. Desta forma, as tecnologias digitais seriam observadas como os prprios diferenciais competitivos das escolas no mercado, em detrimento dos benefcios potenciais destas inovaes no aprendizado dos alunos. Assim, embora tenham recursos digitais, estas escolas ainda operam num modelo mental de tecnologias impressas.
Por que essas escolas querem incorporar a tecnologia? Por uma questo de sobrevivncia dentro do mercado. Elas querem parecer... percepo de cliente: ns somos uma escola antenada, moderna. Ento o que aconteceu?
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Elas comearam a comprar tablet e no sabem o que fazer com aquilo (Entrevistado 1).
Isto denota uma adaptao dos novos meios digitais (em especial o livro didtico digital) s prticas escolares convencionais. Alm da negligncia de diversos benefcios exclusivos das novas tecnologias, como personalizao de aprendizagem, esta abordagem evidencia limitaes dos mtodos de ensino tradicionais e da infraestrutura das escolas em relao nova realidade dos alunos e de suas mdias.
No adianta s colocar tecnologia na sala de aula. No resolve, surgem outras demandas. Exemplo: a escola quer sair bem na foto, a todos os alunos vo ter tablet. No primeiro dia de aula: professora, onde carrego meu tablet? Tem 3 tomadas na sala de aula e 30 tablets. Primeiro ponto. Segundo ponto: um liga um sonzinho, outro liga no sei o qu. Para implantar um troo deste na sala de aula tem que ter um mtodo, tem que ter um aparato tecnolgico para voc poder utilizar (Entrevistado 8).
4.4 Professores
Os professores so apontados nesta pesquisa como grandes gatekeepers do processo de inovao nas escolas. Verdadeira ou injusta, esta afirmao reflexo da realidade da rotina de um professor de ensino fundamental ou mdio no Brasil. Questes relativas remunerao e jornada de trabalho foram os professores a preencher a maior parte do seu tempo em sala de aula, reduzindo drasticamente as atividades de pesquisa e atualizao curricular. Como resultado, estes profissionais vm se apoiando cada vez mais no chamado livro didtico do professor para definir seus cursos e seus mtodos.
Nosso sistema de ensino no prev horrios para o professor fazer pesquisa e se atualizar. Ele privado desse tempo. (...) O professor usa o livro didtico como um curso. Eu sempre insisti que o livro no um curso, um recurso. Mas acaba se tornando um curso porque o professor no consegue montar o curso dele e fazer pesquisas. Ento como ele no tem esse tempo de inovao o livro inova por ele (Entrevistado 1).
Esta dependncia faz de qualquer mudana no livro didtico um potencial risco para professores e, consequentemente, editoras. Assim, os professores assumem uma postura conservadora em relao adoo de inovaes, procurando reduzir o tempo dedicado ao aprendizado de novos mtodos para maximizar o tempo investido em sala de aula.
O prprio MEC tem o portal do professor com quantidades de objetos educacionais digitais. A utilizao desse portal mnima, o nmero de acesso dos professores em sala de aula pfio.() A grande barreira no so os alunos, so as barreiras da prpria infraestrutura ou do prprio corpo docente (Entrevistado 3).
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A adoo do livro didtico digital parece, portanto, estar bastante ligada sua aceitao pelos docentes. Para alguns dos entrevistados, alm da curva de aprendizado inerente ao uso de novas tecnologias, h entre os professores a percepo de que os livros digitais comprometem ainda mais a sua j atualmente questionada relevncia.
O professor era o sujeito que emanava informao, o poder estava com ele. Hoje, quando voc leva um livro digital, ele pode no ser mais o centro. (...) Acho que muita gente pensa que se voc tiver um livro multimdia, dispensvel utilizao do professor. No se trata disso, ao contrrio, ele mais necessrio (Entrevistado 4).
O modelo atualmente utilizado pelas editoras, baseado em livros impressos enriquecidos com objetos digitais acessados via internet, justificado pela resistncia dos professores em adotar tecnologias puramente digitais. Na viso dos editores entrevistados, os professores surgem como grandes limitadores da difuso de livros didticos plenamente digitais.
Para ensino mdio mais vlido voc ancorar todas essas solues no material impresso que o professor recebe. Porque ele fica mais na zona de conforto. O aluno no problema, ele acompanha essas novas mdias. O professor quem precisa passar por uma capacitao, seno voc no consegue introduzir um software desse (Entrevistado 7).
4.5 Plataformas
O mercado de livros digitais se consolidou ao redor de plataformas, como Amazon Bookstore e Apple iBooks, que conectam autores e editoras a leitores. A entrada destes participantes, que at pouco tempo atrs no faziam parte da indstria, mas que passam a integrar o ecossistema decorrente da convergncia (Jenkins, 2006), e a polarizao do mercado entre estes poucos players percebida como desestimulante para a produo de livros didticos digitais pelas editoras brasileiras. Embora o livro digital reduza custos relativos a distribuio e estoque, a taxa cobrada por essas plataformas a cada venda realizada observada com restries.
H uma cultura de que o digital no tem custos. Isso de uma ingenuidade absoluta. O custo do prottipo igual, o custo que voc no tem de logstica, de papel. Mas a gente precisa lembrar que as editoras deixam 30% com a Apple. Se voc derruba a impresso, voc ganha um scio que leva 30% sobre o preo do produto (Entrevistado 1).
A indefinio sobre qual ser a plataforma padro da indstria surge como um limitador para a produo de livros didticos digitais, como descrito pelo entrevistado 3: Fica sempre uma incgnita para ver quem vai ganhar, para ver qual o formato que a gente vai colocar os livros. Se Acrobat, se Android ou se iOS. As maiores plataformas comercializam livros digitais a partir de um formato
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proprietrio, forando as editoras a multiplicar seus custos de desenvolvimento para se tornarem compatveis com estas plataformas.
A criao de uma plataforma de comercializao de livros didticos digitais brasileira no vista como vivel por muitos dos seus entrevistados. Limitaes relativas a recursos e a competncias de desenvolvimento de sistemas surgem como os principais impeditivos.
Os caras tm capital e infraestrutura escalvel. Se a gente lanar um negcio dessa escala agora, a gente tem que fazer o marketing sozinho, tem que montar uma infraestrutura tecnolgica pesadssima que esses caras j tm.(...) A tendncia voc ter um player grande que traz o contedo de todo mundo e revende. A gente teve poucos no Brasil que tentassem realmente ou que conseguissem fazer isso acontecer (Entrevistado 2).
Embora vrios participantes do ecossistema, especialmente alguns dos mais tradicionais, tenham uma posio prioritariamente contrria inovao proporcionada pelo livro didtico digital, as plataformas representam uma fora claramente impulsionadora da inovao. Em suas estratgias para entrarem em indstrias j estabelecidas, empresas como Apple, Google e Amazon buscaram sempre mudar as regras do jogo, apostando em inovaes disruptivas (Christensen, 1997). No toa, a entrada destas empresas no mercado editorial vista com receio pelas editoras que, alm das desvantagens j mencionadas, percebem uma ameaa concreta aos seus modelos de negcio e, ainda pior, sua relevncia no ecossistema.
Essa histria est sendo escrita agora. Vamos falar da Apple, eu no sou porta voz da Apple, mas olhando de fora, a Apple criou uma loja de vender msica, depois essa loja passou a vender msica, seriado, filme, app, livro, os caras criaram um mega ecossistema. Na criao desse ecossistema que eles foram brilhantes, ele criou uma loja que eu me cadastro, coloco meu carto de crdito e a partir da eu crio uma relao com eles. Ento eles enxergam que isso tem valor, historicamente toda vez que eles forem absorvendo uma nova indstria da msica para o seriado de televiso e para o filme, para o livro e agora para revista e assim por diante (Entrevistado 2).
4.6 Sistemas de Ensino
Outra grande fonte de inovao no ecossistema de ensino so os Sistemas de Ensino, que surgiram nas ltimas dcadas como novos competidores dentro da indstria editorial didtica. A participao destes sistemas no ensino particular relevante e, segundo o entrevistado 6, a AbreLivros (Associao Brasileira de Editores de Livros Escolares) fez recentemente um estudo sobre quanto os sistemas ocupam da rede particular, e chega a 38%. apavorante.
Fica claro na pesquisa que os sistemas ganharam mercado porque comearam a brigar com as editoras tradicionais oferecendo algumas vantagens que o livro didtico no oferecia, como colocado
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pelo entrevistado 5. De modo geral, enquanto editoras tradicionais oferecem livros, sistemas ofereceriam s escolas uma estrutura completa de curso, com metodologia, treinamento de pessoal, avaliao e administrao prprios.
Com o sistema, o diretor da escola utiliza a distribuio das apostilas bimestrais, como objeto de presso para o aluno inadimplente. Com o sistema a escola se livra do coordenador pedaggico, porque a apostila tem uma srie metdica de aulas que acontecem em datas certas. O professor tambm avaliado porque a prova que ele aplica vem de fora. Se os alunos forem mal a avaliao dele piora. Ento o diretor fica contente em ter professores controlados e ensino com um padro de resultados (Entrevistado 6).
Nos ltimos anos, os sistemas tm conquistado espao no concorrido mercado governamental. Num nvel municipal, a oferta de capacitao de docentes integrada oferta de apostilas se mostra especialmente atraente.
A deciso de aderir ou no ao Plano Nacional do Livro Didtico no vem do MEC, essa deciso exclusiva do municpio. Existem vrios municpios no Brasil que aderem a sistemas porque eles vendem o treinamento de professores. Os municpios enxergam esse tipo de coisa como uma melhoria e uma reduo de custos (Entrevistado 4).
Alm da profunda integrao com a escola, os sistemas de ensino tm maior contato com o consumidor final, o aluno e sua famlia. Nas verses mais atuais, os sistemas permitem certa customizao das lies passadas aos discentes, tornando o aprendizado mais individualizado, como exposto pelo entrevistado 8: Foi implantado um sistema de avaliao onde se consegue avaliar as habilidades de cada aluno. Com isso se consegue detectar se o aluno est defasado, ou seja, se ele no est proficiente.
Ao contrrio das editoras, que usualmente distribuem seus livros por meio das livrarias, compras governamentais e associao de pais, os sistemas de ensino tm desenvolvido um contato direto com escolas, professores, pais e alunos. A partir desta viso sistmica, os sistemas parecem adotar uma estratgia de Total Customer Solution, entregando uma soluo completa e integrada aos seus clientes, as escolas, ao passo que as editoras tradicionais utilizam um posicionamento de Best Product, focando todas as suas chances no produto livro didtico (Hax & Wilde, 1999). Outra distino marcante entre editoras e sistemas de ensino a opo destes pela verticalizao, pois hoje os maiores sistemas controlam grficas, editoras e desenvolvedoras de software.
Quando comearam a vender os materiais para as escolas, no tinha onde imprimir. Ento precisaram abrir uma grfica. Depois, abriram o curso de informtica, mas era carssimo comprar computador no Brasil. Ento comearam a montar computadores. A parte de software tambm produzida internamente (Entrevistado 8).
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O controle de vrias camadas da produo editorial, bem como o contato direto com o consumidor final, tornam a migrao do livro impresso para o digital mais natural. Dentre os entrevistados, aqueles atuando em editoras com ofertas de sistemas de ensino foram os que apresentaram livros didticos totalmente digitais, efetivamente se distanciando da oferta intermediria do livro impresso com acesso a objetos digitais via internet.
A gente trabalha com o digital como complementar h anos, mas acho que agora chegou a hora da ruptura. Agora, j tem escolas que no vo mais receber o livro impresso. Qual o tamanho desse mercado? A gente ainda no sabe (Entrevistado 8).
4.7 Governo
O governo descrito como um agente profissionalizante da indstria. Para um setor que nasceu dos esforos de professores que criavam seu prprio material didtico, a formao de um mercado governamental normatizado deu acesso s editoras a um mercado maior que o privado, ainda que repleto de desafios relativos ao seu volume e suas margens reduzidas.
A indstria estava voltada para o mercado privado. A voc migra para o mercado governamental com margens menores e volume maior. O preo de um livro para o governo chega a 90% de desconto em relao ao mercado privado. (...) O mercado governamental tem normas definidas pelo MEC. Isso deu uma nova perspectiva para a indstria: antes voc tinha uma vida mdia para um livro, hoje voc tem outra, porque est definido um ciclo de cada trs anos de inscrio. Se hoje um livro aprovado nesse ciclo, isso no significa que no prximo o livro continua aprovado. Tem que reinscrever, jogar de novo na roleta. (...) Por isso as editoras se profissionalizaram (Entrevistado 4).
O governo descrito tambm como um agente difusor de tecnologias digitais na educao. H um movimento de compra de dispositivos como PCs e tablets para distribuio em escolas pblicas. Consequentemente, este investimento estimula o mercado privado a tambm investir em novas tecnologias para se manter, no mnimo, equiparado; como exposto pelo entrevistado 1: O governo acabou de comprar 160 mil tablets para professores. Como fica o dono da escola particular na hora em que a escola pblica tiver tablet e ele no?.
O estmulo do governo adoo de tecnologias digitais na sala de aula parece ocorrer revelia das editoras. Se normas foram escritas estimulando a criao de objetos digitais vinculados aos livros didticos impressos, o mesmo no se pode dizer sobre o modelo de comercializao destas inovaes. Considerando o alto custo de desenvolvimento destes recursos, a chegada de livros digitais didticos tornou a operao das editoras mais arriscada.
O governo colocou pela primeira vez no edital o componente digital atrelado obra. Ningum era obrigado a participar, mas nenhuma editora no ia fazer. (...) A gente inscreveu o mnimo de objetos por obra, 10 por livro... Uma loucura, pelo custo de produo. (...) E a gente no sabe que preo ser
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praticado. Lidar com o governo assim, na coragem e na f. Eu no acho benfica a ao do governo. ela formata muito, reduz a rentabilidade e no melhora o ensino (Entrevistado 3).
A motivao para a incluso no PNLD da solicitao por objetos digitais questionada por vrios entrevistados. Dadas as condies precrias da educao no pas, da falta de infraestrutura carncia de mo-de-obra qualificada, h que se pensar no que um professor far com objetos digitais numa escola sem quadro-negro ou eletricidade. Mas o governo pede, e quando o maior cliente pede, o pedido soa como ordem. Praticamente todas as editoras atenderam o ltimo edital e criaram objetos digitais atrelados obra principal, que permanece sendo o livro em papel. Sem um modelo de negcios definido e sem saberem quanto podero cobrar por tais objetos, as editoras enfrentam um momento de grande incerteza.
4.8 Consumidores
Consumidores finais de livros didticos digitais so, em sua maioria, pais e alunos. Os primeiros como pagantes e os segundos como usurios finais do produto. Exclusivamente em relao a quem paga a conta, um grande benefcio da adoo de livros digitais seria a reduo de custos. Livros digitais tendem a ser em mdia 30% mais baratos que livros fsicos, o que por si j um enorme alvio para qualquer pai que j tenha enfrentado uma lista de material escolar de incio de ano. No entanto, os custos de aquisio de hardware como tablets ainda surgem como limitadores da difuso de livros digitais.
A imagem surge como um fator importante para os pais, posto que a famlia busca instituies atualizadas tecnologicamente ou metodologicamente como sinal de uma boa escolha e do bom cumprimento das responsabilidades como pais. Em especial, h uma verificao se a escola particular escolhida suficientemente diferente de escolas pblicas.
No mercado privado os pais no querem os filhos com os mesmos livros das escolas pblicas. O professor da escola particular pressionado pelo pai. Ento a escola precisa mostrar que tem algo novo. Foi isso com o construtivismo: o pai pergunta qual mtodo?, tradicional, tendendo ao construtivismo. No tem construtivismo nenhum. Mas a escola precisa mostrar que tem, na parte tecnolgica idem (Entrevistado 3).
A adoo de novas tecnologias pelas escolas aparenta estar diretamente ligada tambm percepo dos pais em relao ao seu impacto sobre o ensino. H um questionamento se dispositivos eletrnicos facilitam o aprendizado ou formam indivduos incapazes de lidar com o cotidiano sem seu apoio, como apontado pelo entrevistado 1: A introduo da calculadora nos cursos de matemtica foi
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feita a duras penas. No foi sem sofrimento, sem bandeiras. H uma resistncia dos professores, dos pais e da famlia tambm.
Analisando o consumidor final (o aluno), o maior apelo do livro didtico digital seria a convenincia. Mais do que interatividade ou personalizao, a facilidade de carregar vrios ttulos num nico dispositivo um dos principais benefcios procurados pelos consumidores, como dito pelo entrevistado 3: O livro impresso no tem razo de ser. mais econmico para o aluno ter tudo num iPad. No tem porque ele carregar uma mochila com 10 livros.
Apesar de grande parte da literatura de adoo de inovaes se centrar no consumidor final, nesta anlise sistmica ele no parece ser o mais importante nem o decisor final. Pais e alunos provavelmente adotaro o livro didtico digital se este se tornar o padro da indstria, assim como ns passamos a ouvir CDs e assistir filmes em Blu-Ray sem que ningum tivesse nos perguntado se, como consumidores, era isso mesmo o que queramos.
5. CONCLUSES
O objetivo deste trabalho foi compreender o processo de adoo de inovaes disruptivas em ecossistemas, a partir do estudo do livro didtico digital no Brasil, buscando levantar as fontes e os gatekeepers da inovao, assim como as possveis causas destes comportamentos. Como j foi dito, a anlise est centrada nos editores, escolhidos por serem um ponto central no ecossistema, que gera interface com todos os outros participantes. Entretanto, esta uma limitao do estudo, que merece ser tratada em pesquisas futuras, com a participao de outros pontos do ecossistema entre os sujeitos pesquisados, como autores, professores, gestores de escolas, pais e alunos. Ainda assim, foi possvel perceber a diversidade deste ecossistema e os desafios que uma inovao enfrenta antes de se tornar o novo padro.
A incorporao do livro didtico digital por mltiplas camadas dentro do ecossistema fundamental para que esta tecnologia chegue at o consumidor final (pai ou aluno) que, ento, ter muito pouca opo sobre adotar ou no esta inovao. Uma vez que se torne o padro da indstria, no haver muita escolha para o usurio final. Neste sentido, o governo emerge como hub (Iansiti & Levien, 2004) do processo de inovao na anlise. A demanda recente deste importante comprador por objetos digitais obrigou as editoras a adaptarem seus processos e mergulharem na nova tecnologia.
Outro elemento importante que parece impulsionar a inovao so as novas plataformas, que buscam a inovao em servios ao consumidor (Hax & Wilde, 1999) ou em modelos de negcio
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(Christensen, 1997) para entrarem num mercado j consolidado. Surgem a Sistemas de Ensino e as plataformas digitais como Apple, Amazon e Google, todas com iniciativas em educao.
Num novo ecossistema convergente, onde a grande ameaa vem de empresas que h pouco tempo no eram monitoradas como potenciais concorrentes ou substitutas, as editoras podem ser impelidas a inovar pela percepo de que, se no o fizerem, outro participante do ecossistema o far. Neste sentido, as editoras pesquisadas muitas vezes se mostraram descontentes com o caminho a seguir e temerosas em dar um passo em direo inovao e acelerar a derrocada do livro fsico.
Por suas vez, escolas, autores e professores parecem ainda reticentes em relao nova tecnologia. Estes percebem sua utilidade, mas tambm reconhecem a dificuldade em reaprender a trabalhar, desenvolver novas competncias, enfim, entrar num mundo diferente, onde no s o livro digital, mas todo o ensino pode ser questionado e passar por transformaes profundas.
Enfim, nota-se na anlise das entrevistas que a adoo ou o fracasso do livro didtico digital depender no da avaliao de seus atributos por um nico participante do ecossistema, mas de uma intricada teia de dimenses e atores, que se organizam sempre de forma interdependente. A figura 3 traz um resumo destas dimenses e atores, enquanto a tabela 4 apresenta definies para cada dimenso identificada. O balanceamento das dimenses faz com que cada um destes participantes tenda a funcionar como um impulsionador ou um limitador do processo de inovao. E pode-se dizer que a soma de todas estas foras, ponderadas pelo poder que cada participante tem no ecossistema, resultar no estabelecimento ou no da plataforma digital do livro didtico.
Figura 3: Participantes dos ecossistemas e dimenses que influenciam a adoo do livro didtico
digital
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Adoo de inovaes em mercados em rede: uma anlise da introduo do livro didtico digital no
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Fonte: Elaborado pelos autores.
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Tabela 4 - Definies das Dimenses que influenciam a adoo do livro didtico digital Dimenso Definio
Contedo
Capacidade de atrair complementares que enriqueam a plataforma com contedo tais como texto, video, udio e software; no necessariamente curados ou criados por produtores tradicionais
Percepo do sujeito se mais importante priorizar o controle sobre sua oferta ou priorizar o valor de sua oferta
Capacidade de uma inovao se adaptar s necessidades especfcas do usurio
Custos associados ao aprendizado de um indivduo acerca da utilizao de uma inovao
Custos associados ao desenvolvimento de condies operacionais para a adoo de uma inovao
Flexibilidade em Modelode Negcio
Custos de Mudana
Imagem
Incluso
Impacto da criao ou ausncia de padres na adoo de uma inovao
Logstica Impacto de uma inovao nos custos de distribuio de uma oferta
Modelo Mental
Lock-in
Pirataria
Reduo de Custos
Foco estratgico das empresas que compem o ecossistema na soluo para o consumidor e no no produto
Fonte: Elaborado pelos Autores
A partir do caso especfico de adoo de livros didticos digitais, busca-se compreender o processo de adoo de inovaes disruptivas em ecossistemas. Tomando por base os conceitos de Miles e Huberman (1994), as informaes coletadas no campo e a literatura foram confrontadas novamente, num processo iterativo cujo propsito foi verificar, reduzir, organizar e recategorizar os dados num conjunto mais parcimonioso. Neste sentido, possvel buscar uma extrapolao terica dos achados da pesquisa, iniciando o processo que culminar com o estabelecimento de construtos e do modelo terico para adoo de inovaes em ecossistemas. Assim, foram levantadas as seguintes variveis: Ambiente Estratgico no Ecossistema, Controle Sobre Propriedade Intelectual, Cultura de Inovao, Custos de Adoo, Ganhos de Eficincia Operacional, Imagem, Incluso, Infraestrutura, Percepo de Valor da Oferta e Regulao. As definies de cada varivel, bem como as dimenses que as originaram constam na tabela 5.
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Controle de Propriedade Intelectual
Convenincia
Custos de Aprendizado
Capacidade de uma organizao de adaptar seu modelo de negcios em funo da evoluo do seu ecossistema
Capacidade da inovao criar percepes positivas a respeito de um usurio por parte dos seus pares
Capacidade de uma inovao gerar pertencimento de um indivduo ou grupo a determinado grupo
Infraestrutura Impacto da infraestrutura na adoo de uma inovao
Regulao
Impacto do Governo ou de entidades reguladoras na adoo de inovaes
Resistncia ou predisposio em identificar e assumir mudanas no status quo
Impacto da distribuio e venda no autorizada de propriedade intelectual na adoo de uma inovao
Capacidade de uma inovao gerar ganhos de eficincia operacional pela reduo dos custos envolvidos na operao
Risco Averso ou tolerncia a risco de uma organizao
Soluo Completa
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Brasil
Tabela 5 - Variveis que influenciam a Adoo de Inovaes em Mercados Mediados por
Plataformas
Varivel Definio Dimenses de Origem
Ambiente Estratgico no Ecossistema
O quanto o ambiente Estratgico do Ecossistema estimula a adoo de inovaes pela existncia de padres e pela orientao das empresas ao consumidor
Lock-in
Soluo Completa
Controle Sobre Propriedade Intelectual
Percepo do sujeito se mais importante priorizar o controle sobre sua oferta ou priorizar o valor de sua oferta
Pirataria
Controle Sobre Propriedade Intelectual
Cultura de Inovao
Capacidade do sujeito de perceber transformaes como oportunidades, ao invs de ameaas
Modelo Mental
Tolerncia a Risco Flexibilidade em Modelo de Negcio
Custos de Aprendizado Custos de Mudana
Custos de Adoo
Percepo sobre os custos totais relativos criao das condies necessrias para a adoo de uma inovao
Ganhos de Eficincia Operacional
Capacidade da Inovao de elevar a eficincia do sujeito
Reduo de Custos
Logstica
Capacidade da inovao criar percepes positivas a respeito de um usurio por parte dos seus pares
Imagem
Imagem
Capacidade de uma inovao gerar pertencimento de um indivduo ou grupo a determinado grupo
Incluso
Incluso
Infraestrutura
Infraestrutura
Impacto da infraestrutura na adoo de uma inovao
Percepo de Valor da Oferta
Percepo do sujeito sobre o quanto a inovao capaz de atender suas demandas
Convenincia
Contedo
Impacto do Governo ou de entidades reguladoras na adoo de inovaes
Regulao
Regulao
Fonte: Elaborado pelos autores
Admite-se que algumas destas variveis j tenham sido abordadas por modelos de adoo de inovao constantes na reviso de literatura deste estudo. Custos de Adoo podem ser investigados por construtos como Facilidade de Uso Percebida (Davis, 1989) ou Expectativa de Esforo" (Venkatesh, Morris, Davis, & Davis, 2003). Ganhos de Eficincia Operacional poderiam ser explorados pelos construtos Utilidade Percebida (Davis, 1989) ou Expectativa de Desempenho (Venkatesh et al, 2003). Imagem, por sua vez, poderia ser analisada por meio do construto Influncia Social de Venkatesh et al (2003). Finalmente, Infraestrutura tem um paralelo com o
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construto Condies Facilitadoras (Venkatesh et al, 2003), assim como Percepo de Valor da Oferta pode ser avaliada com os construtos Facilidade de Uso Percebida e Utilidade Percebida de Davis (1989).
Contudo, o presente estudo aponta para variveis pouco exploradas que se mostraram relevantes para a adoo de inovaes em mercados mediados por plataformas. Ambiente Estratgico no Ecossistema indica a influncia dos posicionamentos estratgicos dos players de um ecossistema sobre a adoo de inovaes. A existncia de padres e o foco no cliente surgem como drivers que podem determinar o sucesso ou o fracasso de uma inovao (Hax & Wilde, 1999).
Controle Sobre Propriedade Intelectual refere-se ao modo como o sujeito percebe a facilidade de distribuio e replicao caractersticos de mercados mediados por plataformas: como uma forma de aumentar a proteo da sua propriedade intelectual ou como uma maneira de aumentar o valor desta propriedade? (Shapiro & Varian, 2003).
Cultura de Inovao aborda o quanto o sujeito capaz de se adaptar s transformaes em seu ecossistema. Para tanto, flexibilidade em modelos de negcio, habilidade de se abster do status quo e tolerncia a risco se mostram fundamentais (Day & Schoemaker, 2006).
Incluso reflete o quanto inovaes em tecnologia e mdia vm se tornando peas fundamentais na criao de pertencimento a um determinado grupo. Varivel que emergiu diretamente dos dados primrios, Incluso ganha importncia ainda maior em mercados onde dispositivos digitais so a forma mais eficiente de se obter legitimao, cidadania, informaes ou direitos.
Finalmente, Regulao destaca o papel de entidades reguladoras, das quais os governos se destacam, nos estmulos ou restries legais dirigidas a uma inovao.
Isto posto, o presente estudo tem na anlise estratgica da adoo de livros didticos digitais sua principal contribuio gerencial, enumerando as principais dimenses que regulam a difuso desta inovao no Brasil. Do ponto de vista acadmico, o estudo oferece uma compreenso sobre o processo de adoo de inovaes disruptivas em ecossistemas de negcio, evidenciando a importncia de uma viso sistmica sobre um fenmeno cuja anlise tradicionalmente centrada apenas num sujeito, o consumidor. Como resultado, aponta para variveis pouco exploradas em estudos de adoo de inovao, como Ambiente Estratgico no Ecossistema, Incluso e Cultura de Inovao.
Esta uma pesquisa exploratria e, como tal, no tem a pretenso de generalizar resultados ou concluir ou mesmo quantificar relaes causais. Esta dever ser uma tarefa de pesquisas futuras. Entretanto, este um primeiro degrau, que permitiu desenvolver um esboo de um futuro modelo que permita compreender a adoo de inovaes em mercados em rede.
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ABSTRACT
Technology Acceptance Models are usually focused on the end user. However, recent clashes between
similar technologies such as Blu-ray and HD-DVD suggest that the diffusion of innovation do not rely
only on the end user, but also on the rise of a dominant platform capable of attracting complementors.
This paper investigates new technology adoption in platform-mediated markets, identifying the factors
that influence the diffusion of innovation. To do so, the study analyzed the impact of the digital
textbook over the Brazilian publishing industry. Between April and December of 2012, in-depth
interviews were conducted with Brazilian publishers. Results suggest that, besides students, there are
many players influencing digital textbook adoption in Brazil. Publishers and teachers are reluctant
about this new technology, while the Government, Digital Platforms and Teaching Systems are
currently the main supporters of innovation. The study explores the motivation of each of these
players, suggesting that the diffusion of innovation in platform-mediated markets must be analyzed
from a systemic point-of-view, beyond traditional models.
Keywords: Strategy; Innovation; Platforms; New Media; Digital Textbook.
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Data do recebimento do artigo: 09/03/2014
Data do aceite de publicao: 14/11/2014
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Adoo de inovaes em mercados em rede: uma anlise da introduo do livro didtico digital no
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Anexo 1: Roteiro Semi-estruturado utilizado como instrumento de coleta de dados
1) Fale um pouco sobre a sua trajetria profissional no setor de livros didticos.
Explorar: Experincia, evoluo, cenrio brasileiro, cenrio mundial
2) Fale um pouco sobre esta instituio.
Explorar: Histria, fundao, modelo de financiamento, investidores, competidores, posicionamento
de mercado, posicionamento estratgico
3) Na sua opinio, quais as grandes transformaes que ocorreram no setor nos ltimos anos?
Explorar: Mudanas nas demandas do mercado, origens das mudanas, atores das mudanas, papel
do governo
4) Qual o impacto dessas transformaes para os alunos? E professores? Editores? Escolas? Autores?
Reguladores?
Explorar: pontos positivos e negativos (custos de mudana, custos de distribuio, imagem,
escalabilidade). Explorar drivers e gatekeepers da inovao e suas motivaes
5) Quais os maiores desafios para sua organizao hoje?
Explorar: Gesto de direitos, aprendizado, novas competncias
6) Como seria a editora ideal, na sua opinio? O que impede as editoras de chegarem neste ideal? E a
sua editora?
Explorar: Competio, cooperao, coopetition, regulao
7) Como voc v a introduo das novas tecnologias no setor da educao? Quais as iniciativas da sua
editora?
Explorar: Critrios para escolha de tecnologias, orientao ao produto, orientao ao consumidor
8) Pergunta do gnio: Imagine que voc encontra uma lmpada mgica, dentro da qual existe um gnio
capaz de conceder trs desejos profissionais. Os desejos devem facilitar ou melhorar seu dia-a-dia
professional. Quais seriam esses trs desejos?
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Copyright Milton de Abreu Campanario 2014
Abstract
Technology Acceptance Models are usually focused on the end user. However, recent clashes between
similar technologies such as Blu-ray and HD-DVD suggest that the diffusion of innovation do not rely
only on the end user, but also on the rise of a dominant platform capable of attracting complementors.
This paper investigates new technology adoption in platform-mediated markets, identifying the factors
that influence the diffusion of innovation. To do so, the study analyzed the impact of the digital
textbook over the Brazilian publishing industry. Between April and December of 2012, in-depth
interviews were conducted with Brazilian publishers. Results suggest that, besides students, there are
many players influencing digital textbook adoption in Brazil. Publishers and teachers are reluctant
about this new technology, while the Government, Digital Platforms and Teaching Systems are
currently the main supporters of innovation. The study explores the motivation of each of these
players, suggesting that the diffusion of innovation in platform-mediated markets must be analyzed
from a systemic point-of-view, beyond traditional models.
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