Resumo
No presente texto apresentamos algumas considerações teóricas e conceituais que percorrem zonas de contato entre os estudos sociais da ciência e da técnica e os estudos sobre a emergência ecológica. Tais considerações interpelam a noção de Tecnoceno a partir da analítica da colonialidade e suas expressões ontoepistemológicas, permitindo-nos visualizar relações entre tecnologias extrativistas, a virada cibernética e novas formas de controle constituídas por uma certa metafísica informacional. Sugerimos alguns caminhos de reflexão que entrelaçam o ímpeto pela expansão da codificação do mundo, a ampliação de um regime de equivalências através da "governamentalidade algorítmica" com a gramática política e epistêmica da geologia colonial.
Palavras-chave: Tecnoceno; extrativismo; cibernética; colonialidade; governamentalidade algorítmica.
Abstract
In this text, we present some theoretical and conceptual considerations that cover zones of contact between the social studies of science and technology and studies on the ecological emergency. These considerations discuss the notion of Technocene based on the analytics of coloniality and its ontoepistemological expressions, allowing us to see relationships between extractive technologies, the cybernetic turn and new forms of control constituted by a certain informational metaphysics. We suggest some paths of reflection that intertwine the drive to expand the codification of the world, the expansion of a regime of equivalences through "algorithmic governmentality" with the political and epistemic grammar of colonial geology.
Keywords: Technocene; extractivism; cybernetics; coloniality; algorithmic governamentality.
Hegemonia Cibernética e Ontoepistemologia Informacional
A emergência ecológico-sanitária produzida pela pandemia de Covid-19 reconfigura nossa experiência como espécie. O colapso ecológico planetário e a crise civilizacional do movimento incessante de modernização capitalista recolocam na cena pública um conjunto de evidências geo-históricas que tornam ainda mais tangíveis os limites de um "povoamento erradicador" (Mbembe, 2021, p. 126) inaugurado pelo empreendimento colonial. O regime racializado de asfixia e morte diferenciada combinado a um novo ciclo de aceleração extrativa - do trabalho subalternizado, da vida dataficada, do conhecimento e ecossistemas inteiros - fez da pandemia um inaudito laboratório tecnopolítico do capitalismo cibernético-extrativista, sendo ela própria um produto direto das práticas extrativistas e de simplificação ecológica (Moraes; Parra, 2021).
Para além dos grandes esquemas conceituais que logo surgiram a fim de confirmar sua contemporaneidade e relevância diante do colapso, há também uma certa intuição generalizada de que nem a política moderna e suas tecnologias de governo nem a arquitetura ontoepistemológica da ciência moderna e seu funcionamento disciplinar são capazes de oferecer caminhos para além daqueles que nos fazem voltar sempre ao mesmo "beco sem saída", como lembrava Aimé Césaire. Simplificação ecológica, expropriação, deslocamentos forçados, contaminação, confinamento, pandemias: o arsenal da colonialidade é o que permite e incrementa novas tecnologias de extração e controle para além da já conhecida "coleta de dados", produzindo o próprio meio da vida social pela expansão da tecnosfera, permitindo assim que a economia suplante, dia após dia, a vida mesma.
Relatórios sobre contágios e mortes decorrentes da catástrofe pandêmica se cruzam agora com outros sobre o aquecimento talvez irreversível do planeta. Eventos climáticos extremos coexistem com o delírio expansionista e extraterrestre das chamadas Big Tech que não apenas planejam novas expedições extrativistas em Marte, como já tomam a dianteira da "aceleração da inovação na agricultura", como define a Microsoft, em muitas regiões do planeta. A condição de confinamento parece ter sido a tempestade perfeita para a expansão do domínio do codificável e a consolidação das grandes corporações tecnológicas que hoje aparecem como "indispensáveis" para o funcionamento de muitas dimensões da vida social - a "vida social", aliás, encontra-se em suspensão inédita enquanto categoria capaz de expressar um mundo comum. A governamentalidade algorítmica tem como "[...] unidade de medida não o cidadão e nem o estado-nação, mas sim as populações-público para quem podem se dirigir em qualquer ponto do globo" (Costa, 2021, tradução nossa), criando um acesso irrestrito a um circuito de valor que só é possível pela extração da mais-valia relacional e psíquica promovida, gestada e comercializada pelas corporações que conduzem os ambientes digitais em que estamos inseridos.
A nova governamentalidade algorítmica (Rouvroy; Berns, 2015) pode ser, então, pensada como atualização tecnopolítica de um regime estrangeiro e deslocalizado de controle total e ordenamento do mundo da vida (e não apenas do trabalho, como já demonstram os inúmeros estudos sobre plataformização, gig economy ou uberização do trabalho). Com o colonialismo, ela compartilha "o prazer da racionalização ultrajante, a paixão pela redução, o gozo do achatamento binário" (Tiqqun, 2013, np). Essa nova forma de controle busca não só saber o que as pessoas fazem e o porquê, mas também intervir em suas próximas condutas. Expande-se, assim, a chamada data-driven rationality: "Um novo regime de produção de conhecimento em que o processamento de dados por meio de estatísticas avançadas e os modelos de previsão informam as decisões, ações e relações" (Ricaurte, 2019, p. 350).
Tecnoceno e Governo dos Possíveis
Em um artigo de maio de 2024, Mark P. Mills, diretor do National Center on Energy Analytics, escreve um texto cujo título provocador é: A transição energética não vai acontecer (Mills, 2024). O argumento é simples: inovações tecnocientíficas recentes ligadas à expansão das tecnologias digitais e informacionais - como a chamada "inteligência artificial' (IA) - apresentam um novo ciclo de demanda crescente por energia elétrica e extração dos chamados "metais raros". O ritmo acelerado da corrida por infraestruturas e "inovações" tecnológicas ligadas à IA e, consequentemente, a corrida pela viabilidade de suas infraestruturas materiais, do chip de silício até os datacenters, fazem desmoronar a ilusão de que uma economia digital permitiria a dissociação entre o paradigma do crescimento econômico e a exploração de recursos energéticos: "A física do transporte de informação é capturada num fato surpreendente: a energia utilizada para permitir uma hora de vídeo é maior do que a porcentagem de combustível consumido por uma única pessoa numa viagem de 15 quilômetros de ônibus" (Mills, 2024, np).
Os celebrados modelos de Inteligência Artificial com aprendizado de máquina, como o ChatGPT, "podem evaporar facilmente milhões de litros de água doce para resfriar usinas de energia e servidores de IA" (Ren, 2023, np). Algumas pesquisas estimam que, por exemplo, "Um único data center pode consumir o equivalente à eletricidade de cinquenta mil residências. Com 200 terawatts-hora (TWh) anuais, os data centers consomem coletivamente mais energia do que alguns estados-nação" (Monserrate, 2022, p. 6).
Como lembrava Laymert Garcia dos Santos, a virada cibernética acelerada pela Segunda Guerra Mundial foi o que conferiu "à tecnociência a função de motor de uma acumulação que vai tomar todo o mundo existente como matéria-prima à disposição do trabalho tecnocientífico" (Santos, 2003, p. 11). No mesmo sentido, o coletivo Tiqqun sugere que a "economia da informação" transformou o capitalismo em um auxiliar da cibernética e o "estado de emergência, característico da crise, é o que permite renovar a autorregulação para que se autoconserve como movimento perpétuo" (Tiqqun, 2013, np). O capitalismo cibernético, logo após a chamada "Grande Aceleração", soube converter a economia política em uma "ciência do vivo" e, assim, atuar no mundo como se este fosse "um sistema aberto de transformação e circulação de fluxos de energia e dinheiro" (Tiqqun, 2013, np).
Tendo em vista todas essas transformações, McKenzie Wark (2022) defende, em seu último trabalho, a tese de que já não estamos sob a égide do capitalismo tal como conhecemos. As classes globais dominantes são hoje aquelas capazes de controlar os "vetores" da informação, sua classificação, distribuição, valoração, os fluxos de dados, as formas de comunicação e suas infraestruturas. Agora, "não há nada que não possa ser marcado e capturado por meio de informações e considerado uma variável nas simulações que impulsionam a extração e o processamento de recursos" (Wark, 2022, p. 67). O vetorialismo opera uma inédita forma de captura: a produção de informação/dados em escalas inimagináveis é feita por uma "mão de obra livre" em um movimento de produção incessante através de seus ecossistemas relacionais e de atenção, suas formas de criar, sentir e compartilhar. "Dada a quantidade enorme de informação disponível, inteligência passa a ser a capacidade de processar, filtrar, indexar, cruzar informações para elaborar um produto mais 'acabado' com o nome de 'conhecimento'" (Rhatto, 2024, p. 69). Ou, como sugere Pasquinelli (2023, p. 2017, p. 213; tradução nossa), o que chamamos agora de inteligência artificial produz como o efeito mais imediato a imposição de "padrões de inteligência mecânica que propagam, de forma mais ou menos invisível, hierarquias sociais de conhecimentos e competências [...]. Contra a previsão de Alan Turing, é o mestre, e não o trabalhador, que o robô veio substituir em primeiro lugar".
Por trás da excitação sobre inovação e avanço tecnocientífico prometidos pelas novas tecnologias informacionais de "inteligência artificial" existe uma operação contínua de conversão da vida em excesso informacional. Como constata Silvio Rhatto (2024, p. 75), "há muita 'informação' para ser filtrada e processada, necessitando de mais e mais sistemas de 'inteligência artificial' para recolhê-la - ou 'minerá-la' - armazená-la, ordená-la, filtrá-la e processá-la. Para então posteriormente emitir mais informação, poluindo mais o ambiente e requerendo mais e mais sistemas para processamento e ordenação".
Nesse mundo ordenado pelos "vetorialistas", o debate sobre informações "falsas" e "verdadeiras" parece perder de vista o fato de que, para um vetor, o que importa é permitir os fluxos com o mínimo de fricção, o máximo de autorregulação e o crescimento exponencial do tempo online: o conteúdo da mensagem é mero detalhe. O volume de informação circulante alcança proporções inéditas e pode ser comparado a um novo lixo industrial em constante expansão, produzindo todo o ecossistema informacional e sem compromisso algum com qualquer programa ético comum de "veracidade"3.
Por mais que essas transformações tecnopolíticas sejam firmemente amparadas em um discurso sobre "inovação", o ímpeto de uma dominação irrestrita do meio pelo projeto moderno ocidental não pode ser pensado, entretanto, sem o próprio repertório técnico da colonialidade racial. Para Jackie Wang, vivemos um regime afetado pela "crise de incerteza" - um problema tanto informacional quanto existencial e que vem moldando o modo pelo qual habitamos o mundo. "Quanto menos no controle nos sentimos, mais desejamos a ordem [...] Catástrofes, guerras e epidemias de crime podem aprofundar ainda mais nosso desejo coletivo por segurança" (Wang, 2022, p. 225). Ela segue dizendo que, "na Era do Big Data", a incerteza é apresentada como um problema que pode ser superado por uma coleta cada vez mais abrangente de dados, que, por sua vez, produziria melhores eficiências em relação às limitações analíticas humanas na identificação de padrões, de desvios e de riscos. Emerge uma nova forma de "tecnogovernança que opera na intersecção entre o conhecimento e o poder" (Wang, 2022, p. 225), contando com um modo de funcionamento nada transparente e que, muitas vezes, "codifica a desigualdade racial dentro do risco" (Wang, 2022, p. 227).
A noção de Tecnoceno utilizada por Hermínio Martins (2018) nos permite analisar os processos que tornam possível o Antropoceno sob uma perspectiva complementar, na qual os efeitos que produzem essa nova era geológica resultariam da agência tecnológica que ultrapassa os processos psico-físico-biológicos que constituem o Homo sapiens sapiens. Por outros caminhos, Anders (2011) sugeria que, depois da bomba nuclear, a técnica se converteria definitivamente em "sujeito da história". Martins (2018) argumenta que a trajetória da nossa espécie se tornou interdependente e mutuamente promotora da tecnicização e da mercantilização; a combinação do desenvolvimento tecnocientífico com as dinâmicas capitalistas de mercantilização promove transformações radicais na própria caracterização do humano, do seu corpo e das instituições que regulam a vida social, dando forma ao Tecnoceno.
Assim como o capitalismo industrial deixou para trás um rastro desigual de danos ecossistêmicos e toxicidades, o Tecnoceno parece ir além e se expande "colonizando o pensamento como uma entidade ontológica soberana, expulsa a pluralidade conceitual [...] ligada à maquinaria da dominação, produz a indigência e a destruição" (Rhatto, 2024, p. 149). Para Berardi, o poder na modernidade se fundava na força de impor sua própria voz e neutralizar, "fazer calar" as massas - um regime tecnoinformacional no qual fazia sentido reivindicar um "direito à comunicação". Mas o poder contemporâneo, segue o filósofo, faz funcionar uma tormenta de vozes incompreensíveis. Ele "estimula a expressão e obtém suas leis de controle a partir do processamento estatístico dos dados que provêm do ruído do mundo. O som social é transformado assim em ruído branco e o ruído branco é transformado na ordem política" (Berardi, 2020, p. 30).
Em tal cenário, os investimentos em uma governança da "regulação" a partir de acordos sobre "integridade da informação", por exemplo, parecem partir de um repertório tão inadequado quanto ineficaz. Como lembrava Gunther Anders (2011) se referindo ao contexto da guerra nuclear, essa inadequação diante de um problema de grandes proporções padece de uma difícil defasagem: nossa capacidade de fabricação tecnológica excede nossa capacidade de imaginação e responsabilização pelo que se produz. Para Franco Berardi, estamos imersos em um "semiocapitalismo" através do qual o regime informacional se funde à produção psíquica, fazendo emergir uma articulação inédita entre acumulação, produção semiótica e estimulação nervosa: "A depressão entra como sintoma final do regime semiocapitalista em que a intensidade do ritmo social e emocional torna-se insustentável e a única maneira de escapar do sofrimento é mutilar a conexão com o desejo e, consequentemente, a conexão do desejo com a realidade" (Berardi, 2024, p. 12).
Como também acrescenta Sun-ha Hong (2022, p. 367), a "datificação nunca constata apenas o que já está lá, como nos fazem crer os mitos do 'positivismo ingênuo'; em vez disso, ela cria certos mundos e extingue outros". Rouvroy e Berns salientam que a governamentalidade algorítmica trabalha com uma plasticidade inédita. Desse modo, a "falha" não ameaça mais o funcionamento de um sistema, mas ela é imediatamente assimilada por ele com o objetivo de aprimorar ainda mais a modelização de comportamentos. A inscrição automática de toda irregularidade atua, assim, na obstrução dos possíveis emergentes, "retira do que poderia surgir do mundo em sua dissimetria relativa à realidade (aqui, o que a substitui é o corpo estatístico), sua potência de interrupção, de colocar em crise" (Rouvroy; Berns, 2015, p. 53).
Tecnoextrativismo e o Arsenal Colonial
Há, assim, um novo e inédito avanço sobre o Comum (em suas diferenças constitutivas e irredutíveis) operado pelas dinâmicas de extração e capturas transnacionais na escala planetária: energia, meio ambiente, corpos, subjetividades e tempo vital (Gago; Mezzadra, 2015). É o regime extrativista que funda, pelo empreendimento transatlântico colonial, o que podemos chamar hoje de América. Como mostra Machado Aráoz, ele constitui a ecologia política da Modernidade (Aráoz, 2015-2016). Nesse momento inaugural, o "novo mundo" era lido pelas potências colonizadoras como o reino da exuberância caótica e do excesso desgovernado, características que tornar-se-iam obstáculos para o desenvolvimento da Razão. É a ação de ordenar, controlar e corrigir na busca por mais "eficiência" da terra, como ato de poder e posse, que impulsiona o aparato da conquista e da aniquilação de povos. Como lembra Yusoff(2018, p. 11),
Se o Antropoceno proclama uma súbita preocupação com a exposição de danos ambientais às comunidades liberais brancas, o faz na esteira de histórias em que esses danos foram conscientemente exportados para comunidades racializadas sob a rubrica de civilização, progresso, modernização e capitalismo.
A gramática do extrativismo constitui a economia política de um modelo civilizatório. Seu êxito consiste em fabricar uma temporalidade própria encarregada de inscrever uma única História na Terra, uma flecha do tempo que lança um novo ritmo e um novo mapa para o tempo geo-histórico. Sun-ha Hong descreve como a crescente aposta otimista no "avanço tecnológico" continua operando a partir de uma lógica do "progresso como destino" (Hong, 2022, p. 369). Ele afirma que os investimentos no espetáculo da ficção sobre a colonização de outro planeta apresentam "mais uma intersecção da busca colonial por fronteiras extrativistas e a produção de novos (ou reciclados) imaginários tecnológicos de futuro" (Hong, 2022, p. 369). A figura tecnoextrativista de Elon Musk, através da qual o fim do mundo já aparece como variante real, engendra também o poder de fazer funcionar certas ficções: "As ficções de poder se proliferam junto a seus efeitos, numa marcha fúnebre celebrada como avanço, progresso ou destino incontornáveis" (Lepore, 2021).
Como bem definiu Jill Lepore (2021),
O muskismo é um capitalismo no qual as empresas se preocupam (de uma forma muito pública e apaixonada) com todos os tipos de desastres que acabam com o mundo, com a catástrofe assustadoramente real das mudanças climáticas, mas, com mais frequência, elas se preocupam com os misteriosos "riscos existenciais", os riscos x, incluindo a extinção da humanidade, da qual, ao que parece, só os tecnobilionários podem nos salvar.
Mesmo Paul Crutzen, um dos cientistas responsáveis pela difusão do termo "Antropoceno", argumenta que "cientistas e engenheiros devem guiar a sociedade rumo a um gerenciamento ambientalmente sustentável durante o Antropoceno. Isso exigirá um comportamento humano adequado em todos os âmbitos e pode muito bem envolver projetos de geoengenharia de grande escala, aceitos internacionalmente, para, por exemplo, 'otimizar' o clima" (Crutzen, 2002, p. 22). Mas a despeito de todo o otimismo tecnocientífico solucionista, um artigo publicado no MIT Technology Review em 2021 constatou o relativo fracasso de inúmeras ferramentas que faziam uso de Inteligência Artificial cujo objetivo era atuar na crise de Covid-19 (Heaven, 2021). Se a gestão da crise da hanseníase (antes conhecida como "lepra") estava interessada em medidas disciplinares de contenção, condenação e proscrição, a gestão da Covid-19 concentrou seus esforços de "inovação" na garantia tecnológica de um regime de eficiência de informação e logística que se realiza apesar da catástrofe em curso. Ecommerce, transporte urbano privado, redes de logística para circulação de mercadorias, plataformas de ensino e saúde: produção e destruição operando em um mesmo fluxo, em uma mesma arquitetura informacional e tecnológica que pudesse garantir a "saúde da economia global". Agora, mais do que nunca, "o horizonte da catástrofe é aquele a partir do qual nós somos atualmente governados" (Comitê Invisível, 2016, p. 22).
Pegando emprestada a semiótica da "geologia branca" e sua gramática de extração, o capitalismo cibernético soube converter em "dados" e "informação" - fazendo atuar, assim, a ficção de uma matéria não humana e inerte - um conjunto de relações, afecções, criações, aprendizagens e a própria produção do mundo social, ao mesmo tempo que converte em "recursos" uma série de ecossistemas minerais e sua gente, ampliando as "zonas sacrificáveis" do planeta em nome de um inquestionável "progresso tecnológico". O truque da gramática geológica, afirma Yusoff, foi imprimir no mundo uma grande classificação hierarquizada entre coisas vivas e inertes, e, assim, neutralizar, mas também "desanimar" o mundo.
Tomar o capitalismo cibernético como herdeiro da catástrofe ancestral (Povinelli, 2016) do colonialismo é partir também da constatação de que, "para muitas regiões do Sul, na verdade, recriar a vida a partir do invivível tem sido a condição reinante ao longo de séculos" (Mbembe, 2021, p. 26). Como sabemos, o colonialismo foi justificado, muitas vezes, por uma suposta "superioridade técnica" do mundo ocidental que lhe conferia um consequente dever moral de "civilizar" e "desenvolver" o mundo "selvagem", "caótico", "lento", "ineficiente". É também pela "epidermização digital", como fala Simone Browne (2015), que certos corpos são renderizados como código digitalizado: o corpo reduzido como dado biológico, portador de um código e fixado na lógica de padrões e recorrências, continuamente ameaçado por ficções de previsão securitária ou biovigilância.
Do mesmo modo, o extrativismo pode ser pensado como aquilo que oferece toda a gramática racial que garante a expansão da colonialidade para além dos regimes propriamente coloniais, atuando como esse "padrão de relacionamento instituído como pilar estrutural do mundo moderno, como base fundamental da geografia e da 'civilização' do capital, pois o capitalismo nasce de e se expande com e através do extrativismo" (Aráoz, 2015-2016, p. 15).
Escapar do Código: Retomar um Futuro Indeterminado
A pandemia de Covid-19 acelerou as formas pelas quais o Tecnoceno em associação com o Antropoceno/Plantationoceno irriga nossa experiência do presente administrando o colapso tecnoecológico, recriando também um regime de sensibilidade que reconfigura nossas formas de estar no mundo. Vivendo diante das telas, nota Latour (2021, p. 43), "corremos o risco de pensar que os fenômenos simplesmente se desdobram de forma contínua a partir de um ponto de origem até uma conclusão previsível", apagando, assim, toda a trama tão complexa quanto precária de relações de interdependência que nos vinculam e sustentam mundos, também os espaços de cumplicidades, memórias e decisões coletivas sobre a vida.
O mais importante, no entanto, é que tais imaginações de futuro tecnológico, como bem insiste Sun-ha Hong, atuam na captura e obstrução dos nossos sonhos transformativos e insistem em um futuro no qual nada de significativo precisa mudar radicalmente. Como sugere a artista Eleonora Fabião, imaginar transforma a matéria. Imaginar e experimentar outras tecnicidades que nos permitam retomar o tempo e o prazer da partilha é o que desejamos como prática de estudo e experimentação investigativa.
Seja pelas intervenções militares mais diretas cujo objetivo enunciado pertence ainda ao projeto tecnomilitar civilizatório, securitário e pacificador, agora agenciado por tecnologias de reconhecimento facial ou os "drones não tripulados" de Israel, seja pela produção de uma urbanização predatória e financeirizada que reserva as regiões mais degradadas e mais vulneráveis aos eventos climáticos extremos às populações mais pobres e racializadas, ou ainda pela expansão da tecnoindústria do agronegócio que se amplia deslocando populações, monopolizando bens naturais, suscitando epidemias e promovendo silenciosas guerras químicas, o Tecnoceno articula, de forma inédita, um circuito distribuído de dispositivos cuja legitimidade se ampara em uma racionalidade funcional aparentemente neutra (Feenberg, 2010). Como Horácio Machado Araóz (2015-2016, p. 34) analisa sobre o ciclo neoextrativista, "Estamos falando de um aumento, em escalas históricas inéditas, da capacidade de disposição do capital sobre a vida em geral e sobre o conjunto dos processos e manifestações da vida".
Fred Moten e Stefano Harney (2023) sugerem que estamos diante da expansão do que eles chamam de "capitalismo logístico", uma forma de domínio e condução fundada pelo empreendimento colonial, mas que segue se associando a muitas outras formas de colonização da vida, como faz o novo regime técnico-informacional. O capitalismo logístico, dizem eles, "busca acesso total ao seu idioma, tradução total, transparência total, o valor total de suas palavras" (Moten; Harney, 2023, p. 65). Agora, "somos violentamente convidados a exercer nosso direito de nos conectar, nosso direito à liberdade de expressão, nosso direito de escolher, nosso direito de avaliar, nosso direito à individualidade correta para que possamos aprimorar a linha de produção que atravessa nossos sonhos liberais" (Moten; Harney, 2023, p. 65). Contra essa forma de captura, eles sugerem o emaranhamento, ou o movimento "errado", imprevisível, perturbando os caminhos dos fluxos e as expectativas sobre "correção" permanente das nossas existências.
Se as promessas de novas IAs são aquelas de, através de nós mesmos, poder "completar" o que não sabemos, o que não conhecemos, o que podemos corrigir ou melhorar, com Moten e Harney podemos afirmar tecnologias da "incompletude" - não como "etapa" inferior de um momento final e aprimorado, mas como condição de abertura permanente, de partilha permanente daquilo que não pode ser representado e hesita em ser convertido em "dado". Medeiros e Galdino (2024) retomam a Capoeira Angola para nos fazer pensar sobre outras tecnologias do corpo - ou da relação do corpo com o mundo. Contra as tecnologias de captura, a Capoeira Angola atua pela imprevisibilidade acima de tudo: "sua opacidade é a sua força". Aqui, a produção de um território existencial acontece pela vibração dos corpos suscitada e conduzida pelo berimbau. Comunhão, festa, a ginga. Não a recusa técnica ou a ficção de uma origem, mas nos interessa pensar e atuar através das formas técnicas que insistem no comum que não pode ser capturado (subcomuns): formas lentas de cuidado e cultivo, o improviso, a cozinha aberta, as interdependências multiespécie, o inseparável, memórias incontáveis, o tempo e a terra retomados, o estudo que fazemos através de relações de cumplicidade: "a única defesa é a abertura. A única posse é a despossessão" (Moten; Harney, 2023, p. 93).
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Os artigos que integram o dossiê Hegemonia Cibernética, Tecnoextrativismo e Colonialidade são uma pequena amostra de um esforço investigativo que pretende dar forma a uma agenda de pesquisa interdisciplinar sobre os desafios científicos e políticos no Antropoceno/Capitaloceno/Tecnoceno. Com especial ênfase nos arranjos sociotécnicos contemporâneos, os artigos procuram destrinchar a fina trama entre o desenvolvimento científico, tecnológico, a economia e as dinâmicas políticas, levando em conta uma análise multiescalar que permita articular fenômenos locais às dinâmicas transnacionais e geo-históricas.
Para isso, novos conceitos e palavras entram em cena para descrever e dar forma tangível a processos que exigem um olhar atento para as relações assimétricas entre saberes e poderes que disputam a descrição dos fatos e realidades. Certos conflitos ontoepistêmicos narrados em alguns desses textos indicam que os problemas que enfrentamos diante da chamada "erosão do real", "pós-verdade", "negacionismo" não podem ser combatidos apenas com mais informação, mais conhecimento, mais ciência. Não é apenas uma melhor interpretação dos fatos e fenômenos que está em jogo, mas todas as relações, instituições, infraestruturas, práticas e culturas que participam da produção e sustentação de fatos compartilhados que possam dar forma a um mundo comum. Por isso, a crise epistêmica que se apresenta é indissociável da crise política contemporânea.
Tecnoextrativismo ontológico; territórios digitais não fungíveis; geopolítica da nuclearidade; excepcionalismo nuclear; geopolítica viral; neocolonialismo microbiológico; agricultura digital são alguns exemplos de palavras que indicam a indissociabilidade entre as dinâmicas científicas, tecnológicas, econômicas, políticas, geográficas e biológicas nas reconfigurações do mundo atual. Todos os cinco artigos selecionados realizam uma análise de situações empíricas à luz de um arcabouço teórico que permite compreender a formação situada de fenômenos e entidades híbridas (bio-info-tecnosocial) em escalas múltiplas, atualizando a interpretação de processos históricos como o colonialismo, a racialização, o extrativismo e as tecnologias de controle.
Nesse sentido, as práticas científicas assumem uma reflexividade crítica e imanente aos problemas analisados, considerando inclusive sua participação na produção dos problemas que contribuem para a catástrofe climática. Esse talvez seja o movimento mais difícil de realizar: face à erosão dos regimes de verdade e ao ascenso do fascismo que se nutre do negacionismo e da indústria da desinformação, como evitar a tendência neopositivista que reafirma um modelo supremacista de conhecimento científico que visa restabelecer a ordem moderna corroída? Ao descrever como o projeto epistemopolítico moderno também conforma as dinâmicas de dominação, racialização, os processos geopolíticos coloniais e uma relação de subordinação e controle sobre a natureza, somos interpelados a repensar os fundamentos ontoepistêmicos e nossas práticas científicas, em direção a outras cosmotécnicas e cosmopolíticas.
O artigo de Frederico Salmi e Lorena Fleury - Tecnoextrativismo ontológico, o caso Amazônia NFT - analisa um fenômeno recente e ainda pouco investigado nas ciências sociais, mas inicialmente abordado por movimentos sociais e coletivos ativistas socioambientais, indígenas e por jornalistas investigativos que observaram in loco a emergência dessa frente de expansão do capitalismo informacional financeirizado sobre os territórios amazônicos. O artigo apresenta o processo tecnoextrativista pelo qual territórios ancestrais e entidades cosmológicas são convertidos e capturados numa longa cadeia sociotécnica que produz um tipo de entidade híbrida denominada NFT amazônico (non-fungible token). Tal convergência, expressão da aliança entre tecnologias digitais-cibernéticas, mercado financeiro e corporações internacionais, indica novas práticas de extração de valor e controle sobre territórios e formas de vida. Ao converterem digitalmente elementos existentes do mundo físico (coordenadas geoespaciais de um território) ou criações artísticas em imagens digitais únicas, o NFT simula a criação de artefatos digitais únicos (NFT), através de tecnologias de blockchain, que poderão ser inseridos como bens monetários no mercado transnacional de crédito de carbono. Todavia, tendo em vista a complexidade e as assimetrias tecnológicas, epistêmicas e econômicas envolvidas na realização dessa operação, os autores problematizam como essas práticas promovem dinâmicas neocoloniais de poder que podem intensificar as relações de dominação sobre povos indígenas e seus territórios, colocando também em questão o funcionamento desse arranjo tecnoliberal (crédito de carbono) no combate às mudanças climáticas.
O texto A trincheira dos porcos na Guerra de Mundos: ecologia política da suinocultura nos EUA, México, Brasil e Argentina, de Allan Rodrigo de Campos Silva, inscreve-se na confluência dos estudos da ecologia política, economia, geografia e epidemiologia para descrever as relações que promovem a monocultura tecnocientífica na indústria transnacional de produção de carne. Em diálogo com autores que investigaram a eclosão de patógenos que produziram epidemias recentes (últimas décadas) e, mais especificamente, a pandemia de Covid-19, Campos Silva descreve como a organização da cadeia produtiva do agronegócio transnacional cria paisagens dedicadas à produção concentrada de animais, que acabam promovendo as condições de surgimento de novos patógenos protopandêmicos. Na medida em que essas atividades apresentam enorme impacto socioambiental em seu entorno, a manutenção desse arranjo produtivo gera uma distribuição socioespacial dos riscos e impactos sobre populações e territórios específicos, refletindo as assimetrias geopolíticas (neocolonialismo molecular, químico ou viral) que atuam nos deslocamentos e relocalizações das unidades de produção. Ademais, quando observamos historicamente as populações afetadas e a organização da distribuição do trabalho, o artigo indica como a externalização estratégica dos riscos sanitários e a busca de mercados menos regulamentados (direitos trabalhistas e proteções ao meio ambiente) dão forma a dispositivos de racialização praticados por essa indústria transnacional.
Já no artigo Reimaginando o social em tempos de pandemia: negacionismo científico, diplomacia brasileira e o "vírus do comunismo", Thiago da Costa Lopes contribui com uma análise aguda sobre as estratégias discursivas adotadas pelo governo Bolsonaro durante a pandemia de Covid-19 na criação de formas de enquadramento interpretativo sobre o vírus Sars-Cov-2. Adicionando novas camadas interpretativas ao debate existente, o autor destaca como as estratégias de cooperação internacional no enfrentamento da pandemia - desde medidas de biossegurança até colaboração tecnocientífica para a produção de vacinas - criaram impasses para a diplomacia brasileira imersa na defesa de uma "ideologia antiglobalista". Ao mesmo tempo, para sustentar o desmonte das políticas de proteção social, na defesa de medidas neoliberais e necropolíticas de exposição ao risco e retomada das atividades econômicas, foram criadas estratégias discursivas que incidiam "sobre os elos que ligavam os enunciados mais elementares a respeito da doença e do vírus a asserções, necessariamente mais frágeis, envolvendo a ação prática e as decisões políticas a serem tomadas para sua contenção" (Lopes, 2024, p. 10). A estratégia adotada pelos intelectuais das novas direitas extremistas visava atacar tanto as instituições detentoras do conhecimento institucionalizado como seus representantes: "não é a verdade enquanto tal que é objeto de descrédito por parte das novas direitas, mas a crença em seu acesso por meio das autoridades estabelecidas. Assim, a instauração de um novo regime político capaz de devolver ao 'povo' o lugar que lhe foi usurpado pelas 'elites' passa forçosamente pela refundação do regime comunicacional e epistêmico vigente". As ações sanitárias tomadas por diversos países para a redução do contágio eram simultaneamente enquadradas como autoritárias ou comunistas - "o comunavírus" - e confrontadas com a apresentação de "fatos alternativos" que objetivam interrogar a eficácia dessas medidas.
No artigo Agricultura Digital: uma análise a partir do colonialismo de dados, de Patricia Capelini Borelli e Pâmela Garrido Senise, observamos novamente a interconexão e as relações de codeterminação entre a produção socioespacial física na agricultura e a produção informacional desterritorializada dos dados digitais que alimentam o capitalismo contemporâneo. As autoras descrevem o crescimento da chamada Agricultura Digital, como um fenômeno de convergência entre a crescente digitalização e dataficação das diversas atividades que compõem as práticas do agronegócio e as tecnologias digitais, infraestruturas e modelos de gestão informacional oferecidos por empresas internacionais de tecnologia. Por um lado, graças à crescente conectividade e digitalização promovida por sensores IoT (internet das coisas), uma nova frente de produção e coleta de dados é criada. Dados sobre as condições ambientais (solo, água, chuva, temperatura, etc.), características das plantas, plantio e colheita, passam a ser coletados e fluem para centrais de processamento e análise.
Ao mesmo tempo, as empresas de tecnologia oferecem soluções de gestão informacional, análise e tomada de decisão, bem como equipamentos, sementes, agrotóxicos e até acesso a financiamento que correspondam aos cenários e demandas tecnopoliticamente construídas. Na medida em que tais tecnologias e toda a infraestrutura (física e lógica) que garante seu funcionamento estão sob o domínio de grandes corporações internacionais, as autores problematizam a formação do colonialismo de dados (Couldry; Mejias, 2018), graças à perpetuação e aprofundamento da assimetria econômica e política entre os centros detentores das tecnologias, permitindo uma apropriação do conhecimento (controle sobre a coleta, transmissão, armazenamento e análise) e dos valores obtidos pelo uso estratégico dos dados. Considerando o poder das grandes empresas de tecnologia na introdução dessas tecnologias no campo, tal processo pode indicar a maneira como gradualmente as práticas do mundo físico são modificadas para se adequarem às exigências de melhor funcionamento de uma tecnologia específica. Em suma, para que a agricultura de precisão e os algoritmos de análise e predição possam operar corretamente, as práticas da agricultura poderão ser reorganizadas e funcionalizadas sob um novo acoplamento tecnológico.
Por fim, o texto do Bruno Lucas Saliba de Paula - Provincializando a Sociedade de Risco: uma análise a partir da "geopolítica da nuclearidade" - interroga as problematizações enunciadas pela formulação da Sociedade de Risco, de Ulrich Beck (2011), no sentido de revelar os mecanismos de distribuição desigual dos riscos associados aos efeitos de atividades econômicas e tecnocientíficas. Ao analisar como a noção de "nuclearidade" de uma atividade é transformada conforme o contexto social, histórico e geográfico, o autor revela as relações de poder geopolítico e a organização assimétrica da divisão internacional do trabalho envolvido na cadeia produtiva do urânio. Ele acompanha como diferentes atores numa pequena cidade do interior do Brasil - movimentos sociais, comunidades afetadas, indústria e governo - interpretam e produzem evidências sobre a periculosidade do urânio, revelando como a própria fabricação dos fatos depende de um complexo arranjo entre ciência, tecnologia e relações de poder. Como rastrear e produzir evidências que indiquem relações de causalidade entre as atividades de mineração de urânio, a concentração de doenças nas comunidades próximas e a contaminação da água, terra, plantas e animais do entorno não é algo trivial. Trata-se também de um embate no interior do campo científico sobre as definições do regime de evidências e das definições de contaminação ou nuclearidade, dando a ver a formação de uma distribuição desigual dos riscos, aqui caracterizada como "geopolítica nuclear" (Hecht, 2012).
Declaração de Coautoria: Henrique Zoqui Martins Parra e Alana Moraes de Souza declaram que "O artigo foi integralmente redigido em parceria (...) sem distinção de funções (pesquisa, análise, escrita."
*Minicurrículo do/as Autore/as:
Henrique Zoqui Martins Parra. Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (2009). Professor Associado do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo. Pesquisa apoiada pela Rede LAVITS e Fundação Ford. (Processo FUJB: 26191-2). Email: [email protected].
Alana Moraes de Souza. Doutora em Antropologia pelo Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro (2020). Pós-doutoranda do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro e docente do Centro de Arqueologia e Antropologia Forense da Universidade Federal de São Paulo. Pesquisa financiada pela FAPERJ (Processo nº 204.394/2021 e 204.395/2021). E-mail: [email protected]. Editor(a) de Seção: Raquel Kritsch, Orcid.
3 "A informação, por um lado, se tornou ferramenta de controle usada descontroladamente, a ponto de gerar um excesso de sinais emitidos na expectativa de 'fisgar' algum sistema de interpretação/ processamento - como por exemplo uma pessoa afetada pela propaganda -, numa poluição cujo efeito global é a transformação da informação em lixo. Por outro, a informação se tornou aquilo que pode ser captado como rastro, rejeito e efeito colateral da atividade das pessoas - sensores, equipamentos de monitoria, registros de interação etc. - que também constitui uma espécie de poluição residual da atividade humana" (Rhatto, 2024, p. 74).
Referências
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Abstract
No presente texto apresentamos algumas considerações teóricas e conceituais que percorrem zonas de contato entre os estudos sociais da ciência e da técnica e os estudos sobre a emergência ecológica. Tais considerações interpelam a noção de Tecnoceno a partir da analítica da colonialidade e suas expressões ontoepistemológicas, permitindo-nos visualizar relações entre tecnologias extrativistas, a virada cibernética e novas formas de controle constituídas por uma certa metafísica informacional. Sugerimos alguns caminhos de reflexão que entrelaçam o ímpeto pela expansão da codificação do mundo, a ampliação de um regime de equivalências através da "governamentalidade algorítmica" com a gramática política e epistêmica da geologia colonial.